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Com estreia global no Disney+ nesta sexta-feira (11) e também exibido nos cinemas de alguns países, o mais recente filme da Pixar Studios aborda o que uma garota passa durante a puberdade com sua mãe superprotetora, mas com uma analogia ao quebrar o tabu sobre discutir a puberdade.

Mellin Lee, dublada por Rosalie Chiang, é uma aluna muito confiante que se destaca em todas as áreas, porém, uma noite, ela vai pra cama e acorda como um panda vermelho gigante. Dessa maneira, Mellin experimenta muitas das ocasiões pelas quais os adolescentes passam: aparecimento de novos pelos, alteração corporal, mudança de emoções, vergonha de sentimentos sexuais, entre outras demonstrações.

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“É como a profecia que se realiza. O fato de ser tão chocante o primeiro filme a realmente falar sobre isso é provavelmente a razão pela qual não falamos sobre isso”, apontou a produtora, Lindsey Collins.

A atriz de “Killing Eve” e "Grey's Anatomy" Sandra Oh, que dubla a mãe superprotetora da protagonista, afirmou que é importante as crianças entenderem o que acontece durante a puberdade, ao invés de sofrerem em silêncio. “Uma amiga minha que viu este filme com seu filho de dez anos, de repente teve que ter uma conversa sobre sexualidade e o que as meninas passam”, disse Sandra. 

Por Camily Maciel

 

 

A puberdade é uma fase delicada na vida dos jovens. É marcada pela transição entre a fase infantil e a adolescência, onde o indivíduo vê o mundo lúdico se transformar em realidade e começa a se enxergar como um ser social, o que gera conflitos internos e externos. Esse também pode ser um momento desafiador para os pais e responsáveis, principalmente se a puberdade ocorrer agora, enquanto a família também enfrenta o isolamento social devido ao coronavírus.

Nesse período de quarentena, as emoções podem se confundir. Para quem passa pela puberdade será ainda mais difícil entender o que acontece. "Esse é um momento de descobertas e de experiências, mas também de muita ansiedade e dúvidas", explica o psicólogo Reinaldo Fraga. "Esta fase é considerada fundamental, pois estão presentes conflitos, questionamentos, curiosidades e percepções relativas à identidade sexual, responsabilidade social, como profissão e caráter, além dos relacionamentos afetivos, reprodução humana, os tabus, mitos e questões de gênero relacionadas à sexualidade. Por isso é importante o diálogo", complementa.

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Segundo o psicólogo, é importante que os responsáveis deem abertura para que o adolescente fale sobre suas dúvidas e desejos, e precisam não deixar os julgamentos e dogmas entrarem no diálogo. "Esta é a fase em que se inicia as práticas sexuais, inserindo o adolescente no contexto das vulnerabilidades, onde estará mais exposto à infecções sexualmente transmissíveis, gestação não planejada e aborto. Conversar e saber ouvir é o principal passo", diz Borges. "A ebulição dos hormônios aflora emoções, substratos primitivos que dão a quarentena um ar ainda mais difícil. Afinal, quais jovens gostariam de ficar trancando em casa junto aos pais? Apenas crianças, e isso eles não são mais".

A quantidade de informação absorvida também pode causar dúvidas, principalmente sobre aspectos como ideologia de gênero e orientação sexual. Por isso, falar sobre experiências vividas ajuda o adolescente a não se sentir perdido. "A orientação sexual se refere à atração física, romântica e/ou emocional duradoura de um indivíduo por outra pessoa, enquanto a identidade de gênero se refere ao sentimento interno de ser masculino, feminino ou qualquer outra denominação. Pessoas transexuais podem ser heterossexuais, lésbicas, gays, bissexuais ou assexuais, por exemplo", finaliza Borges.

Um garoto transgênero de 12 anos conseguiu na Justiça o direito de interromper a puberdade em Uberlândia (MG). Após ser pressionado pelo pai, em razão da orientação sexual, com a ajuda da mãe ele acionou o Ministério Público, que ingressou na Justiça e obteve decisão favorável da Vara da Infância e da Juventude. Além disso, está em discussão no Conselho Federal de Medicina (CFM) a criação de norma à classe médica que pode alterar o limite de idade da terapia hormonal a adolescentes transexuais e travestis - hoje em 18 anos - e a autorização de bloqueio da puberdade na pré-adolescência desses pacientes.

O juiz de Minas autorizou o adolescente a fazer um tratamento que impede o desenvolvimento de suas características sexuais. Isso após profissionais emitirem um laudo apontando que, apesar de geneticamente ser homem, o garoto comporta-se e age como se fosse do gênero feminino.

