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A Justiça Federal de Campos dos Goytacazes, no norte fluminense, condenou na última quinta-feira (8), Cláudio Antônio Guerra, ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) do Espírito Santo, a sete anos de prisão, em regime semiaberto, pelo crime de ocultação de cadáver. A decisão da semana passada foi divulgada nessa segunda-feira (12) pelo Ministério Público Federal (MPF).

A ação penal ajuizada pelo MPF está relacionada ao desaparecimento de 12 militantes políticos durante o regime autoritário. As vítimas são: Ana Rosa Kucinski Silva, Armando Teixeira Frutuoso, David Capistrano da Costa, Eduardo Collier Filho, Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira, João Batista Rita, João Massena Melo, Joaquim Pires Cerveira, José Roman, Luís Inácio Maranhão Filho, Thomaz Antônio da Silva Meirelles Neto e Wilson Silva.

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Na sentença, a Justiça Federal reconheceu “a imprescritibilidade dos crimes sob apuração, aqui considerados como crimes contra a humanidade (ou de lesa-humanidade), em atenção à Constituição da República, às normas internacionais de direitos humanos e à jurisprudência sedimentada no âmbito dos sistemas global e interamericano de proteção aos direitos humanos”.

Denúncia

A denúncia contra Guerra foi apresentada, em julho de 2019, pelo procurador da República Guilherme Garcia Virgílio, do MPF em Campos dos Goytacazes. O réu foi acusado de destruição e ocultação de cadáveres. Segundo o procurador, as ações criminosas de Guerra são graves e não devem ser toleradas em uma sociedade democrática. “O comportamento do réu se desviou da legalidade, afastando princípios que devem nortear o exercício da função pública por qualquer agente do Estado, sobretudo daquele no exercício de cargos em forças de segurança pública, a que se impõe o dever de proteção a direitos e garantias constitucionais da população”, afirmou o procurador Virgílio.

Relato

Os crimes cometidos por Guerra foram investigados em processo criminal, baseado em seus próprios relatos no livro Memórias de Uma Guerra Suja. Ele confessou ter recolhido os corpos de 12 pessoas e levado para serem incinerados entre 1973 e 1975. Os corpos foram retirados de locais como a "Casa da Morte" em Petrópolis (RJ) e o DOI-Codi no Rio de Janeiro, sendo incinerados posteriormente na Usina Cambahyba, em Campos dos Goytacazes. A confirmação dos corpos levados por Guerra foi feita em vários depoimentos, incluindo um prestado no MPF no Espírito Santo. Essas 12 pessoas mencionadas por Guerra fazem parte de uma lista de 136 pessoas consideradas desaparecidas pelo relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV).

A condenação cabe recurso. A Justiça Federal concedeu a Cláudio Guerra o direito de recorrer em liberdade. A Agência Brasil não conseguiu contato com a defesa do ex-delegado do antigo Dops.

 

O Ministério Público Federal (MPF) oficiou uma denúncia contra o ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), Cláudio Antônio Guerra, 79 anos, por ocultação e destruição de 12 cadáveres, nos anos entre 1973 e 1975, por meio de incineração em fornos da Usina Cambahyba, em Campos, Norte-Fluminense. O crime está previsto no artigo 211 do Código Penal. 

De acordo com o MPF, sob forma de confissão espontânea no livro Uma Guerra Suja, Cláudio Antônio Guerra relata que na década de 70 recolheu no imóvel conhecido como “Casa da Morte”, em Petrópolis (RJ), e no Destacamento de Operação de Informação e Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), na Tijuca, os corpos de 12 pessoas, levando-os para o município de Campos dos Goytacazes (RJ), onde foram incinerados, por sua determinação livre e consciente, nos fornos da Usina Cambahyba.

