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A defesa do rapaz amarrado pelos pés e mãos com corda durante uma abordagem policial protocolou pedido de indenização por danos morais de R$ 1 milhão na Justiça paulista, nesta terça-feira (23). A ação pede a condenação do estado de São Paulo pela prática de tortura cometida por policiais militares no exercício da profissão.

“Como um verdadeiro animal, remetendo às imagens degradantes da época da escravatura, o autor foi mantido com seus pés e suas mãos amarrados por mais de três horas, conforme o depoimento da testemunha”, aponta o advogado na ação ajuizada. As agressões contra Robson Rodrigo Francisco começaram após sua recusa em sentar-se, destacou o advogado José Luiz de Oliveira Júnior.

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Imagens das câmeras corporais dos policiais militares e do sistema de segurança de um prédio, reunidas e divulgadas pelo G1, revelaram que o então suspeito já estava algemado quando foi amarrado por cordas. Um dos policiais aperta as amarrações, deixando mãos e pés bem juntos, atrás do corpo do rapaz, na altura do quadril.

Com base nas imagens, o advogado reforçou que não houve qualquer agressão por parte de Robson que pudesse desencadear tal conduta dos agentes. “Em razão da violação à sua integridade física e moral, em decorrência de uma abordagem policial excessiva e violenta, baseada em pura tortura ao custodiado, é que o autor propõe a presente”, destaca a ação, que classifica a conduta dos policiais de tratamento desumano e degradante.

A defesa cita ainda a previsão na legislação sobre o direito de Robson em receber tratamento digno mesmo em situação de privação de sua liberdade e o entendimento pela responsabilização do estado nos casos de abuso de autoridade cometido por policiais militares no exercício da profissão.

"Ação é pertinente"

Diretora executiva do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Marina Dias avalia que a ação indenizatória em favor de Robson é pertinente. Ela acrescenta que é indiscutível que houve dano moral e abuso do estado. “A gente precisa cada vez mais entrar com ações indenizatórias sempre que existe uma situação de violência do estado praticada, porque é uma forma de começar a estabelecer a responsabilidade do estado com relação a essas violações e a importância de mudar essa realidade”, disse.

Ela ressalta que, no Brasil, a política de segurança pública está focada no policiamento ostensivo, o que resulta no uso da abordagem policial como instrumento de controle de determinados territórios e determinados corpos, além de uma presença opressiva do estado. Ela chama atenção para a ocorrência de racismo nas abordagens, revelada na pesquisa “Por que eu?”, do IDDD, que mostrou que, a cada dez pessoas abordadas, oito são negras.

“A abordagem tem que acontecer dentro dos limites da Constituição Federal, em respeito à dignidade da pessoa humana. Jamais, mesmo que a pessoa seja resistente, se pode amarrar uma pessoa. Isso é gravíssimo, existem protocolos para o uso da força, e certamente esses protocolos não foram seguidos por esses policiais”, disse Marina Dias, sobre o caso Robson.

Para evitar casos de excesso de uso da força e práticas violentas cometidas por agentes de estado, ela aponta a necessidade de o Ministério Público exercer o seu dever de controle da polícia e o Judiciário fazer o controle constitucional das ações da polícia. Além disso, ela indica uma capacitação da polícia sobre o tema, inclusive com relação a letramento racial.

A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo informou, em nota, que os policiais envolvidos na ocorrência retornaram às atividades de policiamento ostensivo em agosto de 2023 após período de avaliação psicológica. “O caso em questão foi investigado por meio de Inquérito Policial Militar (IPM) e remetido ao Tribunal de Justiça [Militar] também em agosto”, diz a nota.

Histórico

Em junho do ano passado, o então suspeito foi amarrado pelos pés e mãos com corda por policiais militares durante uma abordagem que resultou em prisão por furto. Robson foi amarrado de forma que não conseguisse ficar em pé nem sentado, após ser encontrado com duas caixas de chocolate, que seriam fruto do crime.

Em outubro do ano passado, em audiência na Justiça paulista, Robson assumiu o furto das duas caixas de chocolate, mas não foi sentenciado. Ele está atualmente em liberdade provisória. Ainda não há data para a próxima audiência, segundo o advogado de defesa.

Em vídeo feito por testemunha na ocasião da prisão, quando o então suspeito foi levado para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), é possível vê-lo no chão, enquanto os policiais estão em pé. Na sequência, o rapaz é arrastado pelo chão por um dos agentes para dentro de uma sala. Depois, Robson é carregado por dois policiais, que o seguram pela corda e pela camiseta. Ainda amarrado, ele é colocado no porta-malas de uma viatura.

No mesmo mês da prisão, o caso já teve desdobramento na Justiça paulista, que o tornou réu, enquanto seis policiais, que estavam afastados das atividades operacionais, ainda passavam por investigação para apurar “eventuais excessos”. Advogados de entidades de direitos humanos ouvidos pela Agência Brasil avaliaram que em nenhum cenário tal conduta dos policiais, durante a prisão de Robson, seria aceitável. As cenas foram comparadas ao período da escravização e barbárie.

Uma diretora de abrigo que acolhe crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade foi presa acusada de tortura e maus-tratos na última sexta-feira (27). De acordo com a Polícia Civil do Estado de Goiás, a mulher trancava as crianças em um quarto escuro e as deixava sem comer como forma de punição

O delegado responsável pelas investigações do caso, Humberto Soares, relatou ao G1 que a acusada, que não teve o nome divulgado, "coagia o pessoal da assistência social a emitir pareceres sociais destoantes da realidade, para colocar crianças em famílias substitutas".

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Ainda segundo o delegado, a diretora desviava doações enviadas ao abrigo para benefício próprio e teria realizado um aborto ilegal em uma criança acolhida pelo local. “Há sim uma denúncia de aborto ocorrido dentro da casa tendo uma das crianças como vítima. Estamos apurando a autoria e a materialidade delitiva, bem como a circunstância da diretora ter procedido ao aborto e encobrido o fatos”, afirmou Humberto Soares.

A Polícia Civil de Goiás, em conjunto a Assistência Social de Val Paraíso de Goiás, identificou, localizou e prendeu um homem, de 42 anos, investigado por torturar o pai, de 69, e divulgar as imagens na internet. A prisão, efetuada através da Operação Jogos Mortais, ocorreu nessa quinta-feira (5).

Entenda o caso

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Após a divulgação de fotos e vídeos do pai sendo torturado pelo filho, publicados no próprio status de aplicativo de mensagens do investigado, as mídias acabaram sendo difundidas nas redes sociais da região.

A partir da identificação do autor, o idoso foi localizado em situação degradante, com sua dignidade humana sendo violada. A vítima foi encontrada com a vida em risco, sendo imediatamente levada para atendimento médico.

O filho foi preso em flagrante pelas práticas dos delitos de tentativa de homicídio qualificado pela tortura e apropriação de bens, proventos e qualquer outro rendimento de pessoa idosa. Também foi representado pela prisão preventiva do investigado.

Um casal foi preso em flagrante por torturar um menino de sete anos na comunidade Ilha do Rato, no bairro de Jardim Atlântico, em Olinda, no sábado (9). A criança foi encontrada pelos policiais com ferimentos e marcas de queimadura.

Uma equipe do 1º Batalhão da Polícia Militar foi acionada para a ocorrência de maus tratos e abandono de incapaz. Ao chegar na casa da família, foi verificado que a crianças estava machucada.

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A mãe, de 22 anos, e o padrasto do menino, 27, foram agredidos pelos vizinhos. Questionada pelo policiais, ela confirmou o ocorrido.

Os três foram socorridos para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Rio Doce e o casal foi encaminhado à delegacia do Varadouro, onde ficaram à disposição da Justiça.

Preso pela Polícia Federal na investigação sobre os bloqueios em rodovias no Nordeste no segundo turno das eleições, o ex-diretor geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques disse que sofre tortura psicológica no Complexo Penitenciário da Papuda.  

Em pouco mais de uma semana atrás das grades, Silvinei teria relatado uma série de irregularidades à sua defesa, entre elas o excesso de barulho que dificulta seu sono. Ainda de acordo com as acusações, o ex-PRF também não estaria se alimentando corretamente, pois tem resistência à glúten e a alimentação especial não estaria sendo oferecida. 

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A defesa aponta os riscos à saúde de Silvinei e à sua integridade física, pela proximidade com presos comuns. 

A Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape) rebateu a denúncia e informou que Vasques está segregado dos outros presos. Em relação à alimentação, o ex-diretor da PRF passou por triagem médica ao ingressar na penitenciária, onde "há a checagem de restrições alimentares". 

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Segundo o g1, a defesa solicitou a transferência dele para o 19º Batalhão da Polícia do Distrito Federal, onde militares estão presos provisoriamente. O pedido para deixar a Papuda será avaliado pela Vara de Execuções Penais de Brasília. 

"Todas as denúncias relacionadas ao sistema penitenciário são criteriosamente apuradas e, havendo qualquer indício de materialidade, punições administrativas são aplicadas sem o prejuízo das sanções criminais aplicáveis ao caso", complementou o Seape em nota.   