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O promotor de Justiça de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, Jadir Cirqueira de Souza, diz que em julho - usando trajes femininos e acompanhado da mãe, o garoto foi até a promotoria. Também o acompanhavam membros de uma equipe multidisciplinar da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). "Inicialmente achei que fosse uma menina e descobri que era um garoto somente quando ele narrou sua história", disse. A mãe contou ter buscado ajuda após o filho ser impedido de frequentar o ambulatório de processo transexualizador do Hospital de Clínicas.

É o primeiro caso de que se tem conhecimento no Estado e o juiz Lourenço Migliorini Fonseca Ribeiro argumenta que sua decisão, do fim de julho, está ancorada "em moderna doutrina, jurisprudência e no princípio da proteção integral". "Não se pode conceber que o pai, de forma discriminatória, impeça ou prejudique os tratamentos e os acompanhamentos psicossociais indicados, com clara violação da dignidade humana e do livre desenvolvimento da saúde mental do adolescente."

O casal envolvido é de origem simples, tem na faixa dos 30 anos de idade e está separado há cerca de cinco anos. A pedido da Justiça, nomes e detalhes não serão divulgados, mas a relação com o filho estaria entre os motivos de desavenças e da separação. A mãe conta que muito cedo já era possível identificar os sinais femininos. "Desde os 2 anos de idade ou menos." Neste ano, ela procurou ajuda no ambulatório inaugurado em janeiro para atendimento a pessoas trans.

Mudança no País

Segundo portaria do Ministério da Saúde, "transexuais são pessoas cuja identidade de gênero é oposta ao sexo biológico". O procedimento transexualizador é voltado a "pessoas que sofrem com a incompatibilidade de gênero". Um levantamento feito pelo próprio ministério aponta que no País, entre os anos de 2008 e 2016, foram realizados 13.863 procedimentos ambulatoriais relacionados ao processo transexualizador.

Não há hoje no Brasil uma normativa que padronize o comportamento médico em casos de transexualidade. Embora um parecer do CFM, de 2013, trate sobre terapia hormonal para adolescentes transexuais e travestis a partir dos 16 anos, sob confirmação clínica do transtorno de identidade de gênero, o documento funciona só como orientação aos médicos.

Busca-se agora uma diretiva maior que, em caso de descumprimento, o médico possa ser alvo de sindicância e sanção.

Membro da comissão que analisa as mudanças, o psiquiatra Alexandre Saadeh diz que o tema é "difícil e complexo" e, portanto, "vai levar o tempo que tiver de levar, para ser a melhor decisão". "Há uma série de discussões hoje na comissão. Hormônio antes dos 18 anos, bloqueio (da puberdade), acompanhamento de travestis e outras expressões de gênero. Ainda não se fechou uma definição", explica o coordenador do Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero e Orientação Sexual, do Hospital das Clínicas em São Paulo.

Segundo o psiquiatra, é importante que o bloqueio da puberdade seja feito quando a criança está entrando na adolescência. "Assim, você impede o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários (como pelos no corpo, voz grave e pomo de Adão no caso do desenvolvimento biológico masculino)."

Sem judicialização

Semelhante ao episódio do garoto transgênero de 12 anos, duas famílias em conflito sobre a transexualidade do filho já procuraram o Ambulatório em São Paulo. O pai ou a mãe discordava sobre o início do tratamento da criança ou do adolescente.

A equipe de profissionais do espaço conseguiu evitar a judicialização do caso. Saadeh reforça que, quando o pai ou a mãe nega a autorização de tratamentos - como aconteceu com o garoto de 12 anos -, a consequência é o sofrimento mental do paciente. "É um sofrimento profundo que pode ser extremamente pesado e gerar consequências para a vida toda."

Outro caso

Outro caso que serve como exemplo é o de Bárbara (nome fictício), criança transgênera que mora em Salvador e é tratada no Ambulatório do HC. Ela conseguiu que a escola a tratasse pelo gênero feminino e a mãe, Raquel (nome fictício) já percebeu melhoras - até mesmo físicas. "Ela chorava muito, adoecia muito, era uma criança tímida. Agora, é o extremo oposto. Ligada no 220."

Mãe e filha são acompanhadas por uma equipe de médicos. Mas Raquel já acompanha o crescimento do órgão sexual masculino e dos pelos de Bárbara. "Tem de ficar atento aos sinais da puberdade porque o bloqueador precisa ser inserido exatamente quando a puberdade se inicia. Não pode ser antes. Quando ela tiver idade, com certeza vai tomar o bloqueador de puberdade, sim", afirma.

Decisões como a de Minas devem reverberar ainda pelo País afora, na opinião do defensor público Erik Saddi Arnesen, coordenador do Núcleo Especializado de Defesa da Diversidade e da Igualdade Racial de São Paulo. "Quanto mais essas questões virarem demandas sociais, passando a ser uma situação mais presente em nosso meio, mais vão aumentar as demandas judiciais." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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