Tópicos | cota para mulheres

A diretora executiva do Instituto Patrícia Galvão, Jacira Melo, fez duras críticas a rejeição da reserva de cadeiras para mulheres nos legislativos federal, estaduais e municipais. “É a mais completa tradução de que deputados operam em causa própria, é uma maioria masculina que não tem condições políticas e éticas para reestruturar o sistema politico brasileiro”. Formada em filosofia política, ela destaca que a proposta das cotas apresentada no plenário da Câmara durante a votação da reforma política, nesta semana, não produziria mudanças bruscas mas poderia aumentar gradualmente a representatividade de gênero.

“Estava em debate algo minimalista, mas da maior importância”, avaliou a filósofa ao citar exemplos como o da Bahia, que tem 39 deputados federais dos quais apenas três são mulheres. “Teríamos na Bahia pelo menos mais uma mulher. Temos hoje cinco estados que não têm qualquer representação parlamentar feminina [Alagoas, Espírito Santo, Mato Grosso, Paraíba e Sergipe]. Com esse mecanismo que eu não chamo de cota teríamos alguma representação que é democrática e legítima”, acrescentou Jacira.

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A proposta, que recebeu 293 votos favoráveis – eram necessários 308 – ficou fora do texto da reforma política. Ela reservava 10% das cadeiras na primeira legislatura, passando para 12% na segunda, até chegar a 15%, em 2027. Além do resultado da votação, Jacira Melo lamentou a postura de parlamentares diante da emenda que, segundo ela, revelaram a cultura machista no Parlamento.

“Entre os defensores da regra, um deputado chegou a dizer que era a favor das cotas porque o plenário ficaria mais bonito. Outro disse ser a favor para dar um voto de confiança às mulheres”, criticou Jacira. Mais de 100 deputados votaram contra o mecanismo, entre eles, o deputado delegado Edson Moreira (PTN-MG) que afirmou que “não é justo é que uma minoria, pequena e de pouco trabalho, conquiste uma cadeira que não é fácil".

Autora de tese sobre a representatividade feminina no Poder, Luciana Ramos, pesquisadora da Fundação Getulio Vargas (FGV), lembra que existem três tipos de cotas políticas no mundo – reserva de assentos mínimos, cotas partidárias voluntárias e cotas legislativas – que impõem a todos os partidos um percentual mínimo de candidatas. “No Brasil temos as cotas legislativas, mas isso não é cumprido por uma série de razões, especialmente pelo fato de não ter sanção para o descumprimento dessa lei”, avaliou.

Luciana disse que não se surpreendeu com a rejeição da medida por um Congresso “conservador” como o atual. Alertou que a composição legislativa de hoje produz impactos diretos na formulação de leis e políticas. “As mulheres representam 51% da população brasileira, mas elas não fazem as leis que regem essa sociedade composta pela maioria de mulheres. É uma discrepância enorme ter menos de 10% de mulheres na Câmara, por exemplo”.

Para a pesquisadora, a diversidade de visões é fundamental em espaços de poder. “A inserção de mulheres faz toda diferença. Enquanto um homem decide onde vai passar uma linha de ônibus, ele pensa que tem que ir da casa ao trabalho. Na perspectiva da mulher, esse ônibus precisa passar na casa, na escola do filho, no mercado e no trabalho, por exemplo”.

O Plenário da Câmara dos Deputados deve voltar a analisar, por temas, a reforma política a partir da próxima terça-feira (9). Deverão ser analisados textos sobre duração dos mandatos; eleições municipais e gerais no mesmo dia; cotas para mulheres; voto facultativo; data da posse presidencial; e federações partidárias, entre outros assuntos.

Com a votação por partes, o texto final da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 182/07, do Senado, está sendo construído aos poucos.

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Nas primeiras votações, os deputados já resolveram manter o atual sistema proporcional de eleição de deputados e vereadores; acabar com a reeleição para chefes do Executivo; cortar o Fundo Partidário de legendas sem congressistas; e permitir doações de empresas a partidos, e de pessoas físicas a partidos e candidatos.

Esse último tema, entretanto, está sendo contestado no Supremo Tribunal Federal (STF) por partidos que foram contra os procedimentos da votação.

Cinco ou quatro anos - Depois de divergências entre os partidos no último dia 28 de maio, a votação da regra que prevê cinco anos de mandatos eletivos foi adiada para a próxima semana. A mudança no tempo de mandato complica a proposta de coincidência de eleições – se o mandato for de cinco anos para deputados e continuar de oito anos para senadores, as legislaturas não coincidirão, tampouco as eleições.

Segundo acordo político entre deputados e senadores, a Câmara não vai propor mudanças relativas ao Senado e vice-versa. O mandato de cinco anos para senadores não tem apoio do Senado, e o mandato de dez anos é julgado excessivo por vários partidos.