Uma técnica de tortura em que os dedos das mãos de pessoas encarceradas são fraturados já foi identificada em cinco estados pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT). Segundo o órgão, a prática foi encontrada a partir da atuação da Força Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP), ligada ao Ministério da Justiça. 

Coordenadora do MNPCT, a advogada Carolina Barreto Lemos revelou que o órgão começou a perceber a disseminação dessas ocorrências em locais de incursões realizadas pela FTIP, como Rio Grande do Norte e Ceará. Há registros, ainda, de presos com dedos quebrados em Roraima, Amazonas e Pará. 

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                                                            Presidiários mostram as mãos lesionadas              Foto: Acervo do MNPCT (2019)

“Por óbvio, isso é uma forma completamente ilícita, não é algo que possa se justificar a partir de nenhum viés, não há nenhuma justificativa legal, isso se configura muito claramente enquanto um crime. Um crime de tortura porque é uma forma de castigar, de impor um castigo ilegítimo, injustificado, para além do castigo que é a própria privação de liberdade”, avalia a advogada. Acrescenta que a prática de se fraturar dedos está completamente fora dos padrões de uso proporcional da força. 

Liderada por policiais penais federais, que coordenam os policiais penais mobilizados, a FTIP foi criada para ser empregada na resolução de crises, motins e rebeliões, no controle de distúrbios e no reestabelecimento da ordem e da disciplina nos sistemas prisionais. A força-tarefa foi empregada pela primeira vez no país em 2017, na Penitenciária de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte, diante de uma crise que resultou na morte de 26 presos. 

A advogada lembra da declaração de Mauro Albuquerque, apontado por ela como um dos mentores da técnica de quebrar dedos. Ele defendeu a ação durante audiência pública na Câmara Municipal de Natal (RN), em 12 de setembro de 2017, após denúncias de maus-tratos contra presidiários no estado, quando era secretário estadual de Justiça e da Cidadania, conforme consta em relatório produzido pelo MNPCT, em 2019. 

Albuquerque afirmou, durante a audiência, que “quando se bate nos dedos – falo isso não é porque não deixa marca nos dedos não... porque deixa marca – é para ele não ter mais força para pegar uma faca e empurrar num agente [policial], é para não ter mais força para jogar pedra”, aponta o relatório. 

A FTIC não só fazia as intervenções nos momentos específicos de crises, mas realizou também treinamento de policiais penais nos estados, o que levou a uma repetição das ocorrências para além da atuação da própria força, ressalta a coordenadora do Mecanismo. 

“E, com isso, dissemina-se as técnicas para além da sua atuação, a própria técnica de quebrar os dedos. Tanto é que, no fim do ano passado, em novembro, o órgão vai ao Rio Grande do Norte, que era o local que teve treinamento pela FTIP, apesar de a força não estar lá mais naquele momento, e identifica novamente [essa técnica] sendo usada”, relatou Lemos. 

Tortura

Segundo a coordenadora do MNPCT, o uso dessa forma de tortura ainda não foi superado, inclusive porque a força-tarefa continua existindo e atuando, no entanto, com outro nome.

“A equipe não deixou de existir, ela mudou de nome, atualmente está sendo chamada de Focopen, que é Força de Cooperação Penitenciária. Se não me engano, mas completamente ela continua atuando, e, até onde a gente saiba, partindo dos mesmos os parâmetros anteriores”, diz. 

A presidenta do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (CEPCT) do Ceará, Marina Araújo, confirma que a ação de fraturar os dedos das pessoas no cárcere não se trata de ocorrência pontual no estado e que a prática de tortura nas unidades prisionais cearenses é um fato identificado há alguns anos como padrão sistemático. 

“Tanto quebra-dedos como posições de tortura são identificados, inclusive, como práticas que estão institucionalizadas, como sanções disciplinares que as pessoas internas hoje têm sido submetidas pela Administração Penitenciária a cumprir como procedimento disciplinar”, afirma. 

Em ofício enviado na última quinta-feira (6) ao governo do estado do Ceará, a CEPCT - junto a outras entidades contra a tortura - denuncia 33 casos de tortura no período de um ano (julho de 2022 a junho de 2023), recebidos pelo Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Execução de Medidas Socioeducativas do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. 

“O contexto de tortura foi identificado por diversos órgãos locais e familiares, tem sido denunciado exaustivamente, cotidianamente, e esse cenário já foi documentado e comprovado em diversos relatórios de órgãos inclusive nacionais. Como exemplo, a gente tem um relatório de 2019 do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura que identificou uma série de práticas de tortura e tratamento cruel dentro das unidades prisionais. Este mesmo cenário foi constatado pelo relatório de inspeções do Conselho Nacional de Justiça no ano de 2021”, revela Marina.  

As denúncias do ofício incluem ainda 26 mortes de internos nas unidades prisionais cearenses entre 2019 e 2021, com base em dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ); e cinco suicídios de agentes penais cearenses somente no ano de 2021, conforme aponta o relatório da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do estado. 

Os dados do CNJ - que apontaram as 26 mortes no sistema prisional do estado - são divergentes do que foi divulgado pelo governo, o que demonstra problemas em relação à transparência, segundo Marina.

“Foram identificadas pela Secretaria de Segurança Pública somente quatro mortes no mesmo período analisado pelo CNJ. Então, tem um ponto que é sobre a transparência de dados e sobre acesso à informação de casos de tortura e de mortes nas unidades prisionais que precisa também ser pontuado”, alerta. 

Combate

A coordenadora do MNPCT, Carolina Lemos, salienta que técnicas de tortura de modo geral são muito disseminadas pelo Brasil e que estão estruturalmente presentes na atuação das forças dentro do sistema prisional.

“Elas se repetem, ainda que não tenha tido um intercâmbio direto entre os estados. Então, às vezes o que a gente vê em Minas Gerais vai ter algo parecido com o Amazonas ou Paraná, porque tem uma disseminação dessas técnicas históricas”, analisa. 

Em relação ao combate e prevenção de tortura no país, Carolina aponta que é necessário um controle externo para atingir o objetivo. “É fundamental um trabalho sistemático e qualificado de prevenção dessas práticas por meio da ação fiscalizatória, que é você fazer as visitas não anunciadas, chegar de surpresa nas unidades para ver o que está acontecendo de fato”, salienta. 

Além do controle por meio das Defensorias Públicas e dos Ministério Públicos, ela destaca a importância dos Mecanismos de Prevenção e Combate à Tortura estaduais, além do nacional, que tem a função exclusiva de fazer visitas regulares, produzir relatórios e recomendações para as autoridades. 

Segundo a advogada, a ideia dos mecanismos é que as visitas regulares a espaços de privação de liberdade contribuam para uma mudança na medida em que esses espaços que estão longe dos olhos do público vão ser sujeitos a um olhar externo regular. 

“A natureza preventiva se dá justamente com essa possibilidade de estar sempre sujeito a um olhar externo. É claro que o Brasil é um país de tamanhos continentais, então, mesmo um órgão nacional, ele sozinho não dá conta disso porque não consegue estar tão sistematicamente em 27 unidades da federação”, diz. Acrescenta que é fundamental também que os estados tenham seus mecanismos estaduais, que existem hoje em apenas seis unidades da federação. 

De acordo com essa medida, o Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (CEPCT) do Ceará tem trabalhado pela aprovação de projeto de lei sobre o tema, para criar um Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, um órgão autônomo com peritos especializados para garantir as visitas e a prevenção à tortura em unidades de privação de liberdade no estado. A minuta do projeto está desde 2018 nas mãos do Poder Executivo para que apresente à Assembleia Legislativa, informa o comitê. 

“Outro ponto também fundamental é destacar que somente a instalação de câmeras nos fardamentos de policiais penais não vai resolver o problema. A gente acredita que as condições de apuração e investigação, e também de reparação das vítimas e das suas famílias, bem como a responsabilização, são pontos principais para se garantir”, assegura a presidenta do comitê Marina Araújo. 

Para ela, é importante fortalecer as estruturas de órgãos de fiscalização da atividade policial como a controladoria geral de disciplina, a delegacia de assuntos internos, e essas estruturas precisam estar fortalecidas pelo Poder Executivo, preconiza. 

Governo

A Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização do Ceará (SAP) informou, em nota, que considera as acusações infundadas e que “repudia a tentativa de ataque coordenado contra as políticas de ressocialização em larga escala da população privada de liberdade do Ceará”. Segundo a secretaria, o sistema recebe visitas regulares de instituições fiscalizadoras, como Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública, além de entidades de controle social, e mantém uma Ouvidoria própria, vinculada à Ouvidoria do governo estadual. 

“O sistema prisional do Ceará virou um modelo de referência nacional em vários aspectos, com destaque para a ressocialização e a segurança física e emocional da sua população privada de liberdade. Entre os anos de 2009 até 2019, os presídios cearenses tiveram 210 presos assassinados. Desde que a SAP foi criada em 2019, esse número caiu para duas vidas perdidas de forma violenta, justamente nos primeiros meses de criação da pasta quando houve reação do crime perante a reorganização do sistema penitenciário cearense e assim permanece até hoje”, diz a nota. 

