A suspensão de aulas presenciais nas escolas para conter o avanço da Covid-19, junto às dificuldades envolvidas para ministrar aulas a distância no ensino básico, causaram prejuízos de aprendizado profundos aos estudantes no Brasil, que deverão resultar em aumento de desigualdades sociais e redução salarial no futuro. É o que aponta uma pesquisa desenvolvida pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Covid-19 de agosto.
O estudo buscou estimar o tempo total dedicado ao estudo durante a pandemia, através de um indicador síntese que marca como um relógio as horas dedicadas por cada estudante potencial ao aprendizado a distância, para entender como variaram a matrícula e a jornada escolar em casa por faixa etária e renda, além de determinar se o tempo de estudo foi mais afetado pela falta de oferta de materiais remotos pelos gestores educacionais ou pela falta de interesse dos estudantes, entre outros pontos.
##RECOMENDA##O resultado não foi animador: o tempo médio de estudo registrado no grupo de seis a 15 anos foi de 2,37 horas diárias por dia útil, abaixo das recomendações mínimas da Lei de Diretrizes Básicas da Educação (LDBE). A situação se agrava para estudantes mais velhos, o que é ainda mais problemático, uma vez que eles estão mais próximos de fazer as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem): adolescentes de 16 e 17 anos dedicam relativamente mais ao ensino remoto, mas sofrem maiores taxas de evasão escolar, apresentando, no geral, menos tempo para escola que as crianças entre seis e 15 anos.
Perda salarial
O dado é preocupante em diversos aspectos, inclusive pelo futuro profissional dos alunos que não têm conseguido estudar adequadamente. Segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil é o país em que terminar o ensino superior garante mais vantagens salariais em comparação ao ensino médio completo e ao incompleto, dentre uma lista de 37 nações avaliadas.
A diferença nos ganhos financeiros mensais pode chegar a ser 131% maior para os mais escolarizados, enquanto uma pós-graduação pode gerar até 92,5% de retorno salarial extra. Diante desses dados, o surgimento de uma geração que teve um ano com aumento de defasagens de aprendizado e crescimento de abandono escolar representa um grande problema para o País e para o futuro desses jovens.
Falta de tarefas
Os dados mostraram que há uma carência de atividades para os alunos e, de acordo com as respostas deles, na maior parte dos casos, isso se deve à escola. Segundo a FGV, 13,5% dos estudantes de seis a 15 anos não receberam materiais dos gestores educacionais e professores, enquanto somente 2,88% não utilizaram os materiais que receberam por alguma razão pessoal.
Desigualdade social
Analisando a situação pelo aspecto financeiro, ao observar a faixa de renda dos alunos, constatou-se que a falta de oferta de tarefas escolares afeta 633% mais alunos de baixa renda. Quanto mais pobre é o estudante, menores são a frequência na escola, a quantidade de exercícios recebidos e o tempo dedicado a resolvê-los.
Alunos de seis a 15 anos que pertencem às classes A e B dedicaram 3,2 horas aos estudos, e os de 16 e 17 anos, 3,3. Na classe C, há uma redução para 2,4 horas entre os que têm até 15 anos e 2,3 para alunos de 16 e 17 anos de idade. Na classe D, 2,2 horas é o tempo dedicado por alunos de seis a 15 anos e os mais velhos estudam uma média de 2,1 horas. Na classe E, o índice registrado foi de duas horas em ambas as faixas etárias.
Disparidades regionais
Analisando o tempo de estudo por estados, o Acre é o último colocado, apresentando menos que a metade do primeiro da lista, que é o Distrito Federal (1,29 e 2,96, respectivamente). A pesquisa ainda aponta para outro dado preocupante: mesmo os melhores colocados não tiveram um tempo para escola superior à jornada escolar mínima proposta pela Lei de Diretrizes Básicas da Educação (LDBE), que comparada a padrões internacionais, ainda é baixa.
Na região Sul do País, há indicadores melhores para o envio de tarefas escolares, enquanto o norte é o mais afetado pela escassez. Os dados refletem essa realidade ao mostrar, por exemplo, que o índice de alunos sem atividades no período de aulas remotas é de 2,09%, enquanto no Pará é de 45,3%. O envolvimento com as tarefas recebidas também foi menor para alunos que vivem na região Norte, o que indica problemas de infraestrutura domiciliar e de demanda por parte desses alunos, além de agravamento nas desigualdades regionais de educação no Brasil pós-pandemia.
Pernambuco registrou um tempo dedicado por alunos de até 15 anos de 2,29 em julho, caindo para 2,26 em agosto. Na faixa dos 16 e 17 anos, a queda foi de 2,22 em julho para 2,19 em agosto. No que diz respeito à capital, Recife, os estudantes de seis a 15 anos dedicaram 2,69 horas em julho e 2,48 em agosto, o que representa uma queda com o passar do tempo em todo o estado e na totalidade das faixas etárias pesquisadas. Para consultar o estudo na íntegra, clique aqui.
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