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As crianças são vítimas diretas e indiretas da violência, seja ela física ou psicológica. Em dias de operações policiais e tiroteios intensos, elas deixam de ir para a escola. Nos momentos de lazer, são alvos comuns das balas perdidas. Existem ainda os traumas gerados pela rotina de violência dentro e fora de casa.

Na semana em que é celebrado o Dia das Crianças, o Instituto Fogo Cruzado lança uma análise inédita a partir de sua base de dados. Ao todo, foram contabilizadas 165 crianças baleadas desde 2016, nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, do Recife e de Salvador. Entre as vítimas, 41 delas morreram e 124 ficaram feridas.

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Das 165 crianças baleadas, 119 delas foram atingidas no Grande Rio, entre 5 de julho de 2016 e 30 de setembro deste ano: 32 delas morreram e 87 ficaram feridas. Outras 42 foram atingidas no Grande Recife, entre 1º de abril de 2018 e 30 de setembro deste ano: oito morreram e 34 ficaram feridas. E quatro foram atingidas em Salvador e Região Metropolitana, entre 1º de julho e 30 de setembro deste ano: uma morreu e três ficaram feridas. Os recortes de tempo se referem ao início das operações do Fogo Cruzado em cada uma das três regiões metropolitanas.

As ações e operações policiais deixaram 51 crianças baleadas: duas em Salvador e RMS, duas no Grande Recife e 47 no Grande Rio. No dia 29 de março deste ano, a pequena Heloysa Gabrielle, de 4 anos, foi morta com um tiro no peito enquanto brincava no terraço de casa em Porto de Galinhas.

Ela foi baleada durante ação policial do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar no Ipojuca, município da Região Metropolitana do Recife. A operação jogou luz sobre a segurança pública em um dos maiores destinos turísticos do país.

Já as balas perdidas fizeram 109 crianças vítimas: duas em Salvador e RMS, 20 no Grande Recife e 87 no Grande Rio. Outras quatro crianças foram atingidas por disparos acidentais: uma no Grande Recife e três no Grande Rio. No dia 18 de agosto, o pequeno Davi Lucas da Silva Santos, de 10 anos, foi atingido por uma bala perdida enquanto brincava na rua, em Jauá, Camaçari, na Bahia.

Marcas e medo

A violência deixa marcas físicas e também psicológicas. Em 6 de maio do ano passado, um homem foi morto dentro do quarto de uma menina de 9 anos, no Jacarezinho, na zona norte do Rio de Janeiro, durante operação da Polícia Civil que deixou 28 mortos.

O impacto emocional foi tão grande que, por dias, ela não quis dormir em casa. Além dela, outras crianças que foram expostas à violência desde cedo têm problemas de insônia, ansiedade e medo e tem seu crescimento duramente afetado.

A violência tem outro impacto na vida das crianças que vai além de serem vítimas: são os casos em que as mães são as vítimas da violência. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o feminicídio deixou cerca de 2.300 órfãos no Brasil, em 2021. Afetando psicologicamente e economicamente crianças e jovens adultos, ao perderem suas mães, que muitas vezes eram chefes da família.

Da assessoria

Nos últimos quatro anos, cerca de 487 mulheres foram baleadas no Grande Recife. De acordo com o Instituto Fogo Cruzado, dentre as vítimas, 240 morreram e outras 247 ficaram feridas. Os dados apontam para uma média de 121 mulheres atingidas por armas de fogo por ano. 

A coordenadora regional do Instituto Fogo Cruzado em Pernambuco, Edna Jatobá, explica que embora as estatísticas mostrem que as mulheres são menos alvos de tiros do que os homens, elas são vítimas diretas e indiretas da violência armada, estando sujeitas ao risco de feminicídio, homicídio ou balas perdidas. 

