O procurador especial Robert Mueller será interrogado no Congresso americano, na quarta-feira (24), sobre seu relatório detalhando as ligações entre a campanha eleitoral de Donald Trump e a tentativa da Rússia de interferir nas eleições de 2016, bem como as ações do presidente para obstruir esta investigação.
A 16 meses das eleições presidenciais em que Trump aspira a um segundo mandato, há muita coisa em jogo com essa aparição de Mueller, a primeira do procurador especial diante dos congressistas.
Os democratas esperam que o depoimento tenha impacto negativo na imagem de Trump, e alguns congressistas esperam até que as declarações de Mueller forneçam elementos importantes para iniciar um processo de impeachment contra o presidente.
A relutância de Mueller a se envolver com a política e com os planos dos republicanos de converter a audiência, que será televisionada, em uma disputa partidária digna de um reality show, ameaça deixar os americanos tão confusos quanto ficaram diante do relatório de mais de 400 páginas apresentado por ele em abril passado.
"As pessoas têm o direito de ouvir a verdade, da parte de Mueller, sobre o mau comportamento de Trump e sobre os atuais riscos para a segurança nacional", declarou Adam Schiff, congressista democrata e presidente do Comitê de Inteligência da Câmara, uma das duas comissões que ouvirão Mueller na quarta-feira.
- Trump, absolvido ou não -
Finalizado em março depois de mais de dois anos de investigações sobre a suposta interferência russa para favorecer Trump nas eleições de 2016, o relatório Mueller documentou inúmeros casos de contato entre membros da campanha do atual presidente e agentes de Moscou, mas concluiu que não havia motivos para fazer acusações de conspiração criminal contra o presidente.
De acordo com o documento, Trump também tentou obstruir a investigação pelo menos dez vezes, mas Mueller se absteve de recomendar acusações criminais. À época, alegou que as políticas do Departamento de Justiça impedem que se acuse um presidente em exercício.
Trump, que em várias ocasiões descreveu a investigação de Mueller como uma "caça às bruxas" e como uma "fraude", declarou-se absolvido após a divulgação do relatório.
"O caso está encerrado! Obrigado", escreveu o presidente no final de maio, depois que Mueller falou publicamente pela primeira vez a respeito de sua investigação.
Margaret Taylor, especialista em governança da Brookings Institution, um think tank localizado em Washington, disse que a audiência é uma oportunidade para a opinião pública entender claramente o alcance das descobertas de Mueller.
"Não acho que os americanos entendam completamente as tentativas sistemáticas do Kremlin de interferir (na eleição de 2016) e como a campanha de Trump reagiu a isso", declarou Taylor em uma entrevista.
"Acho que há uma grande parte do país que só ouve o presidente dizer 'não houve conluio, não ouve obstrução', e para eles a história acaba aí", completou.
- A esfinge Mueller -
A esperada aparição de Mueller começa na quarta-feira, às 8h30, em Washington (10h30 de Brasília), no Comitê Judiciário da Câmara dos Representantes (Deputados). Depois, seguirá no Comitê de Inteligência, a partir do meio-dia (horário local).
Os membros democratas e republicanos se revezarão em suas perguntas, em turnos de cinco minutos cada.
Mueller é considerado um osso duro de roer. O procurador cultiva uma reputação de "esfinge" por sua extrema reserva e já declarou no passado que preferia não testemunhar sobre o caso no Congresso.
Além disso, os representantes republicanos tentarão cortar qualquer tentativa de exposição ordenada e desviar a discussão para outras questões, apelando para minar a credibilidade de Mueller e os fundamentos de sua investigação.
"O trabalho fala por si, e o relatório é meu testemunho", afirmou Mueller em maio.
"O que ele não fará é ir além de seu relatório, como já disse", declarou à CNN o ex-vice-diretor do FBI Andrew McCabe, que trabalhou com Mueller.
McCabe destacou, porém, que, se as perguntas forem feitas de forma inteligente, especialmente as ligadas a sua opinião sobre se Trump violou (ou não) a lei, talvez os democratas possam tirar algum proveito disso.
Alguns especulam que Mueller, de 74, diretor do FBI por 12 anos, pode estar pronto para purgar alguns sentimentos depois de receber repetidos ataques por parte de Trump por suas descobertas.
"Se ele decidir que chegou ao fim de sua carreira e está chateado com a forma como seu relatório foi tratado, então, talvez ele seja mais loquaz", conclui Taylor.