Segundo a SAP, o estado realizou, nos últimos quatro anos, em parceria com a Defensoria Pública do Ceará, mais de 125 mil revisões processuais entre os internos do sistema penitenciário do estado, o que contribuiu para a redução de 30 para 21 mil pessoas em regime fechado. A Secretaria da Administração Penitenciária  diz que foi a maior redução realizada no país.

 

O número de denúncias de violação de direitos, como torturas, castigos, maus-tratos e ameaças, sofridos por pessoas encarceradas triplicou em 2023 no estado de São Paulo. Os relatos feitos à Defensoria Pública do estado neste ano (211 casos) são 3,45 vezes maiores do que os denúncias recebidas em todo o ano passado (61).

O coordenador do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo, Diego Polachini, avalia que “o sistema como um todo é uma tortura”. Segundo ele, a violação de direitos dentro do cárcere não se restringe a casos pontuais, ela é sistemática, e a única solução passa pelo desencarceramento do máximo de pessoas possível.

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“A vivência na cadeia já é torturante. A ideia de prender uma pessoa numa jaula evidentemente configuraria tortura em qualquer aspecto, mas como é uma pessoa que está cumprindo pena, isso não é considerado”, disse o defensor em entrevista à Agência Brasil. No momento, há apenas hipóteses para o aumento nas denúncias, conforme apontou Polachini: um aumento na intensidade das torturas e maior acesso das famílias aos meios de denúncias.

Em março deste ano, a Defensoria Pública de SP enviou para o Comitê da Organização das Nações Unidas (ONU) contra a Tortura uma análise do cumprimento pelo Brasil das regras constantes na Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, denunciando práticas violentas e inércia do estado diante dos casos.

No documento, o órgão aponta o prejuízo do veto pelo governo do estado, em 2019, ao projeto de lei que estabelecia um Mecanismo e um Comitê de Prevenção e Combate à Tortura no estado; a necessidade de investigação rápida e imparcial em casos de violência institucional; e denuncia ainda graves episódios de tortura praticados por grupos táticos prisionais.

Polachini destaca casos ocorridos durante a invasão do Grupo de Intervenção Rápida (GIR), que estão no documento. O grupo tático prisional, subordinado à Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), deveria ser uma intervenção pontual para reprimir desordens nas unidades. No entanto, a defensoria avalia que o grupo se tornou presença habitual e ostensiva nos presídios, sendo protagonista de episódios corriqueiros de violência e tortura contra pessoas presas.

“Em ações regulares, normalmente eles invadem uma cadeia, quando tem alguma alegação de distúrbio ou algum preso que não quer voltar para cela, com bomba de borracha, cachorros, os presos são obrigados a ficar pelados, sendo ameaçado muitas vezes pelos cachorros muito próximos. Então é uma tortura psicológica muito severa que eles fazem”, contou o defensor.

Objetos ilícitos nas celas

Um dos episódios relatados à Organização das Nações Unidas (ONU) foi operação realizada em 2015, na Penitenciária de Presidente Prudente, para apreender possíveis objetos ilícitos nas celas. Na ocasião, cerca de 240 detidos sofreram violência física e psicológica por duas horas e meia. De acordo com o documento, mesmo sem encontrar resistência, os agentes do GIR xingaram e agrediram fisicamente os presos com socos, chutes e golpes de cassetete, além de disparos de balas de borracha em ambiente fechado. 

“Vários presos sofreram lesões corporais, principalmente nas costas e nádegas, demonstrando que estavam em posição indefesa. Como se não bastasse, entre os feridos estavam um idoso e um cadeirante, o que demonstra o nível de brutalidade dos ataques”, relatou a Defensoria na análise.

O documento aponta que, além da violência institucional, outras violações sistemáticas que configuram atos de tortura no sistema prisional paulista são “a superlotação carcerária, falta de ventilação e iluminação adequadas, equipes mínimas de saúde insuficientes, falta de medicamentos, má qualidade da estrutura física dos prédios, racionamento de água, falta de água potável, falta de chuveiros quentes, limitação e ausência de banhos de sol, falta de itens de higiene pessoal e vestuário e falta de alimentação adequada e em quantidade suficiente”.

Fome

Há reclamações recorrentes sobre a quantidade da alimentação no sistema penitenciário paulista. “O medo da fome é constante no sistema carcerário, os presos vivem sob essa ameaça e passam fome constantemente aqui no estado de São Paulo. Eles precisam complementar a alimentação através do apoio familiar. Se a família não manda comida, eles reclamam que passam muita fome, que a comida não é suficiente”, revelou Polachini à Agência Brasil.

O defensor citou ainda situações conhecidas como “pena de fome”, em que irregularidades cometidas pelas pessoas encarceradas são punidas com racionamento de comida. “Eles ficam sem comer por um período ou é diminuída a comida para eles. Isso me parece uma evidente tortura”, comentou. Além disso, segundo ele, cotidianamente boa parte das unidades racionam a água, os presos muitas vezes são privados de tomar banho e passam sede constantemente.

Em relação as violências psicológicas, há denúncias de ameaças por parte dos funcionários das unidades prisionais. “Quando vai chegando perto da saída dele [para o semi aberto], os funcionários começam a ameaçar com [aplicação de] faltas graves, então ele vive uma constante tortura psicológica com medo de falar qualquer coisa, fazer qualquer coisa, e ter o direito dele a progressão de regime impedido.”

Segundo ele, há também uma tortura que é feita durante as revistas. “Tem penitenciárias específicas em que os presos, para saírem para trabalhar, por exemplo, ainda que eles estejam no regime semi aberto, eles têm que tirar a roupa todo dia”. O defensor acrescentou que, em uma das denúncias recebidas pela Defensoria, uma pessoa com deficiência era obrigada a tirar a roupa e sentar no chão em todas as saídas da cela, o que foi definido como “torturante” pelo denunciante.

Condições ideais

O defensor público Polachini ressalta que a única limitação imposta pela Justiça às pessoas encarceradas é privação de liberdade. Diante disso, os demais direitos, garantidos a qualquer cidadão, deveriam ser garantidos também dentro do cárcere. Segundo ele, esse é o entendimento das cortes superiores e dos tribunais internacionais.

Entre as medidas consideradas básicas, estão o afastamento de guardas e agentes penitenciários envolvidos em casos de tortura, acesso a médico, melhoria na oferta de alimentação, tanto em quantidade como em qualidade, proibição do racionamento de água.

“Todos os direitos que as pessoas têm na rua os presos deveriam ter, então direito a trabalho, a estudo, à dignidade - que abarca uma quantidade maior de direitos. Os presos têm exatamente todos os direitos de um cidadão [em liberdade]: não pode ser torturado, não pode ser agredido, não pode ser xingado, não pode ter racionamento de produtos essenciais, como água a energia elétrica”, disse.

Para ele, a melhoria das condições estruturais do sistema penitenciário passa por medidas de desencarceramento. “A única solução que eu vejo como melhoria disso é o desencarceramento. O sistema carcerário em si é feito para ser uma forma de tortura, então para reduzir a tortura só tirando pessoas lá de dentro. Então o desencarceramento da maior quantidade de pessoas possíveis para evitar que mais pessoas sofram com isso.”

Existem instrumentos atualmente que visam à redução da população carcerária, mas que não são colocadas em prática pelo judiciário. “A nossa Constituição trata a prisão como uma exceção. 40% dos presos são presos preventivos, são presos que não foram condenados ainda. A constituição e Código do Processo Penal, e até as recomendações do próprio CNJ e do STF, falam que a prisão antes da sentença é uma exceção”, disse.

“Muitas vezes isso infelizmente não é aplicado, principalmente, aqui no estado de São Paulo, que tem um alto índice de conversão das prisões em flagrante em prisão preventiva. Medidas alternativas à prisão preventiva poderiam ser mais aplicadas, já são completamente previstas”, acrescentou.

Ele citou o habeas corpus coletivo, concedido pelo STF em 2018, que determinou a substituição da prisão preventiva por domiciliar para gestantes, lactantes e mães de crianças de até 12 anos ou de pessoas com deficiência, em todo o território nacional. No entanto, a medida ainda apresenta dificuldade de aplicação.

“Os juízes aqui em São Paulo acabam sendo muito reticentes na aplicação disso, muitas vezes falando que só tem duas opções: a mãe cometeu o crime com a criança ou sem a criança. Se ela comete o crime com a criança, [consideram que] ela está sendo uma mãe que deixou a criança em risco. Se ela comete um crime sem a criança, [consideram que] ela já tinha abandonado filho, então não teria porque ela ter direito a prisão domiciliar”, lamentou o defensor.

Entre as recomendações do documento enviado à ONU, a Defensoria pede que país adote medidas que garantam o afastamento cautelar de servidores públicos suspeitos de envolvimento em crimes de tortura e maus tratos e que haja investigação célere, imparcial, eficaz e dentro de um prazo razoável dos casos.

