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Reverenciar aqueles que vieram antes abrindo portas e caminhos para as novas gerações, esse é o mote do novo single d’Acria: ‘Boombap’. Na faixa, mestres do Hip Hop nacional e internacional, além de nomes importantes da cultura popular pernambucana, são lembrados em uma espécie de agradecimento e homenagem. A música conta ainda com a participação do rapper Zé Brown, ele próprio um desses mestres que fizeram escola na cena musical de Pernambuco à frente do Faces do Subúrbio e, posteriormente, com seu trabalho solo. 

Esta não é a primeira vez que os rappers pernambucanos se encontram musicalmente. Eles já haviam gravado juntos em 2017, no projeto Cypher D’cria. O que, segundo Filipe Massa Acria, não faz esse novo encontro menos importante. “Acompanho o Face do Subúrbio de miliano, sou fãzaço, e é uma realização muito grande ter ele (Zé Brown) no feat. (sic)”, disse o rapper em entrevista ao LeiaJá. 

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A faixa foi gravada de forma independente, no estúdio de LF Beatmaker, que também assina a produção do trabalho. Reverenciando aqueles que vieram primeiro, a música cita grandes nomes do Hip Hop e da cultura pernambucana como uma espécie de agradecimento pelo abrir de portas. “A proposta é resgatar a raiz do rap, o seu primeiro gênero, o boombap, e falar de quem pavimentou a pista pra gente tá trilhando hoje. Ele (Zé Brown) é um exemplo e eu falo de outros nomes clássicos do hip hop, ele fala de nomes da cultura popular, tem essa homenagem aos dinossauros do Hip Hop nacional e internacional”, comenta Filipe. 

'Boombap' é o primeiro de uma série de lançamentos d’Acria programados para este segundo semestre. Nos próximos, o músico deve aventurar-se em outras vertentes do rap como o drill. A faixa já está disponível em todas as plataformas de streaming.  

 

O ano é 2021. Uma pandemia de medidas globais que assola o planeta se aproxima de seu segundo aniversário, enquanto em diferentes países do mundo a miséria, violência e até a fome voltam a se instalar com força assustadora. Diante desse contexto, o crescimento na venda de livros e nas assinaturas de serviços de streaming de música e filmes, além de outras plataformas digitais que compartilham arte e cultura, nos provaram o que muitos de nós já sabíamos: elas são de extrema importância para a sobrevivência humana. 

Porém, para consumirmos arte precisamos de pessoas para produzi-la. E pode parecer impensável criar coisas bonitas e que promovam alguma reflexão, ou até abstração, em meio a tamanho caos. Sobretudo no Brasil, onde equipamentos culturais simplesmente pegam fogo - como a Cinemateca Brasileira, consumida por um incêndio em julho deste ano após vários alertas ignorados pelo governo federal -, ao passo que a própria Agência Nacional de Cinema (Ancine) enfrenta uma crise interna que impossibilita o lançamento de novas produções.

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Isso sem contar, ainda, a extinção do Ministério da Cultura, promovida em 2018 pelo governo Bolsonaro, que deu lugar a uma secretaria especial cujo responsável, atualmente o ex-ator Mário Frias, costuma envolver-se em polêmicas por falas racistas e transfóbicas, além de se opor à propostas de fomento à cultura, como o projeto de lei Paulo Gustavo que pretende repassar mais de R$ 4 bilhões para o setor cultural brasileiro. Um dos poucos auxílios pensados durante a pandemia em função da classe artística, que foi duramente atingida pela crise que se instaurou

Apesar de ser possível enumerar muitos outros fatores que ilustram a desvalorização e desmonte da cultura brasileira, nesta terça (24), data em que é celebrado o Dia dos Artistas, o que a classe quer mesmo é comemorar. Kika Farias é atriz, arte educadora, contadora de histórias e produtora, com trabalhos na televisão, cinema e teatro. Para ela, celebrar os artistas e sua capacidade de resiliência e resistência é fundamental nesse momento delicado, porém, com uma ressalva. “A gente tem sim que comemorar a existência deles (artistas), porque se não fosse por causa deles o que seria da nossa pandemia, né? É de se tirar o chapéu para meus companheiros e companheiras de trabalho, porque é por causa deles que eu me inspiro para continuar. A gente tem que comemorar, mas com sabedoria. Vamos comemorar, mas vamos lutar pelos nossos direitos, por políticas públicas que incentivam a cultura e a educação nas escolas, na comunidade, na sociedade”, disse em entrevista exclusiva ao LeiaJá.