Federações - O relatório do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) para a PEC 182/07 prevê ainda o instituto da federação partidária. Segundo esse mecanismo, os partidos poderão se associar, nas eleições, para concorrer por cargos eletivos, de forma semelhante às coligações.

Entretanto, no Legislativo, os partidos unidos em uma federação deverão atuar assim por toda a legislatura. Na última vez que a Câmara discutiu a reforma política em Plenário, por meio de projeto de lei em 2007, a sistemática surgiu como opção ao fim das coligações.

O resultado final da reforma política, após concluída a votação de todos os temas, ainda dependerá de votação em 2º turno antes de ir ao Senado. Para valer nas eleições de 2016, as mudanças têm de entrar em vigor até outubro com a votação nas duas Casas do Congresso (Câmara e Senado).

*Com informações da Agência Câmara.

Quase 20 anos depois de os partidos políticos serem obrigados a criar uma cota mínima de 30% de candidaturas femininas, defensores da medida ainda lamentam que ela não tenha trazido resultados nas urnas. Atualmente, as mulheres ocupam menos de 10% dos assentos no parlamento brasileiro. Entretanto, 52,1% do eleitorado do país (74,4 milhões) é composto pelo sexo feminino, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Para especialistas, a subrepresentação feminina no cenário político está ligada a barreiras impostas dentro dos partidos e não a uma descrença do eleitorado na capacidade da mulher.

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O demógrafo e professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (ENCE/IBGE) José Eustáquio Diniz Alves diz que o eleitorado vê com bons olhos a mulher na política. “As eleições de 2010 foram a prova de que o eleitorado não discrimina o sexo feminino, pois as duas mulheres [Dilma Rousseff e Marina Silva], entre nove candidatos, tiveram dois terços (67%) dos votos no primeiro turno. E uma mulher foi eleita presidenta da Republica, com mais de 54% dos votos”, analisou, acrescentando que não considera o Brasil um país de forte tradição patriarcal e machista.

O demógrafo ainda lembrou que países com tradição democrática consolidada há mais tempo, como os Estados Unidos e a França, nunca tiveram mulheres na Presidência. O problema, segundo ele, está “fundamentalmente” no Legislativo. “Por uma prática misógina dos partidos políticos que são dominados pelos homens e não querem abrir mão do poder. Ou seja, a discriminação de gênero não está no eleitorado, mas principalmente nos partidos políticos”, destacou.

Assim como Alves, outros estudiosos do processo eleitoral apontam que o maior desafio das mulheres é romper as barreiras impostas por restrições dentro das legendas como, por exemplo, tentar o equilíbrio nos investimentos destinados às campanhas. Inicialmente, a legislação eleitoral brasileira exigia apenas que os partidos reservassem uma porcentagem de vagas às candidatas. Há alguns anos, o preenchimento dos 30% se tornou obrigatório, mas, levantamentos feitos por organizações como o Centro Feminista de Estudo e Assessoria (Cfemea) mostram que nas urnas essa reserva desaparece.

“A eleição anterior foi a que disparadamente teve um maior número de candidatas e o resultado do processo, depois de 15 anos de política de cotas, foi zero. Tivemos exatamente a mesma proporção de mulheres eleitas que experimentamos nas eleições anteriores a 2010. Como pode aumentar o número de candidatas e o número de eleitas não aumentar? Isso demonstra a falta de investimentos”, avaliou a socióloga Guacira César Oliveira, diretora do colegiado do Cfemea.

Números divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revelam que, de quase 8 mil candidatas registradas para as eleições deste ano, mais de 500 são donas de casa e 650 são professoras, enquanto, entre os candidatos homens, a maioria se declara empresário ou advogado. “As mulheres, de maneira geral, fazem dupla jornada e têm limitações que não foram aliviadas ao longo desses anos de democracia”, lembrou a socióloga que destaca que o cumprimento da cota mínima tem sido feito apenas em respeito à lei, mas que, internamente, os partidos não dão qualquer relevância a essas candidaturas.

Nas eleições deste ano, as mulheres representam pouco mais de 30% das candidaturas considerando todos os cargos disputados (presidente da República e vice, governador e vice, deputados e senadores). Na corrida para o Senado, por exemplo, de 182 candidatos, 35 são mulheres. Para a Presidência da República, três candidatas tentam a vaga – Dilma Rousseff, Luciana Genro e Marina Silva. A maior proporção de mulheres (36,4%) está entre as indicadas para o cargo de vice-presidente. A corrida pelo comando dos governos estaduais é a que tem menor participação feminina. Apenas 17 mulheres concorrem a uma vaga para os Executivos estaduais entre as 169 candidaturas, o equivalente a pouco mais de 10%, segundo registro do TSE.

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