A coordenadora auxiliar do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública de São Paulo, Surraily Youssef, avalia que a maior investigação que se faz em casos de violência cometida por agentes do estado não é da conduta do policial, por exemplo, mas da conduta da pessoa que foi presa.

“O que a gente percebe é que há ainda uma desvalorização da narrativa sobre violência das pessoas que já tiveram em algum momento algum contato com a Justiça Criminal e é essa cultura que nós precisamos reverter e combater para que aquela narrativa seja central para dar início aos mecanismos de apuração”, disse.

Ela acrescenta que os marcos institucionais, tanto nacionais como internacionais, indicam que a tortura é uma prática que sempre tem que ser vedada e todos os órgãos que tem contato com denúncias de tortura, principalmente o judiciário e o Ministério Público, devem dar encaminhamento a uma investigação de pronto.

Youssef avalia que é preciso pensar mecanismos de fiscalização dos ambientes de privação de liberdade, a fim de ampliar as possibilidades de acesso ao cárcere para essa fiscalização, como por exemplo o Mecanismo e o Comitê de Combate à Tortura no âmbito estadual, que são previstos no protocolo adicional da Convenção Contra a Tortura da ONU. Os instrumentos estavam previstos em projeto de lei, aprovado na Assembleia Legislativa de São Paulo, mas foi vetado pelo governo.

“O [João] Doria vetou em 2019 o projeto, que instituía o Mecanismo e o Comitê Estadual, que poderiam acessar os espaços de privação de liberdade. E não só o cárcere, há denúncias de violência em comunidade terapêuticas, em hospitais psiquiátricos, em casa de repouso, então é importante a gente ampliar, e a existência do mecanismo e do comitê permitiria a realização de inspeções nesse espaço prisionais”, disse.

Ela acrescenta que, quando existe uma abertura para fiscalização desses espaços de privação de liberdade, é possível não só registrar as práticas de tortura, mas pensar recomendações para que elas sejam superadas.

Outro lado

A Secretaria da Administração Penitenciária informou que não tolera quaisquer desvios de condutas de servidores e que, para toda denúncia de tortura ou ato correlato, o funcionário é investigado e, caso comprovada a denúncia, é afastado e punido de acordo com a legislação. Segundo a pasta, existem canais para recebimento de denúncias, como a Ouvidoria e a Corregedoria Administrativa do Sistema Penitenciário e o sigilo do denunciante é preservado.

“Sobre alimentação, a SAP informa que são servidas pelo menos três refeições (café, almoço e jantar) diariamente. A alimentação é balanceada e segue um cardápio previamente estabelecido e elaborado por nutricionistas. Não há racionamento de água nas unidades da SAP. Todos os presídios seguem o que determina a Organização Mundial de Saúde, que estipula o consumo mínimo per capita de 100 litros diários de água”, diz a nota.

Para combater a superlotação prisional, a pasta informou que, neste ano, estão previstas as entregas de três novas unidades nos municípios de Aguaí, Riversul e Santa Cruz da Conceição, que terão o total de 2.469 vagas. “O governo de São Paulo também incentiva a adoção de penas alternativas pelo Poder Judiciário, além da realização de mutirões visando dar maior agilidade aos processos. Nos últimos dez anos, o número de vagas foi ampliado em 40,12% em todo estado”, finalizou.

Um homem morto asfixiado com gás no porta malas de uma viatura policial, dedos de pessoas presas fraturados por agentes penitenciários, policiais carregando um rapaz com mãos e pés amarrados com cordas e um ajudante de pedreiro desaparecido há dez anos após abordagem policial. Os casos parecem saídos do período da ditadura militar no país, mas estão no passado recente da democracia brasileira.

Neste Dia de Apoio às Vítimas da Tortura - 26 de junho - especialistas ouvidos pela Agência Brasil afirmam que a tortura é uma prática estrutural no país e que não aparece apenas em casos isolados. 

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“Eu entendo essas práticas como tortura e maus tratos. Sem dúvida nenhuma, o que a gente testemunha no Brasil, enquanto tortura e maus tratos, tem relação direta com o nosso passado ditatorial. E eu iria até mais longe, tem relação direta com o nosso passado escravista”, disse Gabrielle Abreu, coordenadora executiva de Memória, Verdade e Justiça do Instituto Vladimir Herzog. 

Para ela, há uma linha de continuidade no que diz respeito à tortura e maus tratos que remonta à escravidão, aos séculos passados, e perpassa pelo século 20, tendo a ditadura como uma oportunidade que a tortura teve no Brasil de se aprimorar, se alastrar e se tornar praticamente um código de conduta não explícito dos agentes das forças de segurança pública no Brasil. 

“Esse episódio em que o homem foi amarrado, suspenso, pelas mãos e pelos pés, me remeteu ao pau de arara, que era um instrumento de tortura muito utilizado pela ditadura e foi muito usado também na escravidão contra homens e mulheres, negros e negras, que foram escravizados”, acrescentou. Segundo a historiadora, tem um fio de continuidade que é preciso romper o quanto antes. “Senão, a história do Brasil vai se tornar uma história de tortura, de maus tratos, de violência e, acima de tudo, uma história de impunidade”, enfatizou. 

Divulgado em abril deste ano pelo Instituto Vladimir Herzog, o monitoramento das recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV) revelou que o item que recomenda ao estado brasileiro a criação de mecanismos de prevenção e combate à tortura apresentou retrocesso. A CNV investigou violações de direitos humanos cometidas na ditadura militar. 

“Em relação à tortura e maus tratos, o retrocesso é completo. O estado atual é de muita negligência desses instrumentos [de combate e prevenção à tortura], a gente encontrou quase um terreno de terra arrasada mesmo e está num estado da coisa pior do que quando a CNV concluiu seus trabalhos”, revelou Gabrielle. 

Do total de 29 recomendações da CNV, apenas duas foram realizadas (7%) e seis parcialmente realizadas (21%), totalizando aproximadamente 28%. As não efetivadas e retrocedidas conformam a maioria de cerca de 72%, sendo 14 não realizadas (48%) e sete retrocedidas (24%), o que revela uma situação preocupante, segundo o Instituto Vladimir Herzog. 

Prevenção

Um dos itens considerado realizado é o que diz respeito à introdução da audiência de custódia para prevenção da prática da tortura e de prisão ilegal. Apesar da implantação dessas audiências, entidades de direitos humanos ouvidas pela Agência Brasil apontaram ineficiência do mecanismo no combate a violações do estado. 

De acordo com o relatório, a ausência de responsabilização dos agentes públicos que cometeram graves violações de direitos humanos na ditadura é um dos pilares da contínua impunidade que impera no país em relação aos que atentam contra os direitos humanos e a democracia. 

“A gente passa pela ditadura, não responsabiliza, sequer identifica os torturadores, os agentes públicos da ditadura, não se faz qualquer investigação e a gente chega nesse presente onde a tortura é totalmente naturalizada no Brasil. É difícil chocar as pessoas, independente das práticas cometidas serem bárbaras e cruéis, não há grande sensibilização pública porque a gente já entrou no modo de naturalização muito nocivo dessas práticas”, disse Gabrielle. 

Caso recente em que um suspeito foi amarrado pelos pés e mãos com corda por policiais militares durante sua prisão por furto já teve desdobramento na justiça paulista que o tornou réu. Já os policiais, que estão afastados das atividades operacionais, seguem ainda em investigação para apurar “eventuais excessos”, segundo informou a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP). 

Vídeos da abordagem mostram Robson Rodrigo Francisco com as mãos amarradas aos pés, de forma que não permitia que ele ficasse em pé, nem sentado. As imagens mostram que ele é arrastado pelo chão dentro de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e depois carregado por dois policiais militares, segurando-o pela corda e pela camiseta. Ainda amarrado, ele é colocado no porta-malas de uma viatura. 

“O caso do Robson é um exemplo de muitos outros que acontecem no estado de São Paulo e em outros lugares do país, em que a ausência de uma política institucional que objetive a mudança de cultura dentro das corporações policiais e, ao mesmo tempo, mecanismos que permitam a fiscalização dos estabelecimentos, a detecção e a apuração dessas práticas [faz com] que [situações assim] continuem se repetindo na nossa história, nos momentos atuais, como ocorreram durante a ditadura”, disse a coordenadora auxiliar do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública de São Paulo, Surraily Youssef. 

Problema estrutural

O Brasil tem ainda uma justiça de transição inacabada. Muitos dos relatos de tortura e violência que aconteceram na ditadura militar ainda não foram apurados, apesar da existência da Comissão da Verdade, avaliou Youssef. “O cenário hoje é que a tortura ainda é uma realidade no país. E por que ela é ainda uma realidade? Porque a gente precisa fortalecer os mecanismos institucionais de apuração e de detecção da tortura”, disse. Para ela, a prática de tortura no país ainda é estrutural e é preciso uma mudança de cultura dos agentes estatais de segurança e de sua maneira de atuação. 

