Janguiê Diniz

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O mundo em discussão

Perfil:   Mestre e Doutor em Direito, Fundador e Presidente do Conselho de Administração do Grupo Ser Educacional, Presidente do Instituto Exito de Empreendedorismo

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Como evitar a evasão de nossos cientistas (brain drain ou fuga de cérebros)

Janguiê Diniz, | qua, 04/04/2018 - 11:40
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Já se tornou lugar comum ouvir o termo “brain drain” ou fuga de cérebros. Brain drain, fuga  de capital humano ou de cérebros  consiste na emigração de indivíduos detentores de alto grau de conhecimento   técnico ou  científico para países mais desenvolvidos, devido a  fatores como conflitos étnicos,  guerras,  riscos à saúde,   instabilidade política, mas,  principalmente,  como é o caso do Brasil, à instabilidade econômica com a consequente  carência  de investimentos em pesquisa nas áreas de  ciência e tecnologia, que, por via de consequência gera a falta de  oportunidades de  empregos  em nosso país.

Aquelas cabeças mais especializados em suas áreas do conhecimento humano, são atraídos para trabalhar em países mais desenvolvidos, como os Estados Unidos e Europa, já que lá conseguem benefícios pessoais,  reconhecimento da carreira, e principalmente, tem  oportunidades de desenvolver pesquisas em ciência e tecnologias, e o mais importante,  facilidade de empregos  com remuneração adequada.

O termo foi criado pela Royal Society of London for the improvement of natural knowledge (Real Sociedade de Londres para o melhoramento do conhecimento natural), fundada em 1660, destinada a promoção do conhecimento científico.

É importante registrar que os EUA, mesmo tendo o maior número de cientistas em seu território, são o maior receptador dos melhores cérebros do mundo, visando desenvolver novas tecnologias de ponta para que possam ser patenteadas naquele país.  Não é à toa que a maioria das inovações tecnológicas tiveram origem naquele país, principalmente no Vale do Silício e Califórnia, embora tenham sido criadas por estrangeiros, principalmente de nacionalidades  indianas, árabes, europeus, latinos, inclusive brasileiros, residentes naquele país.

Se por um lado a emigração das cabeças pensantes para diversos países como os EUA trazem consequências financeiras benéficas para aquele país, já que aquelas cabeças ajudam o receptor a desenvolver novas tecnologias de ponta,  por outro lado, o país perdedor,  fica carente de  um grande potencial de inovações, que seriam desenvolvidas por seus cientistas  nacionais, o que  é extremamente nefasto e economicamente prejudicial ao país  perdedor. Que o diga o Brasil.

As fugas de cérebros são extremamente comuns entre os países mais pobres do planeta, e também entre as nações em desenvolvimento, como países africanos, ilhas do Caribe, países da América latina, além do Brasil, onde  existe carência de investimento em pesquisa da ciência e tecnologia, e por via de consequência as habilidades e competências não são  valorizadas e recompensadas monetariamente. Ilustrativamente, citamos um estudo realizado na América Latina, no ano 2000,  no qual revelou  que naquele ano a Argentina perdeu 2.9% dos seus profissionais, o Brasil 3.3%, o Chile 5.3%, o Equador 10.9%,  a Colômbia 11% e o México 14.3%.

Nesse sentido, o Brasil, que embora  para alguns não seja considerado um  grande perdedor de pesquisadores, segundo a CAPES e o CNPQ,  só  em  2015 quase 50 mil  cientistas saíram do Brasil para universidades estrangeiras, especialmente de setores da Medicina, Engenharia, Cinematografia e inclusive produção gráfica, haja vista que  certos fenômenos de bilheteria  hollywoodiana são frutos de pesquisadores brasileiros, a exemplo do filme Matrix, considerado uma revolução cinematográfica e o desenho  animado A Era do Gelo I e II.

Ampliando o quadro de considerações, frisamos que no atual estágio de sucateamento das entidades de pesquisa e universidades públicas brasileiras, o  famigerado programa Ciência Sem Fronteiras, que, a priori,  constitui-se num incentivo ao intercâmbio científico como estratégia  pública desenvolvimentista, por um lado é extremamente positivo para os pesquisadores, mas,  por outro, demonstra ser  dinheiro jogado fora, altamente nefasto para o país, pois abre os olhos dos cientistas para as condições mais favoráveis encontradas no estrangeiro, como, por exemplo, os laboratórios de alta tecnologia,  recebendo altos salários como contraprestação remuneratória, diferentemente das condições e dos salários que obteriam no Brasil.