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Uma das vítimas do regime que teve o corpo incinerado no local, segundo um laudo da Comissão Nacional da Verdade, foi Fernando Santa Cruz, pai do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) disse saber a verdade sobre o desaparecimento dele, negou que Fernando tivesse sido vítima de militares e acusou o movimento Ação Popular, do qual o pernambucano fazia parte, de matá-lo por suspeita de traição. 

O órgão acredita que Cláudio Antônio Guerra “agiu por motivo torpe, visando assegurar a execução e sua impunidade, com abuso do poder inerente ao cargo público que ocupava”.

“Assim, com o objetivo de assegurar a impunidade de crimes de tortura e homicídio praticados por terceiros, com abuso de poder e violação do dever inerente do cargo de delegado de polícia que exercia no Estado do Espírito Santo, foi o autor intelectual e participante direto na ocultação e destruição de cadáveres de pelo menos 12 pessoas, nos anos de 1974 e 1975”, argumenta o procurador da República Guilherme Garcia Virgílio, autor da denúncia.

Além da condenação pelos crimes praticados, pede-se o cancelamento de eventual aposentadoria ou qualquer provento de que disponha o denunciado em razão de sua atuação como agente público, dado que seu comportamento se desviou da legalidade, afastando princípios que devem nortear o exercício da função pública.

As doze pessoas citadas por Cláudio constam na lista de 136 pessoas dadas por desaparecidas da Lei n° 9.140 de 1995, que “reconhece como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação ou acusação de participação em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979”.

O MPF argumenta ainda que não se pode considerar os crimes praticados pelo ex-delegado na Lei da Anistia, tendo em vista que a referida lei trata de crimes com motivação política. 

“Não importa sob que fundamentos ou inclinações poderiam pretender como repressão de ordem partidária ou ideológica, sendo certo que a destruição de cadáveres não pode ser admitida como crime de natureza política ou conexo a este”, pontua.

A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio e a Comissão Estadual da Verdade (CEV-RIO) realizaram nesta terça-feira uma audiência pública para debater o destino do prédio onde funcionou o antigo Departamento de Ordem Política e Social (Dops), no centro do Rio, usado para repressão política e torturas durante a ditadura militar.

Atualmente sob a guarda da Polícia Civil, o espaço está inutilizado pelo menos desde 2008. Consultado pela CEV-RIO sobre a proposta de transformar o prédio em um Espaço de Memória, o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos manifestou apoio à iniciativa. O prédio foi tombado em 1987 pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (INEPAC). Na audiência, foi apresentada uma minuta de decreto que vincule o prédio às secretarias estaduais de Cultura e de Assistência Social e Direitos Humanos. Representantes da Polícia Civil defenderam a instalação do Museu da Polícia no local.

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"O ex-governador Sergio Cabral (PMDB), no dia da posse da CEV-Rio, fez duas promessas: destinar recursos para fomentar pesquisas que auxiliassem o trabalho da comissão e destinar o prédio para a construção de um centro de memória. Nós queremos que o governo cumpra com a sua palavra. O meu desejo é que a Comissão da Verdade do Rio possa deixar esse legado para o povo brasileiro", disse Nadine Borges, presidente da comissão.

A comissão elaborou um plano de uso para o lugar. A ideia é, por exemplo, ter um Centro de Referência dos Direitos Humanos, ser a sede do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos e da Comissão de Reparação de Ex-Presos Políticos do Estado do Rio de Janeiro, além de local de armazenamento dos documentos do Dops, que estão abandonados. "A transformação do prédio do Dops é uma luta antiga de ex-presos políticos, de ativistas de direitos humanos e de familiares de mortos e desaparecidos. Mais de 50 entidades da sociedade civil organizada já assinaram o manifesto para transformar o Dops em um marco na defesa e na promoção dos direitos humanos ao construir, naquele local, um memorial da resistência. É preciso que aquele espaço seja ligado à vida", disse Ana Miranda, que passou nove meses presa no Dops e, na audiência, representou a campanha Ocupa Dops.