Para Youssef, dados das audiências de custódia, nas quais a Defensoria Pública atua na defesa de pessoas presas em flagrante, demonstram que em muitos casos há relatos de violência policial, prática de tortura e outros maus tratos. Informação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra ainda que o órgão recebeu, desde 2005, mais de 85 mil denúncias de tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante nas audiências de custódia. 

“Muitas vezes há uma desconsideração da prática da tortura que não é física, que é psicológica também, que é marcada por uma série de mobilização de estereótipos, de ameaças, de xingamentos e que isso também pode provocar o sofrimento intenso e que pode ser qualificado como tortura”, acrescentou. 

O relatório Pontos Cegos da Tortura - elaborado pela Defensoria durante a pandemia de covid-19, quando as audiências de custódia foram suspensas no estado de São Paulo - concluiu que a grande maioria dos autos de prisão em flagrante não tinha juntado o exame de corpo de delito, o que contrariava recomendação do CNJ. 

Após análise de 602 autos de prisão em flagrante de março de 2021 - realizados na Baixada Santista e na capital - a Defensoria concluiu que em menos de 2% dos casos foi realizado o exame de corpo de delito, juntado o laudo ou feito registro fotográfico, que são documentos essenciais para averiguação da prática de violência e tortura. 

“Apesar da resolução do CNJ determinar que, mesmo que a audiência de custódia tivesse suspensa, deveria existir uma análise do laudo pericial de todas as pessoas presas em flagrante, acompanhada da fotografia dessas pessoas, para que houvesse uma mínima identificação de prática de violência ou tortura, a gente percebeu que isso não foi feito pelo judiciário paulista”, disse a defensora. Segundo ela, esse resultado aponta que não houve uma preocupação clara em entender esse mecanismo institucional como essencial para averiguar as práticas de violência. 

A compreensão da tortura como estrutural também abrange as condições a que os presos são submetidos nas unidades penitenciárias, como ausência de acesso à alimentação, a bens materiais e superlotação, o que é realidade no país. 

Vítimas

O combate à tortura deve ser feito por uma série de mecanismos que possam funcionar de forma articulada, mas que tenham como centralidade a ampliação da narrativa daquela pessoa que é vítima de tortura, de acordo com Youssef. 

“Não é à toa que o dia 26 é chamado de Dia de Apoio às Vítimas de Tortura, porque é só a partir do momento que a gente dá centralidade para narrativa dessas vítimas que é possível se pensar [em] mecanismos de apuração, de reparação e apoio psicológico a essas vítimas. Esse é um fator muito importante de ser pensado quando a gente pensa nos mecanismos institucionais”, disse. 

Entre os mecanismos citados pela defensora estão as audiências de custódia, sua institucionalização e ampliação dos espaços de escuta das vítimas; o fortalecimento das perícias e dos fluxos de investigação das denúncias, principalmente tendo em vista que hoje essa investigação é feita pelo próprio batalhão, no caso das polícias militares; e o fortalecimento de mecanismos tanto de controle social, quanto o mecanismos institucionais de inspeções e supervisão dos estabelecimentos de privação de liberdade. 

“Além disso, obviamente, pensar em outra cultura dentro das corporações policiais, e isso passa por organização de cursos de formação para esses policiais, e que exista a participação, inclusive, de pessoas que já foram vítimas de violência e que possam trazer essa perspectiva, curso de direitos humanos, cursos práticos para esses profissionais”, apontou. 

Ela acrescentou que o combate a violações passa ainda por corregedorias fortalecidas e institucionalização do uso das câmeras corporais, não só na Polícia Militar, mas na Polícia Civil. Segundo ela, o uso das câmeras por policiais, que ainda não é disseminado pelo país, ajuda a compreender que muitas das abordagens policiais são acompanhadas de práticas de tortura e de violência.  

Reparação e memória

Pensar na apuração de tortura também é pensar em mecanismos de memória, segundo a defensora pública, como desculpas públicas e indenizações. “Não é só quando há uma responsabilização cri

minal do agente que se pensa em mecanismo de reparação de prática de tortura. É preciso repensar também a própria maneira como o Estado repara, de reconhecer a prática, de realizar pedidos de desculpas públicas, de construir espaços onde essas pessoas possam ter apoio psicológico, porque a violência de tortura é para sempre, ela vai deixar marcas”. 

“O Estado reconhecer a violência é o primeiro passo para a gente começar a transformar essa realidade estrutural que, desde antes da ditadura militar, a gente vive e que afeta determinadas pessoas que são mais vulneráveis: pessoas negras, pobres, periféricas, mulheres”, acrescentou. A coordenadora do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, a advogada Carolina Barreto Lemos, avalia que a não responsabilização por violações de direitos humanos é algo que marca a história do país.

“É uma história de muitas anistias. A não responsabilização passa o recado é de que está tudo bem, de que não é algo pelo que as instâncias e as autoridades precisam responder e que as pessoas não precisam ser responsabilizadas por isso”, disse. 

Para ela, esse contexto contribui de maneira enorme para naturalização de atos de tortura e maus tratos, no entanto, não houve nenhuma reparação simbólica no país em relação ao período da ditadura militar. “Seria uma forma de romper com essa prática que ficou tão visibilizada na ditadura. A responsabilização teria sido uma forma de simbolicamente dizer 'nós não aceitamos a prática de tortura no Brasil' e, no entanto, mesmo nesse caso, houve uma anistia que novamente vem naturalizar isso como algo que não tem problema torturar pessoas presas”, acrescentou. 

A advogada avalia que não houve ruptura pós ditadura militar em relação à violência nas situações de privação de liberdade. “A tortura continua tão disseminada quanto [antes], mas menos visibilizada porque agora ela volta a atingir aquele sujeito que historicamente foi atingido e que sofre com uma forma de desumanização e naturalização da periclitação de suas vidas”, disse, referindo-se à população negra e pobre. 

“Tem algo bem anterior, inclusive à própria ditadura, que é aquilo que marca essa política criminal de encarceramento em massa: o racismo estrutural. A desumanização de pessoas pobres e negras é algo que naturalizou historicamente as práticas de tortura no Brasil desde a escravidão”, disse a advogada. 

Controle externo

Em relação aos mecanismos de prevenção e tortura no país, ela avalia que o controle externo é fundamental para alcançar tal objetivo. “Sem controle externo, não tem como combater ou prevenir. Porque, se existe a ideia de que aquele local está longe do olhar do público, que ele não está sujeito a um controle externo nem à fiscalização, você cria todas as condições para que a tortura aconteça e para que não haja responsabilização, porque inclusive não será sequer denunciada, nem conhecida”, finaliza. 

Ela ressalta a importância da atuação dos órgãos que estão previstos por lei para a fiscalização da execução da pena, que são a Defensoria Pública, o Ministério Público e poder judiciário. “É fundamental um trabalho sistemático e qualificado de prevenção dessas práticas por meio da ação fiscalizatória, que é você fazer as visitas não anunciadas, chegar de surpresa das unidades para ver o que está acontecendo de fato”, citou. 

Lembrando do Robson, que foi amarrado por cordas, do Genivaldo, que foi morto após asfixiamento no porta malas de uma viatura policial, das pessoas presas que tiveram seus dedos quebrados, Lemos ressalta que é fundamental que os poderes deem uma resposta à sociedade. “No caso do rapaz que foi acorrentado pelas mãos e pés e carregado, já teve uma resposta muito ruim por parte das autoridades, inclusive dizer que aquilo não é tortura, então isso já traz uma preocupação.”

“A gente tem que pensar em ações de não repetição. As polícias precisam ter protocolos, e também responsabilizarem seus agentes administrativamente a partir desses protocolos. Porque, se existe um protocolo em uma polícia de que é permitido acorrentar e carregar o sujeito daquela forma, esse protocolo precisa ser revisto. E, se não existe, então precisa apurar e responsabilizar [os agentes]”, disse. 

Além disso, a advogada avalia a necessidade de rever a forma que esses agentes estão sendo formados “porque eles não estão fazendo isso a partir do nada, tem alguma coisa institucionalmente que está sendo colocada para eles para atuarem dessa maneira”.

Um homem suspeito dos crimes de tortura de dano qualificado praticados contra sua ex-namorada foi preso em flagrante pela Polícia Civil, na manhã da sexta-feira (23), em ação do Núcleo de Violência Doméstica, da Delegacia de Sorriso (442 km ao norte de Cuiabá).

As investigações iniciaram após a vítima comparecer à delegacia às 07h30 para comunicar que havia sido agredida pelo ex-namorado, após ele ter pedido para reatar o relacionamento e para manter relações sexuais com ela.

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Segundo as informações, o suspeito apareceu na janela da casa da vítima, durante a madrugada (por volta das 02 horas), pedindo acolhimento na casa da ex-namorada. Por volta das 05:30, o suspeito pediu para reatar o relacionamento e queria manter relações sexuais com a vítima, que recusou.

Diante da negativa, o suspeito se descontrolou e a agrediu com um soco na boca, tentou arrancar o aparelho dental com as próprias mãos, além de ter tampado a boca dela com um lençol, tentado sufocá-la. Durante as agressões, ele também quebrou uma televisão e queria quebrar o celular da vítima, a fim de que ela não conseguisse ligar para a polícia.

