Teliana Pereira vive um recomeço na carreira. Aos 25 anos, e com histórico de superação, a número 1 do tênis feminino brasileiro quer aproveitar a experiência adquirida nos difíceis anos em que penou com lesões e abandono de patrocinadores para dar um novo impulso em sua trajetória.
O primeiro passo foi dado em 2013, melhor ano de sua biografia. Ela rompeu a barreira do Top 100 do ranking mundial e quebrou seguidos jejuns do tênis feminino brasileiro em torneios de nível WTA. Neste ano, alcançou a chave principal do Aberto da Austrália e liderou o Brasil na conquista da vaga nos playoffs do Grupo Mundial II da Fed Cup.
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O resultado na competição entre países e a recente semifinal obtida no Rio Open garantiram à tenista os primeiros sinais de fama. Algo ainda novo para Teliana, que tenta converter o apoio da torcida em combustível para sonhar com objetivos mais ambiciosos no circuito.
Na entrevista a seguir, ela conta como está encarando esta nova fase da carreira, e o inesperado assédio da torcida, revela preocupação com a futura renovação do tênis feminino, mas exibe confiança em um triunfo brasileiro na Fed Cup e no seu crescimento nos torneios da WTA.
Agência Estado - O ano de 2013 foi um divisor de águas na sua carreira. Você já não era mais uma juvenil e, de repente, deu um salto no circuito. O que aconteceu?
Teliana Pereira - É tudo uma questão de atitude, de postura. Tudo começou mesmo ali em Bogotá, quando eu passei a acreditar. Foi um dos primeiros WTA, onde eu passei a conviver com as melhores tenistas. E comecei a ver que era possível, olhava e pensava: 'Poxa, acho que eu também posso'. Hoje eu amadureci bastante. Consigo encarar melhor tudo que acontece dentro da quadra. E, principalmente, passei a encarar de forma mais tranquila as derrotas, que é a parte mais dura da vida de um tenista.
AE - Você evoluiu também nas quadras rápidas.
Teliana - Acho que tive uma melhora muito boa na quadra rápida, porque antes eu tinha mais receio. Eu tive duas cirurgias no joelho direito, fiquei um ano e meio parada. Por isso quadra rápida é um pouco agressivo para mim. Tem muito mais impacto. O que tento fazer é não jogar dois meses seguidos na quadra rápida, porque aí seria suicídio.
AE - No Rio, você chegou a mais uma semifinal e conquistou o público. Deu autógrafos, bateu fotos e viu seu nome na boca da torcida. Está ficando famosa?
Teliana - Um pouquinho (risos). Foi uma experiência muito diferente porque quase não tem torneio no Brasil. Eu joguei pouquíssimo aqui. Se me perguntassem ano passado onde eu preferia jogar, eu diria que preferia fora do Brasil, mas eu mudei totalmente meu pensamento. Eu adorei jogar aqui. Eu não conseguia andar no clube (onde aconteceu o torneio). Toda hora as pessoas me paravam, o que foi uma coisa nova para mim. Você vê isso acontecendo com o Guga, com o Nadal, mas não comigo. Não estava acostumada a dar autógrafo. O que eu tirei de foto!
AE - Você foi aplaudida de pé e muitos te chamaram de "guerreira", mesmo sem conhecer sua trajetória.
Teliana - Pois é, parecia que as pessoas já conheciam minha história, elas usaram exatamente a palavra que eu acho que me descreve. Minha maior qualidade é a perseverança. Eu até me emocionei no fim do jogo (na derrota na semifinal). Comecei a chorar porque não acreditava que aquilo estava acontecendo. E eu vi todo mundo aplaudindo de pé e aí, passou todo aquele filme na minha cabeça, quando eu me machuquei, que eu achava que não voltaria a jogar. E ali eu estava no melhor momento da minha carreira, no melhor momento da minha vida.
AE - Esse reconhecimento nacional era o que faltava em termos de motivação para buscar objetivos maiores no circuito?
Teliana - Acho que deu uma levantada em tudo o que eu venho fazendo, deu um impulso. Acho que ajudou não apenas naquela semana, mas acho que vai me ajudar num todo. Acho até que vai fazer com que o pessoal passe a olhar o tênis feminino com olhos diferentes, porque estamos precisando disso já faz um tempinho.
AE - E esse "impulso" vem se refletindo em patrocínios?