Gilbert Stivanello, assessor de Relações Institucionais, assumiu que o prédio não está em boas condições, mas reiterou o desejo de que ali seja criado o Museu da Polícia, para contar os 104 anos da corporação. "O Dops funcionou em apenas uma sala e era gerenciado pelos militares e não pela Polícia Civil. Nós nos envergonhamos do Dops e não temos o intuito de esconder a história, mas precisamos preservar a história da polícia", disse ele, acompanhado de Fernando Vila Pouca, chefe de gabinete da Polícia Civil.

O policial civil aposentado Manoel Aurélio Lopes, de 77 anos, admitiu nesta terça-feira, 25, em audiência pública da Comissão Nacional da Verdade, em São Paulo, ter presenciado cenas de tortura de presos políticos nas dependências do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), nos anos da ditadura militar. Ele atuou naquela instituição entre 1969 e 1972. Depois foi transferido para o Destacamento de Operações de Informações - Centro de Informações de Defesa Interna (DOI-Codi), vinculado ao 2.º Exército, onde voltou a presenciar torturas, segundo seu depoimento.

Esta foi a segunda vez que um agente de Estado admite perante a Comissão da Verdade, em audiência pública, a existência de tortura nas instituições policiais e militares naquele período. O primeiro foi o policial militar Valter Jacarandá, que prestou depoimento no Rio, em agosto do ano passado.

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Lopes era escrivão e, segundo informou, cuidava principalmente da transcrição de depoimentos. Ele negou ter participado de interrogatórios nos quais os presos eram torturados. Ao ser perguntado, porém, se nunca tinha presenciado cenas de torturas, ele admitiu que sim, tanto no Dops quanto no DOI-Codi. Disse que tinha autorização para circular pelas dependências das duas organizações e que testemunhou casos em que o prisioneiro, homem ou mulher, era forçado a se equilibrar sobre duas latas de leite em pó, com os braços abertos e segurando folhas de papel. Quando o detento perdia o equilíbrio ou deixava os braços caírem, apanhava. Entre ex-presos políticos, esse tipo de tortura é conhecido como Cristo Redentor.

Ele também fez referência à cadeira do dragão, que era de ferro e servia sobretudo para aplicar choques elétricos nos prisioneiros. "Outro quadro que presenciei foi o 'pendura'", disse a jornalistas, após a audiência, referindo-se ao chamado pau-de-arara.

Lopes é diabético, tem problemas circulatórios e dificuldades de audição. Na avaliação dele, "aquela foi uma fase do Brasil', na qual teriam ocorrido "excessos dos dois lados.

Ele contou que os policiais civis que eram transferidos para atuar sob ordens de militares, no DOI-Codi, recebiam uma gratificação extra, em dinheiro. "Era um presente para quem ia trabalhar lá, uma casquinha", observou.

A gratificação não aparecia na folha de pagamento e, segundo Lopes, saía diretamente do gabinete do secretário de Segurança. Todo mês era preciso retirar o dinheiro no gabinete do secretário, que então funcionava na Avenida Higienópolis.

"O trabalho no DOI era degradante. Não se ajustava a qualquer pessoa", afirmou, referindo-se aos policiais que atuavam diretamente nos interrogatórios, a chamada turma da "análise de informações".

O policial aposentado também fez referências ao apoio dado por grandes grupos financeiros e industriais à repressão. Entre outros, citou o caso, já bastante conhecido, do Grupo Ultragaz, que fornecia refeições para os agentes do DOI-Codi.

Lopes foi chamado para depor porque foi um dos agentes do DOI-Codi que assinaram o auto de exibição e apreensão de armas e documentos que teriam sido encontrados com Arnaldo Cardoso Rocha, militante da Ação Libertadora Nacional morto em 1973. Segundo a versão oficial, ele teria sido morto durante um confronto com a polícia. Mas, de acordo com documentos que estão em posse da Comissão da Verdade, ele foi torturado e executado

O auto de apreensão foi redigido quatro dias após o suposto tiroteio e as armas não foram apresentadas ao escrivão. Nesta terça, ele disse que essa prática não era incomum. Também afirmou que não podia garantir que a assinatura era mesmo dele.