Assim que recebeu a comunicação dos fatos, aequipe de investigação empreendeu diligências para efetuar a captura do suspeito, que foi encontrado em seu local de trabalho, em uma fazenda situada a 70 km do perímetro urbano de Sorriso. Ele será autuado pelos crimes de tortura e dano qualificado pela violência, e será submetido à audiência de custódia.

Da assessoria.

Nesta terça-feira (13), a 17ª Delegacia de Polícia (Taguatinga Norte) cumpriu três mandados de prisão temporária contra suspeitos de torturar e estuprar o funcionário de um estabelecimento, a mando do próprio patrão, na Região Administrativa de Taguatinga, no Distrito Federal. A 1ª Vara Criminal de Taguatinga está à frente das ordens judiciais. As informações são do portal Metrópoles.

O crime teria acontecido no dia 12 de maio, quando o funcionário furtou uma furadeira e uma serra do ambiente de trabalho devido a atrasos no salário. Outros dois homens, a mando do patrão, encurralaram a vítima para violentá-la.

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Segundo o delegado-adjunto da 17ª DP, Thiago Boeing, o funcionário do estabelecimento “foi espancado, torturado, teve o celular subtraído, foi obrigado a fornecer contas de aplicativos e dados do aparelho. Ele ainda teve um pedaço de madeira introduzido no ânus”.

A Justiça de São Paulo decretou a prisão preventiva do homem de 37 anos que foi amarrados pelas mãos e pernas por policiais ao ser conduzido pela delegacia. Ele é suspeito de ter furtado duas caixas de bombom de um mercado em São Paulo, no último domingo (4). 

Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, o suspeito passou por uma audiência de custódia na segunda-feira (5) e teve sua prisão em flagrante convertida em prisão preventiva, sem prazo determinado. Após analisar o caso, a juíza responsável concluiu que não há evidências de ocorrência de tortura, maus-tratos ou violação de direitos na abordagem ao homem. 

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Segundo a magistrada, o suspeito já estava cumprindo pena em regime aberto quando cometeu o crime. Assim, ela considerou que ele quebrou a confiança da Justiça Criminal ao não cumprir o acordo de se manter longe de problemas com a lei.

No boletim da ocorrência, os policiais envolvidos alegaram que amarraram o suspeito porque ele teria resistido à prisão e os ameaçado. No registro, eles também relataram que foram acionados por uma mulher durante uma patrulha na Avenida Conselheiro Rodrigues Alves, por volta das 23h50. Ela indicou que havia uma movimentação atípica em um mercado próximo.

Um homem foi preso por toturar a filha por ela não ter feito o almoço na hora certa. O caso ocorreu em Montes Claros, Goiás.

A Polícia Civil de Goiás recebeu uma denúncia do Conselho Tutelar que uma adolescente de 12 anos estava sendo maltratada pelo seu próprio pai fisicamente e psicologicamente. Os policiais civis da Delegacia de Polícia de Montes Claros junto com policiais militares prenderam o agressor em flagrante no início da tarde desta sexta-feira (2).

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As torturas com a garota aconteciam há um certo tempo. Nesta sexta-feira, a vítima foi agredida pelo seu pai com um soco no rosto e teve um cabo de rodo quebrado nas suas pernas como forma de castigo por ela não ter feito o almoço na hora certa.

Segundo os policiais, a jovem era obrigada a cozinhar, limpar a casa e lavar as roupas. No mês de maio o torturador, ao ficar insatisfeito com as atitudes da filha, molhou o colchão dela toda para que ela dormisse com a cama molhada. O acusado foi encaminhado ao presídio de Jussara.

A Secretaria de Defesa Social de Pernambuco (SDS-PE) puniu dois policiais civis por condutas irregulares durante ofício, com base em uma denúncia de tortura psicológica e ameaças contra moradores de uma comunidade em Ribeirão, no Agreste de Pernambuco. A decisão foi publicada nessa sexta-feira (28) e se aplica ao comissário de polícia Gleidson Ferreira dos Santos e a um ex-comissário. 

Os comissários faziam parte da Delegacia de Polícia da 71ª Circunscrição, em Ribeirão. A denúncia contra eles foi feita pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, vinculada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, e consiste em suposta tortura psicológica e ameaças feitas pelos policiais civis contra moradores do Bairro do Alto da Fé, em 30 de outubro de 2021. 

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Além disso, o ex-comissário teria publicado em seu Instagram pessoal o total de seis imagens, nas quais Gleidson e ele aparecem com um homem detido, deitado de bruços no chão, algemado, enquanto um tem os pés nas costas do abordado e o outro aponta uma arma, ao falar no telefone. 

De acordo com a SDS, o ex-comissário deixou a Polícia Civil em 2022, então a punição foi publicada apenas a nível de registro. Assim, Gleidson será o único comissário efetivamente punido com uma suspensão de 10 dias, que será descontada da folha de pagamento do policial.

O imputado foi punido por “deixar de comunicar, imediatamente à autoridade competente, faltas ou irregularidades que haja presenciado ou de que tenha tido ciência" e por "trabalhar incorretamente, de modo intencional, com o fim de prejudicar o andamento do serviço ou negligenciar no cumprimento dos seus deveres".

Apesar de homens, mulheres, crianças e idosos terem sido afetados e sofrido durante a repressão da ditadura militar pelo Ato Institucional Número 5 (AI-5), há 59 anos completos nesta sexta-feira, 31, as mulheres sofreram atrocidades e torturas especialmente piores do que as outras pessoas. Foi identificado, durante depoimentos para a Comissão Nacional da Verdade, que estupro, abusos físicos e sexuais eram práticas comuns de tortura feita pelas por militares do Exército e da polícia. O LeiaJá regata alguns desses relatos.

Dilma Rousseff

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A primeira mulher a ocupar a cadeira da Presidência da República, Dilma Rousseff (PT), foi uma das mulheres que sofreu com a violência e repressão. Ela iniciou a militância na Organização Revolucionária Marxista, antes mesmo de fazer parte do armado Comando de Libertação Nacional. Dilma teve que abandonar a faculdade de economia em Minas Gerais. Depois, o grupo que integrava fez parte da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares, mas ela nunca pegou em armas. A ex-presidenta foi capturada pela Operação Bandeirantes, em 1970. Foi presa e torturada em São Paulo, Minas Gerais e no Rio de Janeiro. 

Passou pelo pau-de-arara, pelas máquinas de eletrochoque, e foi violentada com palmatória e cassetetes, que desfiguraram a sua arcada dentária. Então, ela foi condenada a seis anos de prisão, teve os direitos políticos cassados e ficou encarcerada numa cela com 50 mulheres. Por ter participado do julgamento, Dilma conseguiu reduzir a sua pena e sair da prisão em 1972. 

Em relato na Comissão Nacional da Verdade, em 2014, Dilma contou sobre a prática comum dos socos, eletrochoques, e arrancar dentes das pessoas presas. Ela era constantemente ameaçada. “Eu vou esquecer a mão em você. Você vai ficar deformada e ninguém vai te querer. Ninguém sabe que você está aqui. Você vai virar um presunto e ninguém vai saber”, relatou a ex-presidenta, sobre uma das ameaças recebidas.

 

Miriam Leitão

A jornalista Miriam Leitão foi presa em 1972, aos 19 anos, por envolvimento com o PCdoB no combate ao regime militar. Ela contou que, durante a prisão no quartel de Vila Velha, no Espírito Santo, sofreu torturas físicas enquanto estava grávida de um mês. Ela foi jogada em uma cela escura e completamente nua, tendo sido obrigada a interagir com uma jiboia viva. 

Levou chutes, socos, tapas e cacetadas por parte dos oficiais, além de ter sido ameaçada de estupro por diversas vezes e ter sido privada de receber comida nas celas do quartel. Ela revelou que os soldados lançavam cães em sua direção enquanto a chamavam de terrorista aos gritos, fazendo com que os animais ficassem irritados. 

 

Rose Nogueira

A militante Rose Nogueira, que atuava na Ação Libertadora Nacional (ALN), foi presa em um dia comum enquanto estava em seu apartamento com o marido Luiz Roberto e seu filho, Carlos. Ela foi abordada pelo delegado Fleury, que ameaçou não devolver o seu filho, mas, na abordagem, Rose o convenceu a deixar a criança com os avós. 

Levada ao Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops), em São Paulo, foi torturada psicologicamente, violada, estuprada, e aprisionada em celas insalubres com mais de 50 mulheres, incluindo Dilma Rousseff. Por estar amamentando à época que foi presa e não podia tomar banho, Rose cheirava a leite azedo. 

Ela passou nove meses presa na Penitenciária de Tiradentes. Quando foi solta, ficou em condicional sendo vigiada até o julgamento, que aconteceu dois anos depois, em 1972, quando foi julgada e absolvida. 

