Tópicos | Lei de Alienação Parental

Não avisar sobre eventos escolares, não incentivar a criança a ir à casa do pai ou da mãe ou mudar de endereço com o objetivo de dificultar a convivência são considerados atos de alienação parental, de acordo com o novo texto da Lei 12.138 de 2010, alterado no último dia 18 de maio. A mudança também aproxima o Ministério Público da atuação em prol da criança e do adolescente. 

De acordo com o projeto sancionado, se houver indícios de violação de direitos de crianças e adolescentes, o juiz deve comunicar o fato ao MP. A proposta começou a tramitar no Senado apresentado pelo então senador Ronaldo Caiado (GO). Ao tramitar na Câmara, o texto foi apensado a outras 13 proposições e voltou ao Senado com uma série de mudanças propostas na Lei da Alienação Parental e no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069 de 1990).  

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O texto aprovado, porém, levantou questionamentos sobre a participação e o interesse equilibrado de ambas as partes. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mães representam a maioria dos lares de referência em casos de guarda compartilhada ou unilateral após o divórcio. Assim, debates sobre o peso exercido pela nova alteração à rotina da maternidade voltaram à tona recentemente. 

Para repercutir melhor o assunto, o LeiaJá convidou uma especialista jurídica, que esclarece ao leitor os impactos jurídicos e práticos da mudança. Confira a entrevista abaixo. 

— Convidada: Lorrana Gomes, advogada e consultora jurídica pela OAB-MG 

LJ: Qual o entendimento jurídico desta alteração? Dentro do âmbito da alienação, em que implicam essas atitudes? 

LG: Na realidade, o direito não é só com base na lei, mas também com base em doutrinas e jurisprudências. Então, apesar da lei ter sido sancionada agora, a gente já tinha algumas decisões que eram consideradas alienação, como não comunicar as atividades escolares ou qualquer coisa que afaste a convivência da pessoa com a criança. Assim, o que aconteceu foi uma formalização de algo que, na realidade, já era conhecido. Do ponto de vista jurídico, a alteração veio para trazer mais segurança jurídica, e maior cautela para os pais e cuidadores na tratativa em relação aos filhos, principalmente quando há uma guarda compartilhada ou unilateral.  

LJ: Chama atenção a não realização de algumas atualizações sobre o cotidiano da criança e/ou adolescente. Se sabe que as mães são maioria na responsabilidade legal com os filhos após o divórcio. As novas medidas podem acabar sendo um peso a mais para a maternidade? 

Na prática, o que tem é uma formalização da necessidade de uma comunicação a respeito da vida da criança por aquele pai detentor da guarda. Em uma guarda compartilhada, normalmente, o lar de referência é materno. Nada impede que seja o pai ou outra pessoa da família, mas comumente, a criança fica com a mãe. O pai tem o direito de saber do cotidiano da criança. Logicamente, os eventos escolares, por exemplo, ficam disponíveis no calendário letivo da escola. O próprio pai pode estabelecer uma comunicação com a escola e procurar saber. O que não pode haver é uma ocultação, de forma a tentar afastar a figura paterna ou materna da criança. Não necessariamente a mãe tem que comunicar tudo o que acontece na vida da criança. 

Por exemplo, se a criança vai para a escola, não tem necessidade de isso ser comunicado. Seriam coisas mais excepcionais. Mandar o calendário já seria comunicar a pessoa. Se houver algum questionamento, porém, ele tem que ser respondido, a respeito da criança, pois é direito da pessoa. Se o pai ou genitor é um pai ausente e não procura saber, não visita a criança, não há necessidade alguma da mãe ficar comunicando algo. No caso de acontecer algo muito grave, como a criança ser hospitalizada, eu aconselho comunicar, ainda que o pai seja ausente, para evitar situações posteriores. 

LJ: As novas definições podem livrar um dos responsáveis de suas responsabilidades? Elas deixam brechas para que se crie mais atritos na relação entre os pais e a criança?  

LG: Eu não vejo como um ponto negativo porque, por mais que a pessoa tenha praticado a alienação parental, ela tem uma autoridade sobre aquela criança que não pode ser retirada de fato. Eventualmente, é necessário que a autoridade seja exercida, não necessariamente sem ser penalizada. Existem inúmeras penalizações. Vejo essas alterações como alterações singelas e que não trazem tanto impacto em como as coisas já são aplicadas. É necessária uma atualização das normas, conforme a modernidade. Antigamente não tinha essa necessidade de comunicar a rotina escolar, mas hoje é muito fácil fazer isso. É importante que sejam feitas essas alterações para que vejamos que o tema é importante, não foi esquecido e que o maior prejudicado é a criança. 

LJ: Como pais e responsáveis podem mediar e se proteger, além de proteger a criança, nessas situações? 