Após um período sem subir ao palco, em função dos protocolos de segurança da pandemia, Kika voltou a se encontrar com a plateia em meados deste mês de agosto, para uma sessão única do espetáculo Lendas Nordestinas, contemplado pelo edital de ocupação do Teatro Fernando Santa Cruz, localizado no Mercado Eufrásio Barbosa, em Olinda (PE).

A atriz  fala sobre a importância de iniciativas como essa, que possibilitam a circulação da arte, carente não só de incentivo como também de locais para acontecer. “Tenho percebido falta de espaços, falta de incentivo da prefeitura, do Governo do Estado para realização de eventos, editais - a gente só teve até agora (em Pernambuco) o Funcultura e a Aldir Blanc, é muito pouco pra quantidade de artistas que a gente tem aqui. Temos que fazer com que eles se apresentem e o público assista. A gente tem que buscar o caminho das políticas públicas pra gente poder resguardar nossa memória”. 

Kika se diz uma “funcionária do público” e revela ser um verdadeiro “malabarismo” conciliar o trabalho duro com as questões subjetivas do fazer artístico, parte ‘do espetáculo’ que o público muitas vezes ignora. “Acho que as pessoas que estão muito de fora não percebem o quanto o artista trabalha pra se apresentar durante meia hora. Elas não conhecem esse dia a dia, eles acham que artista é tudo ‘estrela’ e outra coisa, se não tiver na Globo você não é artista”, diz em referência a uma certa romantização e até mesmo estereotipação dos profissionais da arte.   

Tais questões, a atriz aponta como peças de uma engrenagem que, não à toa, teima em girar para o lado oposto do ideal da cultura, que costuma expandir horizontes. “Isso também é uma estratégia política de desmobilização dos artistas. A gente tá diante de um momento pandêmico que é único e com esse governo que tá aí, existe um desmonte da arte de da cultura porque é muito mais fácil manipular um povo sem cultura, sem educação. Isso é estratégia para deixar o povo à margem, isolado, porque a arte une. Você vai para uma brincadeira de ciranda, você segura na mão do outro, cavalo marinho, teatro, música, tudo é coletivo e é ali na união e na troca que a gente se fortalece. Isso é uma estratégia política de colocar a cultura do medo, isolar as pessoas e deixá-las ignorantes. Prato cheio para a manipulação”. 

Arte na coletividade

É também na tentativa de promover a união que o músico Filipe Massa vem pautando o seu fazer artístico. Na estrada há cerca de 20 anos, sendo metade deles à frente d'ACRIA, o músico vem transformando as dificuldades do ofício em oportunidade. “Quando eu comecei, a gente tinha que estourar numa rádio, alguém tinha que ver a gente, eu não sabia nem que caminho seguir, era sempre ‘alguém vai achar’ e hoje não. Hoje você tem um PC, uma placa, um microfone, uma câmera, você grava uma música, grava um videoclipe, você mesmo entra num site de distribuição e distribui, então é mais tranquilo e é até mais divertido produzir, porque você já sabe qual o caminho seguir”. 

Para trilhar esse caminho, o rapper busca produtores, beatmakers e outros artistas que estão no mesmo ‘corre' que ele, assim, o trajeto é compartilhado e acaba transformando-se numa corrente em que todos se apóiam. Seguindo essa lógica, durante a pandemia, Massa deu início a um projeto de lives em seu Instagram, o Live D’Cria, que traz diversos nomes do movimento Hip-Hop para lançamentos de trabalhos e troca de ideias; um espaço para dar visibilidade e “agregar” pessoas, como ele próprio coloca. A resposta do público tem sido positiva e ele já estuda novos formatos para futuras edições, com música ao vivo além do bate papo. 

A expertise de bancar sua arte de forma independente Filipe conquistou na própria lida. As dificuldades passam pelos poucos editais de fomento disponíveis e pela disparidade de pagamentos entre artistas locais e nacionais, com o agravante de que tais iniciativas também não contemplam o rap de forma adequada: “Em vários editais que eu já me inscrevi não tem o rap, então você se inscreve como MPB e quase nunca eles se referem ao rap, que é a música do movimento Hip Hop. A gente percebe que não tem uma atualização dos órgãos públicos”. A observação de Massa ilustra um certo despreparo daqueles colocados a serviço da promoção da cultura no poder público, Diante tais limitações, o rapper garante que é preferível se ‘jogar’ a depender de auxílios como esses. “Resumindo, não se deve esperar por esses órgãos e patrocinadores não. Tem que fazer seu corre e isso aí seria uma bonificação quando rolasse”. 