Com efeito, cumpre elencar as causas secundárias e principais do brain drain no Brasil:

1) Causas secundárias:

1. 1) mão de obra acessória altamente desqualificada.  A qualidade da educação brasileira fica na 76ª posição entre 129 países de acordo com a Unesco, perdendo até para países africanos como Zâmbia e Senegal, além de estar abaixo de todos os países da América do Sul. As escolas são ruins, sem estruturas e equipamentos, professores mal preparados e mal pagos.  Isso repercute no ensino superior.  As Instituições  recebem os alunos mal preparados. A má qualidade do ensino no Brasil é fruto de um paradoxo, gasto altamente desproporcional. A maioria do orçamento do MEC vai para universidades públicas onde estudam cerca de um milhão de alunos,  e uma pequena parte do orçamento vai para as escolas de nível básico, onde estudam mais de 40 milhões de crianças e jovens. Gasta-se  muito com os universitários, que na maioria podem pagar (88% de Medicina, 80% Odonto, 50% Direito). Em média, 9 mil dólares ano, e pouco com alunos do ensino básico: aproximadamente mil dólares. Só resta aos  menos favorecidos ingressarem nas Instituições  públicas em carreiras de pouca procura. Ex. Pedagogia, Letras, ou trabalhar para pagar uma Instituição privada. Na sociedade digital, a baixa qualidade do ensino no Brasil  afeta o crescimento do PIB, haja vista que é uma ameaça a competitividade das empresas para competir na economia global e um obstáculo ao crescimento do país;

 

1.2) dentre todos os países, o Brasil é um dos mais corruptos do mundo. As verbas não chegam ao destino final.

1.3) um dos mais burocráticos países do mundo. Extremamente burocrático para conseguir equipamentos e insumos para pesquisa e até para criar qualquer empresa de pesquisa;

1.4) tem uma das maiores taxas de juros do planeta, logo, qualquer financiamento para realizar pesquisa em ciência e tecnologia encarece a  pesquisa, sobremaneira;

1.5) uma das maiores cargas tributárias do mundo. Paga-se imposto sobre tudo e um alto percentual ;

1.6) onde 50% dos empreendimentos vão a falência e são fechados em até 3 anos de atividades.

 

2) Causas principais

2.1) baixo  investimento em  inovação,  pesquisa da ciência  e do desenvolvimento tecnológico. Primeiramente, é importante asseverar que gastos com inovação e pesquisa da ciência e tecnologia não são gastos, são investimentos, pois ajudam o país a se desenvolver. O Brasil até antes do governo Temer investia cerca de 1% de seu PIB com ciência e tecnologia, o que já era muito baixo e insuficiente para o desenvolvimento do país. Basta compararmos com a União Europeia, que pretende destinar 3% do PIB para pesquisa e desenvolvimento até 2020. Nos EUA, até 2017, já se aplicava em torno de 2,7% do PIB e a China vem aumentando substancialmente os investimentos em inovação e pesquisa da ciência e da tecnologia. Aqui no Brasil, entretanto, em 2017, o orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Comunicações (no governo Temer o Ministério das Comunicações foi incorporado ao de Ciências e Tecnologia) que  já era muito baixo, de 5,8 bilhões, foi diminuído para 3,2 bilhões, sendo  700 milhões destinados para Comunicações e 2,5 bilhões para Ciência e Tecnologia. Com o corte drástico interromperam-se pesquisas, programas e bolsas de pesquisas acelerando a fuga dos cientistas para outros países.  Isso tem repercutido de forma negativa no meio internacional além de deixar a comunidade científica brasileira extremamente preocupada. Se antes da redução do orçamento a situação já era ruim, agora está muito pior.   O resultado desse corte trará trágicas consequências para o desenvolvimento do país, infelizmente é o que veremos num futuro próximo. Nessa perspectiva, segundo Luiz Davidovich, em épocas de crise, os países devem aumentar o investimento em pesquisa, ciência, desenvolvimento e inovação tecnológica, já que constitui-se na “porta de saída da crise”, pois isso é o que tem feito diversos outros países há muito tempo. O corte no orçamento "vai penalizar o Brasil por décadas", constituindo-se numa “bomba de efeito retardado que estoura lá na frente”.

2.2) falta de conexão entre as universidades e o mercado de trabalho (indústrias e empresas em geral). No Brasil, poucas empresas têm parcerias com as universidades para produzir pesquisas. Podemos citar como exceção, dentre outras, a Petrobras que ganhou prêmios internacionais na exploração de petróleo em águas profundas, através de cooperação com várias universidades brasileiras, e a Embraer, que em cooperação com o departamento de Engenharia Mecânica da UFSC, transformou-se na maior empresa de compressores do mundo. Aqui no Brasil não temos nenhuma universidade no “The Times Higher Education University 2015/2016”, prestigiosa publicação que elege as melhores instituições de ensino dedicadas à pesquisa ao redor do globo.

Arrematando, cumpre asseverar que para manter nossos pesquisadores em nosso país, trabalhando em inovação e pesquisa para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia é imprescindível a adoção de políticas que evitem que sejamos  um "doador de cérebros". E isso só é possível através de: 1) altos investimentos em inovação e pesquisa da ciência para o desenvolvimento científico e tecnológico, ou seja, se tornando um polo de inovações científicas e tecnológicas,  para que os pesquisadores tenham oportunidades de desenvolver suas pesquisas e possam ter carreiras iguais e  empregos bem remunerados;  2) maior conexão entre as universidades e o mercado de trabalho (indústrias). Ex. No Japão, os universitários de Engenharia, Informática, etc. São convocados pelas indústrias, no final do curso, para desenvolver ideias novas a serem postas no mercado. Muitas delas, de fato, foram como projetos de carros “futuristas” que são constantemente elaborados;  3) oferecer benefícios ou incentivos fiscais para as empresas privadas em caso de  inovação em novas tecnologias ou ideias que sejam desenvolvidas por seus funcionários.

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