Teliana - Minhas condições melhoraram demais. O Top 100 teve um impacto muito grande. Teve também a quebra de jejum de brasileiras em semifinais de WTA e no ranking. Posso dizer que eu até dei um pouco de sorte, por ter sido a primeira a conseguir tudo isso (depois de muitos anos). Então, melhorou muito os apoios. Hoje em dia eu consigo viajar muito mais tempo acompanhada (de membros da equipe). Consegui melhorar minha estrutura, não apenas no tênis, mas fora também. Ajudei minha família. Não tenho do que reclamar. Mas ainda preciso de um fisioterapeuta em Curitiba, que esteja sempre comigo. É muito caro. Mas, perto do que era antes, está mil vezes melhor. E, pelo que convivo com as meninas (companheiras de equipe na Fed Cup), vejo que elas estão recebendo mais apoio também. E isso é devido a tudo o que vem acontecendo na equipe brasileira.
AE - O que acha da Suíça, próximo adversário do Brasil na Fed Cup? Quais são as chances da equipe brasileira?
Teliana - Conheço a (Stefanie) Voegele, que é a melhor. Até já a enfrentei. Tem a (Belinda) Bencic, que nunca vi jogar, mas, pelos resultados, é uma boa jogadora. Acho que é uma equipe forte, mas dá para vencer, é possível. Acho sinceramente que está mais para a gente. Acredito muito que posso levar todos os meus pontos em simples. O confronto vai ser no Brasil e tem que ter torcida para tirar elas do sério, para mexer com o mental delas. E tem que ter as melhores condições possíveis para a gente, e não pra elas.
AE - As jogadoras estão participando da escolha da sede do confronto?
Teliana - Eu ainda não sei onde vai ser. Na verdade, nós, jogadoras, estamos tentando passar mais ou menos o que a gente quer. Queremos quadra mais lenta, com bolinhas não tão pesadas. O pessoal da CBT vai tentar fazer o melhor para a gente. É óbvio que eu quero jogar em Curitiba, se eu pudesse escolher. Eu treino lá e tenho certeza de que teria muita gente para assistir. É importante ter bastante torcida. Florianópolis e São Paulo também estão interessadas em receber os jogos.
AE - Você acabou se tornando uma referência para as tenistas mais jovens, principalmente na Fed Cup. Como se sente nesta posição?
Teliana - É uma responsabilidade porque tem que estar sempre fazendo bonito. Mas acho legal. Isso me motiva. Porque eu tenho que estar sempre dando o meu melhor, porque eu preciso fazer sempre perfeito na quadra. Eu fico feliz. Acho que é a recompensa por todo o trabalho que venho fazendo. Todo mundo sonha um dia em ser uma referência.
AE - A entrada na chave principal do Aberto da Austrália e o resultado no Rio mudaram suas metas para 2014?
Teliana - Minhas metas não mudaram, eu sou totalmente pé no chão. Às vezes, acredito que eu posso ir até melhor, mas eu prefiro colocar uma meta que eu tenho certeza que eu vou alcançar. Meu foco é jogar a chave principal de todos os Grand Slams neste ano. Se isso realmente acontecer, meu ranking vai acabar melhorando. E eu gostaria muito de terminar o ano entre as 50, 70 melhores. Acho que seria algo muito grande. Mas se na metade do ano eu estiver entre as 60 melhores, eu vou querer estar entre as 40 no fim da temporada. Você sempre quer um pouquinho mais.
AE - Depois desta reação no circuito feminino, o que você precisa melhorar no seu tênis?
Teliana - Eu sou muito exigente, nunca estou satisfeita e me cobro muito. E isso é uma coisa que a gente vem trabalhando bastante, para que eu passe a me dar mais crédito. Quero melhorar tudo, mas tem algumas coisas que eu venho trabalhando bastante, que é o saque. Se eu for mais veloz e mais constante no saque, vou subir um degrau a mais. E para jogar num nível melhor, contra as 20 melhores, eu tenho que melhorar a velocidade de bola e o ritmo de jogo, que você vai adquirindo com os torneios.
AE - Como você vê o futuro do tênis feminino brasileiro?
Teliana - Acho inadmissível a gente ter só uma jogadora entre as 100 melhores. Seria muito medíocre da minha parte se eu ficasse feliz em ser a única no Top 100. Acho que o tênis feminino tem tudo para crescer, mas ainda precisa ser feito um trabalho de renovação. Falta para o Brasil um trabalho a longo prazo. Todo mundo só quer curto prazo. O patrocinador fala que vai te apoiar, mas amanhã você tem que ganhar Roland Garros. Isso não existe.