Tópicos | KIT-COVID

Uma médica, de 26 anos, que atende na Unidade Básica de Saúde de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, está acusando um casal de tentar agredi-la porque a profissional não quis receitar o "Kit-covid" para o tratamento contra o novo coronavírus. Os nomes dos envolvidos não foram divulgados.

A médica chamou a polícia e, segundo o boletim de ocorrência, o casal foi até a UBS, que é referência no tratamento da Covid-19 em Três Lagoas, com um teste positivo para a doença. A médica decidiu receitar um medicamento para amenizar os sintomas da doença que o casal estava relatando. 

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A briga começou porque não se tratava de nenhuma medicação que integra o "Kit-covid". Segundo o UOL, o casal queria ser medicado com a ivermectina e hidroxicloroquina. A médica teria explicado que esses remédios não tinham eficácia contra o novo coronavírus comprovada e que poderiam causar reações severas.

A profissional relatou que o casal ficou muito alterado e passaram a gritar, querendo que fosse receitado o "Kit-covid". A médica decidiu se trancar em seu consultório, com medo de ser agredida fisicamente. 

O caso foi registrado na Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário (Depac) de Três Lagoas, mas o casal não foi levado porque estava contaminado com o vírus. A polícia afirma que o inquérito prosseguirá e os envolvidos ainda serão ouvidos - o casal deve depor após se curar da Covid-19.

A principal associação de médicos defensores do chamado tratamento precoce contra a covid-19, que inclui medicamentos ineficazes contra a doença, tem como um de seus apoiadores um grupo empresarial goiano que fabrica a ivermectina, um dos remédios que compõem o tratamento. A companhia é a responsável por desenvolver e administrar a plataforma online oferecida no site da associação aos médicos interessados no tema do tratamento precoce.

A Associação Médicos pela Vida é o principal grupo de profissionais a apoiar o uso de remédios sem eficácia contra a covid, como a hidroxicloroquina, a azitromicina e a própria ivermectina. Foi iniciativa da entidade a publicação de informes publicitários favoráveis ao "tratamento precoce" em oito jornais de grande circulação no País em fevereiro e a colocação de outdoors propagandeando a terapia ineficaz em várias cidades brasileiras. Representantes da associação também já se encontraram, em setembro, com o presidente Jair Bolsonaro, outro apoiador das terapias.

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Desde março, no auge da pandemia no País, a entidade passou a realizar em seu site "superlives multidisciplinares" exclusivas para médicos nas quais são ensinados os protocolos de tratamento. Para o evento, a associação ofertou aos profissionais com CRM uma plataforma online na qual, além de assistir às lives, os médicos podem assinar os manifestos do grupo, se registrar em um cadastro público de doutores que prescrevem os remédios e acessar materiais sobre o tema. A plataforma, chamada de iMed, foi desenvolvida e é mantida pelo Grupo José Alves, proprietário da farmacêutica Vitamedic, uma das fabricantes da ivermectina no Brasil.

A ligação entre a entidade e a empresa, que pode configurar conflito de interesse, segundo o Código de Ética Médica, foi exposta em uma das lives fechadas da associação. O elo foi revelado pelo jornalista independente Victor Hugo Viegas Silva em sua página no site Medium e confirmado pelo Estadão, que também teve acesso aos vídeos.

No evento, em 10 de março, o presidente da associação, o oftalmologista pernambucano Antônio Jordão, convida o diretor de tecnologia do grupo empresarial, Carlos Trindade, a apresentar a plataforma criada para os médicos. Na introdução do convidado, Jordão pede a Trindade que explique "como os médicos vão fazer a interação com a nossa plataforma atual, graças à ajuda de vocês".

Ao apresentar o sistema, Trindade detalha as funcionalidades e explica como os médicos devem proceder. "O primeiro ponto principal é como os médicos se comunicam com o grupo técnico e com o grupo de apoio para ter os seus problemas resolvidos: é pelo centro de suporte que nós criamos", detalha o diretor, destacando em seguida que a empresa montou uma equipe de TI dedicada exclusivamente ao atendimento dos médicos.