 

Amélia Teles

Amelinha Teles foi torturada com a família: o marido, a irmã e os dois filhos pelo coronel Brilhante Ustra. Amelinha era constantemente agredida por ele na frente dos filhos. Na Comissão, ela relatou ter passado pelo pau-de-arara, ter levado choques no corpo inteiro, apanhado de palmatória e sofrido violência sexual. Os filhos eram levados para vê-la nua, cheia de sangue e urina.

Militante do PCdoB, Amélia Teles foi presa em 1972 pela Operação Bandeirantes e foi conduzida para o DOI-CODI, em São Paulo, quando caiu nas mãos de Brilhante Ustra, que a torturou pessoalmente junto ao marido Carlos Nicolau Danielli, que foi assassinado em frente à esposa e usado para tortura psicológica. 

Segundo relatos de Amélia, Brilhante Ustra decidiu que os filhos dela, que tinham menos de 5 anos na época, fossem levados à sala de tortura e obrigados a assistir as sessões em que a mãe era agredida e estuprada por ofíciais do Exército. Ela sobreviveu e tornou-se militante na causa das famílias de desaparecidos políticos. 

A família Teles ganhou, em primeira instância, uma ação contra o coronel Ustra pelos crimes que sofreram, fazendo com que ele fosse o primeiro a ser reconhecido como torturador, em 2008. 

 

Iracema de Carvalho Araújo

Com aproximadamente 11 anos, pois não sabe ao certo o ano em que nasceu, Iracema foi sequestrada junto à mãe pelo Destacamento de Operações de Informação (DOI) de Recife. Sua mãe, Lúcia, era professora ligada do PCdoB e às Ligas Camponesas, por isso tornou-se alvo da polícia. Naquele dia, os militares colocaram Iracema e Lúcia num carro, vendadas, e as agrediu fisicamente, prejudicando 80% da visão de Iracema com um soco no rosto. 

Ela chegou a passar por sessões de tortura física e obrigada a assistir a mãe sendo agredida, espancada e eletrocutada no DOI-CODI. Ela lembra que a tortura que sofreu foi intensa e marcou a sua memória. 

 

Araceli Cabrera Sánchez Crespo

Araceli Crespo é um dos casos mais escandalosos da ditadura. Aos oito anos de idade, Araceli foi sequestrada, drogada, torturada, morta e carbonizada. O seu corpo foi encontrado em uma mata em Vitória, capital do Espírito Santo, completamente desfigurado e já em estado de decomposição. 

Os principais suspeitos são Dante de Barros Michelini, o Dantinho; seu pai, Dante de Brito Michelini; e Paulo Helal, que pertenciam a famílias de influentes do Espírito Santo junto ao regime militar. Eles negaram conhecer a vítima durante o julgamento. No entanto, Dantinho e Helal conheciam a mãe de Araceli, a boliviana Lola Sánchez. Ela era um contato para traficar cocaína na rota Brasil-Bolívia, e teria usado a própria filha como “mula” para entregar drogas a membros da família Michelini. 

Em 1980, Santinho e Helal foram condenados a 18 anos de prisão e o pagamento de uma multa de 18 mil cruzeiros. No entanto, foram absolvidos por “falta de provas” pelo juiz Paulo Copolilo, 11 anos depois. Lola fugiu do país. 

O Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, é em homenagem a Araceli. A data é celebrada no dia 18 de maio, data da morte da menina. 

 

Dinalva Oliveira Teixeira

A baiana foi uma das vítimas fatais da ditadura militar. Militante do PCdoB, foi uma das guerrilheiras mais conhecidas na região do Araguaia. O relatório da Comissão Nacional da Verdade apontou que ela foi presa, torturada e assassinada em julho de 1974, perto de Xambioá, no Tocantins. Ela estava grávida em estado avançado.

O relatório também diz que Dinalva foi fuzilada olhando nos olhos do sargento Joaquim Artur Lopes de Souza, de codinome Ivan, e aconteceu o seguinte diálogo:

Dina: Vou morrer?

Ivan: Vai, agora você vai ter que ir

Dina: Eu quero morrer de frente

Ivan: Então vira pra cá. 

 

Aurora do Nascimento Furtado

Militante da ALN, Aurora foi assassinada aos 26 anos de idade. Ela foi presa em 1972 e encaminhada à “Invernada de Olaria”, delegacia civil no Rio de Janeiro. 

Aurora foi torturada no pau-de-arara, levou choques, foi espancada, afogada e sofreu queimaduras. Além disso, recebeu a “coroa de cristo”, uma tira de aço colocada em volta da cabeça que vai sendo apertada aos poucos para que o crânio seja esmagado e os olhos saiam para fora das órbitas. Ela foi alvejada por 29 tiros e teve o corpo jogado na rua. 

 

Zuzu Angel 

Uma das estilistas mais importantes do Brasil, Zuzu Angel virou referência não apenas no nicho. O filho dela, Stuart Angel, era militante do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) e foi sequestrado por agentes da repressão em 1971. Seu corpo nunca foi encontrado e a sua mãe, Zuzu, passou a vida lutando para que pudesse encontrá-lo. 

No entanto, Zuzu morreu em 14 de abril de 1976, depois que o carro dela foi encurralado e capotado na saída do Túnel Dois Irmãos, no Rio de Janeiro, e logo levantou-se a hipótese de ter sido uma emboscada para matá-la. 

Um ano antes ela teria deixado uma carta para Chico Buarque e outros amigos dizendo que “se algo vier a acontecer comigo, se eu aparecer morta, por acidente, assalto ou qualquer outro meio, terá sido obra dos mesmos assassinos do meu amado filho”. O relatório da Comissão da Verdade chegou à conclusão, em 2014, que a morte de Zuzu não foi um acidente e que houve envolvimento dos militares. O túnel onde ela morreu foi renomeado para Túnel Zuzu Angel. 

 

Pela primeira vez em quatro anos, o Ministério da Defesa do Brasil não comemora o aniversário do golpe militar de 1964. Geralmente, a celebração é adicionada à ordem do dia e lida em batalhões e quartéis ao redor do país. Neste dia 31 de março, que marca 59 anos desde o golpe, três vítimas do ex-coronel e torturador Carlos Brilhante Ustra revelaram os episódios de violência dos quais fizeram parte durante a ditadura. Os depoimentos foram publicados na coluna do jornalista Chico Alves, do UOL. 

Ustra, que morreu em 2015, foi um coronel do Exército Brasileiro, ex-chefe do Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) em São Paulo. O órgão tinha como atividade principal a repressão a grupos de oposição à ditadura militar, especialmente “agitadores” de esquerda, artistas e professores. 

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Em 2008, Ustra tornou-se o primeiro militar condenado pela Justiça Brasileira pela prática de tortura durante a ditadura militar. Ele chegou a ser homenageado, mais de uma vez, pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), quando era deputado federal e também após o ex-mandatário assumir o Planalto. 

Um dos relatos publicados pela coluna menciona o dia em que duas crianças, de quatro e cinco anos, assistiram a mãe ser torturada após ter sido estuprada. A mulher é a jornalista Amelinha Teles, hoje com 78 anos. Ela foi sequestrada por agentes da ditadura e levada para o DOI-Codi de São Paulo, junto com o marido, Cézar, e com Carlos Nicolau Danielli. Nicolau foi um dos dirigentes do Partido Comunista do Brasil (PCB), do qual Amélia também fez parte. 

O episódio se passou em dezembro de 1972, ano em que Carlos Nicolau morreu. As vítimas ficaram reféns do DOI de 28 de dezembro a 14 de fevereiro, por 48 dias. 

Os depoimentos 

Amelinha relatou que, primeiro, os agentes do DOI-Codi tiraram o seu marido e o colega de partido do carro no qual foram sequestrados. A ação aconteceu na Vila Clementina, bairro nobre da Zona Sul de São Paulo. Os homens foram agredidos com chutes e socos no estômago e no rosto. A sessão de tortura foi comandada por Ustra, que à época era major e utilizava os codinomes "Doutor Silva" e "Doutor Tibiriçá". 

A jornalista diz que chegou a questionar Ustra diretamente sobre as agressões, mas levou um tapa na cara e foi levada à sala de tortura junto aos outros dois.  

"Passei por diversos tipos de torturas. Tinha choque elétrico na vagina, no seio, na boca, no ouvido. Tinha palmatória, com uma madeira toda furada, de maneira que a pele vai soltando. Fui espancada por vários homens, além dele. Naquela primeira noite mesmo eu fui estuprada por um deles que era Lourival Gaeta, que tinha o codinome Mangabeira", compartilhou Amelinha.  

Segundo a vítima, cerca de oito homens participavam das sessões, enquanto obedeciam a ordens de Ustra. "Um dia, Ustra foi buscar em casa meus dois filhos, Edson, de 4 anos, e Janaína, de 5 anos, e minha irmã, Criméia, grávida de oito meses. Ele espancou a minha irmã. E teve a desfaçatez de levar meus filhos para dentro de uma sala onde eu estava sendo torturada, nua, vomitada, evacuada", completou Teles. 