Acostumado a fazer da adversidade combustível para sua música, Filipe vê na dureza do momento atual um estímulo para realizar cada vez mais. Disposição  e coragem parecem não faltar a este artista. “A arte nunca fez tanto sentido, se fez eu não vivenciei. É tempo de se questionar, essa doença (Covid-19) não ataca só o corpo, ela ataca toda uma estrutura de saúde e também toda uma falta de educação. É uma doença que a gente tem que pensar no próximo, o brasileiro não pensa no próximo, então seria o momento perfeito pra mudar isso. Ao mesmo tempo que eu sinto tantas mortes, eu vejo como o momento certo pra mudar pra melhor, não aceitar mais as coisas que impedem a gente de cresce. É o momento que o rap de mensagem mais faz sentido, a gente tem motivos reais, sempre tivemos, mas temos motivos mais fortes ainda para cantar mais alto, fazer poesia protestando”. 

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Melhores tons

Dedicado às artes plásticas desde 1995, Roberto Ploeg conhece bem todos os melindres pertinentes à vida dos artistas brasileiros. Ele diz não ver “grandes mudanças” nas dificuldades pertinentes à profissão desde quando começou, mas prefere não ater-se a esse tema. Durante conversa com esta repórter, ele preferiu apontar algumas diferenças significativas que vêm sendo promovidas na área pela nova geração. 

Ploeg vê com bons olhos o espírito aguerrido e repleto de independência da nova safra de artistas plásticos da cena pernambucana. Jovens que não esperam por oportunidades, preferindo criá-las para reverter eventuais obstáculos, como a existência de poucos espaços para expor, por exemplo. “Tem iniciativas novas, alternativas de grupos que se formam e que não dependem dessas galerias institucionalizadas. A juventude não espera o ingresso nessas galerias mais conhecidas e faz seus próprios espaços, o bom é isso”. Ele cita uma delas, já extinta, porém. “Em Olinda, um lugar interessante e infelizmente não perceberam o valor disso, foi A Casa do Cachorro Preto. O que se viu ali em relação às artes visuais era muito interessante e agora abriu no Mercado Eufrásio Barbosa novos espaços que também vão dar um pouco mais de presença das artes visuais em Olinda”.

O artista também festeja o crescimento do número de mulheres artistas, que vêm atuando “na cena artística com muito vigor”, e a possibilidade de uma maior democratização da arte, a partir da exploração de plataformas alternativas - entre elas a própria rua, as redes sociais e, por que não, os corpos humanos -,  o que acaba por derrubar o estigma de que as artes plásticas seriam exclusividade de uma determinada classe mais privilegiada.  “Você tem a urban art, ou o grafite, as paredes que estão sendo apropriadas por artistas. Isso torna a visão sobre a produção visual artística mais democratizada. Também tem outros suportes, que não só a tela, hoje em dia você tem muito artista que é também tatuador e tem várias tendências de tatuagem autoral que são verdadeiras expressões artísticas. Essas peles circulam e fazem questão de serem vistas. As artes visuais estão presentes além dos muros e das paredes de galerias e museus”. 

Arte: instrumento de poder

Apesar de parecerem tão diferentes, esses três artistas demonstram uma grande semelhança: o espírito aguerrido. Peças fundamentais para o desenvolvimento da sociedade, eles são também exemplo de dedicação, perseverança e força de vontade. Elementos que corroboram com um poder único pertinente à arte e que faz dela ferramenta de educação, representatividade e fortalecimento. 

Fotos: Rafael Bandeira/LeiaJáImagens

 

O rap e o coco, tradicional ritmo da cultura popular pernambucana, podem parecer muito distintos, mas eles se combinam de maneira na música do grupo ACRIA. Isso pode ser comprovado no novo clipe do grupo, lançado nesta quarta (19), Reciferia. 

A música começa com um sampler de Dona Cila do Coco, cantando um convite: "Se não conhece o Recife, venha que eu vou lhe mostrar". Nada melhor para ilustrar a ideia do grupo, mostrar sua "vivência", como explicou em entrevista exclusiva ao LeiaJá, o rapper Filipe Massa: "O rap tá em um momento em que o pessoal meio que tá esquecendo o que tem aqui de alicerce. ACRIA tem esse lance do regional, daí vem dessa necessidade de falar da gente, de quem veio antes da gente, da vivência da gente, Recife e Olinda também". 

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Reciferia é uma das quatro músicas do  recém lançado EP d'ACRIA, Salve os Imortais Cantadores de Rua, disponível no YouTube e, em breve, em outras plataformas digitais. As outras faixas do EP deverão ganhar videoclipe em breve. 

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