O número de telefone no site da associação para suporte aos profissionais tem código de área 62, de Goiás, onde está a sede do grupo empresarial. Na apresentação, Trindade, que também é reitor da Unialfa, universidade goiana de propriedade do Grupo José Alves, também demonstra que a corporação, além de ter desenvolvido a plataforma, é quem a administra e tem acesso aos dados dos cadastrados. Na live, ele mostra aos participantes a tela de gerenciamento, na qual aparecem 9.691 médicos.

O diretor também destaca que o grupo empresarial abastecerá a plataforma com uma biblioteca na qual serão publicados artigos que "comprovam as evidências científicas" do tratamento precoce e notícias sobre o tema. "Registraremos todas as notícias que saem em mídia que falam sobre cidades, prefeituras e empresas que estão adotando o tratamento precoce e preventivo, e quais são os impactos da adoção desses tratamentos."

Apesar do apoio claro do grupo empresarial que produz a ivermectina aos médicos defensores do tratamento precoce, o presidente da associação não deixa claro na live nem no site da entidade tal conflito de interesse, o que é obrigatório pelo Código de Ética Médica. Relações de médicos com a indústria não são proibidas, mas devem ser declaradas, segundo prevê o artigo 109 do código. De acordo com o documento, é vedado ao médico "deixar de declarar relações com a indústria de medicamentos, órteses, próteses, equipamentos, implantes de qualquer natureza e outras que possam configurar conflitos de interesse, ainda que em potencial".

Sem resposta

O Estadão procurou a Associação Médicos pela Vida para esclarecer qual é a relação da entidade com o Grupo José Alves e, por consequência, com a Vitamedic. A reportagem enviou perguntas sobre qual tipo de apoio foi fornecido pela empresa à associação e por que essa relação não foi declarada no site da entidade, como prevê o Código de Ética Médica. Também questionou se o grupo empresarial fez repasses financeiros à associação e aos seus integrantes. Indagou ainda quem foram os financiadores dos informes publicitários publicados em jornais e dos outdoors. Nenhuma das perguntas foi respondida.

A assessoria de imprensa da associação prometeu na terça-feira que um dos coordenadores do grupo daria entrevista. Nesta quarta, porém, a entidade recuou e disse que os coordenadores haviam se reunido e decidido não se pronunciar. A reportagem também tenta, desde segunda-feira, contato com o Grupo José Alves para esclarecer o tipo de apoio dado à associação - sem retorno.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O deputado Alexandre Padilha (PT-SP) e o senador Humberto Costa (PT-PE), ex-ministros da Saúde, pediram apuração ao Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o estudo do Ministério da Saúde para inserir medicamentos do "kit covid-19" no Farmácia Popular.

Revelado nesta sexta-feira, 11, a pelo Estadão, o plano prevê gastar até R$ 250 milhões para reembolsar farmácias conveniadas para que distribuam de graça a hidroxicloroquina e o antibiótico azitromicina. Essas drogas não têm eficácia comprovada contra o novo coronavírus, mas se tornaram aposta do governo Jair Bolsonaro para enfrentar a pandemia.

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"Inadmissível tamanha irresponsabilidade com os recursos públicos", afirmou Padilha, no pedido, encaminhado ao ministro Benjamin Zymler, que relata processos sobre ações da Saúde na pandemia. Padilha também pediu informações ao Ministério da Saúde sobre a distribuição dos medicamentos.

Já o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM), demitido da Saúde por Bolsonaro em abril, disse que o governo está "perdidinho". Mandetta afirmou ainda que há risco de o comando da Saúde cometer um ato de improbidade.

Apesar de querer usar dinheiro público para entregar o "kit covid" gratuitamente, o ministério tem mais de 2,5 milhões de comprimidos de hidroxicloroquina encalhados. O estoque faz parte de um lote de 3 milhões de unidades, recebido de doações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e da farmacêutica Sandoz, e não é parte do kit que será entregue nas farmácias. Além da baixa procura, o fármaco encalhado precisa ser fracionado.

Criador do Farmácia Popular, em 2004, o senador Humberto Costa (PT-PE), disse que a inclusão dos medicamentos não tem "qualquer fundamentação científica". Costa pediu para o Ministério Público junto ao TCU se debruçar sobre a proposta da gestão de Pazuello. "Subverte a lógica do programa, que é focar em algumas doenças que precisam ser tratadas permanentemente e de forma adequada", disse o senador à reportagem.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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