Outras vítimas 

O segundo relato publicado neste dia 31 pertence a Gilberto Natalini, médico e ex-vereador paulistano. Hoje ele tem 71 anos, mas à época, tinha apenas 20 anos e estava no início da faculdade de medicina. Foi preso pelo DOI também em 1972. Apesar de ser opositor, não era vinculado à luta armada e nem a organizações políticas. 

"Alguns dias depois, já comecei a apanhar. Eles batiam, davam socos, tapas, choque no corpo, na orelha. Eu sem roupa. Em uma noite, o próprio Ustra me colocou descalço em cima de duas latas grandes. Jogou água no chão e ligou os fios elétricos, para dar choques. Além disso, me batia com um cipó", disse o ex-político. 

Os episódios de Natalini são similares aos do ex-guerrilheiro Emilio Ivo Urich, hoje com 75 anos. Ele fez parte da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e tinha 23 anos quando foi preso, antes dos demais, em 20 de novembro de 1970.  

"Na chegada já mandaram que eu tirasse a roupa, lá no pátio. Subi imediatamente para uma sala de tortura. Fui recebido pelo Ustra e passei a ser torturado. Me perguntavam onde estava Yoshitane Fujimori", disse. 

Fujimori foi um guerrilheiro que coordenava ações de inteligência à época. "Nos primeiros 15 dias fui muito torturado pelo Ustra e pelas outras equipes apenas com o objetivo de dizer onde estava o Fujimori. Não queriam saber se eu tinha assaltado banco, se eu tinha sequestrado alguém. Eu ficava à disposição dos torturadores 24 horas. Tomei a decisão de não entregar Fujimori, porque se entregasse ele teria que entregar outros. Há 15 anos processei o Estado brasileiro por danos morais, por conta das torturas, e ganhei. Nesse processo está comprovado que eu era torturado até três vezes por dia", finalizou Ivo. 

Após recurso do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal reformou decisão que tinha absolvido o sargento reformado do Exército Antônio Waneir Pinheiro de Lima, que atuou na chamada Casa da Morte. O TRF2 determinou que a ação penal contra ele retome seu curso, já que seus crimes não estão protegidos pela Lei da Anistia e não prescrevem.

Conhecido pelo apelido de Camarão, o sargento já havia se tornado réu por sequestro, cárcere privado e estupro da militante política Inês Etienne Romeu – única sobrevivente da Casa da Morte, localizada em Petrópolis (RJ).

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O acórdão reforça o entendimento de que o Brasil, por ser signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, deve seguir a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que determinou que o país investigue e puna crimes contra a humanidade praticados pelos agentes estatais, não podendo considerar-se um obstáculo à investigação ou processo leis internas de anistia e prescrição, como é o caso dos autos.

Segundo o MPF, os crimes imputados ao militar foram comprovadamente cometidos contra Inês Etienne Romeu num contexto de ataque sistemático e generalizado contra a população civil brasileira.

“As torturas, execuções sumárias e desaparecimentos forçados cometidos por agentes de Estado no âmbito da repressão política constituem graves violações a direitos humanos, para fins de incidência dos pontos resolutivos 3 e 9 da decisão, os quais excluem a validade de interpretações jurídicas que assegurem a impunidade de tais violações”, afirmou o órgão, mencionando sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Gomes Lund contra Brasil.

Tortura

Inês Etienne Romeu foi sequestrada por militares na cidade de São Paulo e levada, em 8 de maio de 1971, para a chamada Casa da Morte, na região serrana do Rio de Janeiro. O local funcionava como um aparelho clandestino do Centro de Informações do Exército (CIE), onde militares torturavam presos políticos.

As investigações comprovaram que Antônio Waneir manteve Inês Etienne contra sua vontade dentro do centro ilegal de detenção, ameaçando-a de morte e utilizando recursos que tornaram impossível a defesa da vítima. O réu estuprou a vítima também durante o encarceramento. Sua condição levou-a a tentar tirar a própria vida por quatro vezes.

Após o período na Casa da Morte, Inês Etienne Romeu ainda foi presa em outros locais. Seu encarceramento somente terminou em agosto de 1979. O MPF ouviu a vítima em 2013, ocasião em que Inês Etienne Romeu reconheceu, pela primeira vez, a foto de Antonio Waneir como sendo o “Camarão” da Casa da Morte.

Em 2020, o sargento reformado e outros militares também foram denunciados pelo sequestro e tortura do advogado e militante político Paulo de Tarso Celestino da Silva, crimes igualmente cometidos na Casa da Morte.

Com informações da assessoria do MPF

Um casal foi preso em flagrante em Guaratiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, suspeito de torturar até a morte uma criança de dois anos, nessa quinta-feira (9). Os agressores são o pai e a madrasta da criança, que estava na casa do genitor quando morreu. Segundo a delegada Márcia Helena Julião, titular da 43ª Delegacia de Polícia Civil de Guaratiba, a criança, identificada como Quenia Gabriela Oliveira Matos de Lima, apresentava 59 lesões pelo corpo. 

De acordo com o g1 Rio, uma médica da Clínica da Família Hans Jurgen Fernando Dohmann, localizada no mesmo bairro, procurou a distrital ao ver o estado da criança, levada à unidade de saúde pelo pai. Segundo a profissional, Quenia já chegou sem vida, “com sinais severos de violência”. As alegações apresentadas pelo pai na unidade de saúde não foram informadas. A menina tinha queimaduras no umbigo e uma fissura no ânus. 

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Policiais foram até a clínica e deram voz de prisão a Marcos Vinicius Lino e a Patricia André Ribeiro. “O crime bárbaro chocou a todos os policiais desta unidade e causou grande comoção, diante dos atos cruéis de tortura”, destacou a delegada. O pai e a madrasta responderão por homicídio. 

 A Polícia Civil prendeu, nessa quinta-feira (2), a mãe da criança que morreu na UPA de Jardim Paulista, em Paulista, no Grande Recife, com marcas de queimadura de cigarro no rosto e indícios de violência sexual. O menino de um ano e dez meses faleceu no último domingo (26), dentro da unidade. 

Policiais da 7ª Delegacia de Homicídios de Paulista cumpriram o mandado de prisão por homicídio qualificado pelo emprego de tortura contra a mulher de 23 anos.

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A ordem judicial foi expedida pela 1ª Vara Criminal da Comarca de Paulista após o laudo necroscópico apontar que a óbito foi causado por "síndrome da criança espancada". 

O Paris Saint-Germain não consegue viver um dia sem polêmicas. Ora por lesões, ora por ego de suas estrelas, ora por resultados adversos. Nesta terça-feira, o clube viu seu presidente, o catari Nasser Al-Khelaifi, envolvido em supostas acusações de sequestro e tortura a um de seus opositores.

De acordo com o jornal francês L'Équipe, o empresário franco-argelino Tayeb Benabderrahmane, de 42 anos, teria sido sequestrado e torturado por Al-Khelaifi por deter informações comprometedoras do atual presidente do clube de Paris há três anos.

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Tudo começou em 2020, quando o empresário ficou preso no Catar por três meses. Benabderrahmane afirmou que após sair foi colocado em cativeiro e torturado a mando de Khelaifi por seis meses. Depois, acabou colocado em prisão domiciliar e autorizado a sair depois de ter assinado um protocolo de confidencialidade prometendo não divulgar "documentos sensíveis sobre Nasser Al-Khelaifi".

O Tribunal de Paris iniciou a investigação do caso. Três juízes foram nomeados nesta segunda-feira para avaliar e examinar as acusações do franco-argelino, de que teria ficado em cativeiro.

Uma das suspeitas é sobre envolvimento de Al-Khelaifi na escolha da Copa do Mundo no Catar. E de um pacto para a concessão dos direitos televisivos das Copas de 2026 e 2030 para uma empresa catari da qual é o presidente, sem consentimento da Fifa.

O presidente do PSG já havia se manifestado sobre as acusações em novembro. "Você está falando sobre criminosos de carreira. Eles mudaram de advogado mais vezes do que histórias e mentiras. É o máximo em manipulação da mídia. Estou apenas surpreso que tantas pessoas considerem suas mentiras e contradições contra cíveis", rebateu Al-Khelaifi. "A lei seguirá seu curso e não tenho tempo para falar sobre pequenos criminosos de carreira."

A Polícia Militar do Mato Grosso do Sul prendeu em flagrante, na noite dessa segunda-feira (30), um homem acusado de torturar e estuprar a esposa em sua casa, no bairro de Santo Amaro, em Campo Grande. A vítima foi encontrada nua, amarrada e em estado de choque pelos policiais.

O homem de 27 anos, casado com a vítima de 20 anos há pouco mais de 1 ano, manteve a esposa em cárcere privado e, segundo a investigação, usava uma faca, maçarico, ferro de passar e um isqueiro para torturar a mesma. Ela ainda teria sido obrigada a dizer para a família que estava tudo bem, em uma ligação telefonica.

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Um irmão da vítima estranhou o comportamento da jovem e fez a denúncia aos policiais. O agressor ainda tentou despistar a PM, negando o crime, mas as autoridades entraram na casa e acharam a moça amarrada, em estado de choque e cheia de queimaduras.

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