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A quantidade de armas em acervos particulares no país, ou seja, não institucionais de órgãos públicos, se aproxima de 3 milhões. Nessa conta, consideramos as armas pessoais ou particulares pertencentes a: Caçadores, atiradores desportivos e colecionadores (CACs); Cidadãos comuns com registro para defesa pessoal;   Caçadores de subsistência; Servidores civis (como policiais e guardas civis) com prerrogativa de porte e que compraram armas para uso pessoal; Membros de instituições militares (policiais militares, bombeiros militares e etc) que compraram armas para uso pessoal.

Esse acervo mais do que dobrou quando comparado com o existente em 2018, que era de apenas 1,3 milhão de armas. Esse aumento rápido é preocupante pelas diversas pesquisas que relacionam a maior disponibilidade de armas com aumento da violência, em especial quando estão nas mãos de particulares e não são submetidas aos controles existentes, por exemplo, em Corregedorias e Ouvidorias.

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Além do aumento na quantidade, chama atenção a mudança de perfil desses registros. Em 2018, quase metade do acervo de armas pessoais então existente pertencia a membros de instituições militares (47%). O restante do acervo particular era praticamente dividido entre os registros na Polícia Federal (de armas pertencentes a servidores civis, cidadãos comuns com registro para defesa pessoal e caçadores de subsistência - com 26%) e registros pertencentes a CACs (27%).

Ao longo dos últimos quatro anos, essa proporção se inverteu com o crescimento da categoria de CACs, que passou a ter 42,5% do total de armas particulares no país, em 2022. Este é um efeito imediato do descontrole promovido pelos mais de 40 atos infralegais - decretos, portarias e instruções normativas - publicados entre 2019 e 2022, quase todos regredindo em controles até então vigentes. Os CACs foram a categoria mais beneficiada por essas mudanças, como a facilitação do porte municiado, o acesso a armas mais potentes e em grande quantidade.

"Esse aumento traz um impacto bastante significativo. Primeiro porque as armas na mão de militares, ainda que não seja de maneira institucional, estão com um grupo que tem treinamento para isso. Tem alguma vinculação de controle", diz Melina Risso, diretora de esquisa do Instituto Igarapé.

"O acesso às armas foi amplamente flexibilizado, mas não tivemos aumento na mesma intensidade do controle salvaguarda tínhamos antes. Por exemplo, os atiradores tinham classes dentro da categoria. O acesso a outros tipos de armamento dependidam da sua progressão no esporte. Nos últimos quatros anos acabamos com essa progressão até (que progressivamente atingam) as armas de grosso calibre. O acervo deles tornou-se mais potente".

Quando analisamos a quantidade de armas compradas por ano, vemos que a categoria dos CACs tinha um ritmo de compra muito mais lento no ano de 2018, com apenas 59 mil novas armas adquiridas. A partir de 2019, as compras dessa categoria se intensificam rapidamente.

No ano de 2022, vemos o ápice com mais de 430 mil novas armas compradas por esse grupo, volume maior do que o que fora adquirido entre 2018 e 2020, e mais de sete vezes maior do que a quantidade adquirida em 2018. Essa altíssima velocidade de compra se contrapõe à capacidade estatal de verificar essas solicitações apropriadamente e fiscalizar esse mercado que impacta diretamente na segurança pública.

'Podemos dizer que a quantidade aumentou demais. Temos mais armas e elas são mais potentes. As apreensões em São Paulo e no Rio já mostram um aumento de fuzis. E, portanto, há um alerta a ser feito: não estamos dizendo que um atirador CAC compra arma para desviar, mas o mercado das armas também funciona sob a ótica econômica de qualquer outro item. Há oferta e procura. Sabendo o aumento dessa oferta de armas, o crime se organiza para explorar essa movimentação. É um canal a mais para o crime explorar", diz Carolina Ricardo, diretora-executiva do Sou da Paz.

*Da assessoria 

Em dez anos, entre 2001 e 2010, 93% das pessoas que morreram em supostos tiroteios com a Polícia Militar em São Paulo moravam na periferia. O distrito com mais casos é Sapopemba, na zona leste, com 52 ocorrências. O levantamento do Instituto Sou da Paz usa dados do Programa de Aprimoramento das Informações de Mortalidade da Secretaria Municipal da Saúde.

As chamadas "resistências seguidas de morte" - na Saúde definidas como mortes por "intervenção legal" - também crescem de acordo com gênero, idade e raça das vítimas. Negros e pardos foram os que mais morreram nos últimos dez anos: 54% do total de vítimas na cidade, enquanto no Censo de 2010 apenas 37% da população de São Paulo se declara dessas raças.

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Quase todas as vítimas (99,6%) são homens. Em dez anos, só cinco mulheres morreram em supostos confrontos. Segundo Lígia Rechenberg, coordenadora de análise de dados do Instituto Sou da Paz, a idade dos mortos impressiona: 60% têm entre 15 e 24 anos. "A situação mais estranha é a dos jovens com 16 e 17 anos, que correspondem a 9% do total de vítimas e apenas 3,6% da população. É preciso entender por que esses adolescentes estão morrendo", diz Lígia.

A violência policial em Sapopemba começou a chamar a atenção em 2003. Um dos principais nomes na defesa dos direitos humanos no bairro, Valdênia Aparecida Paulino, sofreu ameaças por denunciar o envolvimento de policiais nos crimes e precisou sair do Brasil. "A falta de equipamentos públicos, moradia digna, acesso de qualidade à educação, saúde e cultura, a atuação desumana da polícia e o envolvimento de jovens com drogas e infrações são os maiores desafios do bairro", diz Sidnei Ferreira da Silva, coordenador do Núcleo de Cultura do Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca).

Na zona leste, os bairros de Cidade Tiradentes (33 ocorrências) e Itaquera (31) ficam em quarto e quinto lugares. Brasilândia, na zona norte, é o segundo, com 48 casos. Capão Redondo, na zona sul, fica em terceiro, com 35 ocorrências. Na história recente da PM, em 2004, um caso notório foi o assassinato do dentista Flávio Ferreira Sant'Ana, de 28 anos - os policiais pensavam que ele era um assaltante. Flávio era negro e filho de um sargento aposentado da PM. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

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