LG: Sempre que os pais estejam diante de uma situação de alienação parental, é necessário fazer um boletim de ocorrência, porque se trata de um quadro criminoso. É muito importante um registro do fato, reunir o máximo de provas possíveis e procurar um acompanhamento jurídico: advogado, defensoria pública ou até mesmo o Ministério Público, que pode intervir nesses casos, quando há interesse de menor. A melhor forma de se proteger da alienação parental é não descontar o relacionamento do casal na criança. Se o casal passou por brigas, traição ou entraves, seja qual for o motivo da separação, não se deve utilizar a criança como mecanismo de vingança. "Não vai pegar o meu filho, não vai ver o meu filho"; a criança e o adolescente não têm culpa de absolutamente nada e não podem ser penalizados. É um trabalho mais terapêutico, psicológico mesmo, dos pais, no ato da separação. 

LJ: Como a alienação parental pode afetar a vida de uma criança e/ou adolescente? 

LG: Uma criança ou adolescente vítima de alienação parental pode ter problemas em inúmeras esferas da vida. O profissional mais habilitado para avaliar é um psicólogo, mas da minha experiência, é incontestável que as consequências psicológicas na vida do ser humano, quando ele é vítima de alienação, caminham e o acompanham pelo resto da vida. Isso vai interferir na forma como ele se relaciona, educa os próprios filhos. Esse é o momento da construção do ser humano e será refletido o que a pessoa passou na infância. É muito importante a proteção do convívio harmônico.  

Mais sobre a alteração na Lei 12.138/2010 

A nova norma retira a suspensão da autoridade parental da lista de medidas possíveis a serem usadas pelo juiz em casos de prática de alienação prevista anteriormente na Lei 12.138 de 2010 (Lei da Alienação Parental). De acordo com a legislação, alienação parental caracteriza-se pela interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida por um dos pais, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou prejudique os vínculos com um dos pais.   

A lei assegura à criança e ao genitor a visitação assistida no fórum em que tramita a ação ou em entidades conveniadas com a Justiça, com exceção dos casos em que há risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou adolescente. Outro artigo prevê que a concessão de liminar deve ser preferencialmente precedida de entrevista da criança ou do adolescente perante equipe multidisciplinar. 

 

A bancada feminina da Câmara dos Deputados de Pernambuco está mobilizada pela revogação da Lei de Alienação Parental (LAP), por meio de um Projeto de Lei com a autoria da deputada Iracema Portella (PP-PI) e co-autoria de várias deputadas dos mais diversos partidos. A parlamentar escolhida para coordenar o grupo de trabalho à frente do projeto foi Marília Arraes (PT-PE), segundo nota divulgada nesta terça-feira (27).

"Temos visto muitos casos de agressão e abusos a crianças, por isso estamos mobilizando a bancada feminina para que essa lei seja revogada”, comenta a deputada pernambucana, sobre a lei aprovada em 2010. O grupo de trabalho está atrelado à Secretaria da Mulher da Casa e tem o apoio das parlamentares de todos os partidos. "Todos os demais países que possuíam legislação similar já revogaram em função dos problemas e riscos às crianças que vinham sendo observados. É fundamental que ela seja revista no ordenamento jurídico brasileiro”, continua Arraes.

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A primeira reunião do grupo de trabalho para debater a alienação parental foi realizada na manhã desta terça-feira (27). Através da coordenação de Marília, o grupo considera que a elaboração da Lei possui vícios prejudiciais, com a falta de verificação de órgãos internacionais de saúde e por existir confusão no sistema jurídico na hora de tratar o tema.

"O Brasil é o único país do mundo que tem uma legislação como essa ainda em vigor. A gravidade da situação é tanta que o tema uniu as deputadas, independentemente do campo político em que atuam. É uma lei tão absurda que a ONU, a OEA e a CONANDA já orientaram por sua revogação", ressaltou, por fim.

O que é a Lei de Alienação Parental?

O conceito de Síndrome de Alienação Parental foi inserido no meio jurídico em 1985 pelo psiquiatra Richard Gardner, que alegava que um dos genitores poderia usar os filhos de forma vingativa contra o outro. Apesar do conceito, a Organização Mundial de Saúde (OMS) nunca reconheceu a alienação parental como síndrome.

Em 2010, foi sancionada no Brasil a Lei de Alienação Parental em uma tentativa de solucionar problemas advindos de separações litigiosas. Desde sua vigência, entretanto, foi verificada a existência de graves distorções na real intenção do legislador durante a prática da lei. Nos últimos 11 anos de vigência da LAP, foram surgindo cada vez mais casos em que ao denunciar o genitor abusador, este abriria um processo de alienação parental.

"Um exemplo muito simples é quando a mãe denuncia o pai depois da criança chegar em casa e contar que foi abusada. A mãe toma todas as providências e não deixa a criança voltar para o pai. Com isso, o pai alega que a mãe está inventando situações e vai para a Justiça, usa a Alienação Parental e toma a guarda da mãe. Depois de vários casos virem à tona, estamos conseguindo mobilizar a Câmara. É justo?", questiona a coordenadora.

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