Diante da insistência de Iara Xavier Pereira, companheira de Arnaldo, para que o policial desse alguma informação, qualquer coisa que ajudasse a esclarecer as circunstância da morte, ele respondeu: "Lamento que eu não tenha convicção para falar mais."

Iara, que estava na mesa e participou diretamente do interrogatório, disse ao Estado que considerou o depoimento do policial extremamente cauteloso e, alguns pontos, inverossímil. "Ele disse que nunca ouviu os gritos das pessoas torturadas no DOI-Codi. Isso é impossível. Todas as pessoas que passaram por lá disseram que ouviam."

Lopes disse que aceitou o chamado para depor porque deseja contribuir para o esclarecimento dos fatos ocorridos naquele período. Se ele não fosse, poderia ser convocado pela Comissão Nacional.

A audiência foi a segunda realizada pela CNV e pela Comissão Rubens Paiva sobre oito casos de mortes de jovens integrantes da Ação Libertadora Nacional (ALN) em São Paulo.

A preservação dos imóveis que funcionaram como centros de tortura e sua transformação em centros de memória é uma forma de "reparação simbólica" pelos abusos cometidos por agentes do Estado durante o período da ditadura militar. Esse é o entendimento do Ministério Público Federal (MPF) em Minas, de parlamentares mineiros e de representantes de entidades e movimentos sociais ligados à questão, que pediram ao Executivo mineiro a preservação da memória em prédios usados pela repressão aos opositores do regime.

Entre os imóveis estão a sede do Colégio Militar do Exército Brasileiro em Belo Horizonte e ao menos quatro presídios, incluindo o de Linhares, em Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira. Por lá passaram presos hoje ilustres como a presidente Dilma Rousseff, o ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) e o prefeito da capital, Marcio Lacerda (PSB), entre outros.

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Em Belo Horizonte, o grupo pede ainda o tombamento do edifício onde funcionou o Departamento de Ordem Política e Social (Dops). O órgão, um dos principais instrumentos da repressão aos opositores do governo militar, está localizado no bairro Funcionários, na região centro-sul de Belo Horizonte. Foi lá também que foi instalado, a partir de 1970, o Centro de Operações de Defesa Interna (Codi) do Exército na capital.

Com o fim da ditadura, o imóvel passou a abrigar o Departamento Estadual de Operações Especiais (Deoesp) da Polícia Civil mineira. Uma lei estadual de 2005, de origem do Legislativo, previa transformar o imóvel em um memorial de direitos humanos, mas foi aprovada nova legislação e, hoje, o prédio sedia o Departamento de Investigações Antidrogas da corporação.

A ideia, segundo o MPF, é que os imóveis públicos que "funcionaram como centros de repressão ou local de abusos, torturas e mortes provocadas em razão da perseguição política" sejam transformados em centros de memória que funcionem com a participação da sociedade civil, de ex-presos políticos e de parentes de mortos e desaparecidos no período do governo militar. No entendimento da Procuradoria da República, é importante a preservação da história recente nestes locais porque "a memória coletiva desses acontecimentos vai se perdendo à medida em que o tempo passa, e eles vão se tornando ou um assunto restrito às pessoas que de alguma forma foram afetadas pela repressão política ou ficam limitados a estudos acadêmicos".

A solicitação de tombamento do antigo Dops foi encaminhada ao Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultura de Belo Horizonte, mas a documentação ainda está sob análise. O pedido, segundo o MPF, foi feito também à Secretaria de Estado da Cultura, mas a assessoria do órgão informou que a pasta aguarda a chegada de documento oficial com a solicitação. Após a formalização do pedido, o caso é encaminhado para o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha) para que seja feita uma avaliação técnica a ser submetida ao Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep), que decide sobre o tombamento.

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