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Por vezes, elas são baleadas e nem sequer sabem de onde o disparo partiu. “Quando não são alvos diretos dos tiros, como nos casos de feminicídio, ou de crimes de patrimônio, as mulheres se tornam vítimas muitas vezes por estarem acompanhadas dos alvos diretos, como companheiros, filhos, conhecidos”, afirma Jatobá.

Por meio de nota, o Fogo Cruzado lembra que a maior parte dos feminicídios no Brasil acontece por meio de armas de fogo, conforme constatou o Instituto Sou da Paz. “Elas estão sob risco: recentes medidas de ampliação de ofertas de armas e munições vêm facilitando o acesso da população a armamentos. Sem uma fiscalização séria por parte do governo federal, armas compradas para se defender acabam sendo usadas para atacar mulheres, em casos de ameaça e assassinatos”, diz o posicionamento.

Em maio do ano passado, Maria Mirelly Alves do Nascimento, de 27 anos, foi morta a tiros dentro de casa, no bairro de Campo Grande, na Zona Norte do Recife. Ela estava grávida de seis meses. De acordo com as investigações, o principal suspeito pelo crime é seu ex-companheiro, de 20 anos. 

O caso de Maria Mirelly não é exceção. De acordo com o Fogo Cruzado, nos últimos quatro anos, 48 mulheres foram baleadas em casos de feminicídios ou tentativas de feminicídio, das quais 37 morreram e 11 ficaram feridas. 

Assim, nem dentro de casa as mulheres estão seguras. Ao todo, 126 mulheres foram baleadas dentro de casa no Grande Recife, tendo 71 delas morrido e outras 55 ficado feridas.

A violência armada também atinge mulheres de todas as idades. Nos últimos quatro anos, 17 meninas com menos de 12 anos foram baleadas: quatro das crianças morreram e 13 ficaram feridas. O

Outras 41 adolescentes, com idades entre 12 e 17 anos, foram baleadas. Dentre elas, 18 morreram e 23 ficaram feridas. Além disso, 14 mulheres idosas (mais de 60 anos) foram atingidas por armas de fogo: quatro delas morreram e outras 10 ficaram feridas. 

SOBRE O FOGO CRUZADO

O Fogo Cruzado é um Instituto que usa tecnologia para produzir e divulgar dados abertos e colaborativos sobre violência armada, fortalecendo a democracia através da transformação social e da preservação da vida. 

Com uma metodologia própria e inovadora, o laboratório de dados da instituição produz mais de 20 indicadores inéditos sobre violência nas regiões metropolitanas do Rio, do Recife e, em breve, em mais cidades brasileiras.

Através de um aplicativo de celular, o Fogo Cruzado recebe e disponibiliza informações sobre tiroteios, checadas em tempo real, que estão no único banco de dados aberto sobre violência armada da América Latina, que pode ser acessado gratuitamente pela API do Instituto.

Duas mulheres assaltadas no Grajaú (zona norte do Rio) na noite desta quarta-feira, 13, estavam sendo levadas por policiais até uma unidade onde registrariam a ocorrência quando foram alvejadas dentro da viatura policial. Elas foram socorridas e não correm risco de morte.

Marina Matoso Rangel, de 18 anos, e Daniela do Nascimento Rodrigues, de 21, haviam sido assaltadas enquanto caminhavam pela Rua Grajaú, por volta das 21h30. Elas avisaram a Polícia Militar e um dos acusados pelo crime foi detido nas imediações. As vítimas e o preso foram levados em carros separados para a Cidade da Polícia, no Jacarezinho (zona norte), para registrar o flagrante.

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Quando a viatura onde estavam as vítimas passou pela favela do Jacarezinho, na Avenida Dom Helder Câmara, a caminho da Cidade da Polícia, criminosos atiraram em direção ao veículo. Feridas, as duas mulheres foram encaminhadas ao Hospital Federal de Bonsucesso, na mesma região.

Marina foi atingida nas nádegas, em um dedo e de raspão na cabeça. Ela está internada em observação. Daniela, atingida nas duas mãos, foi submetida a cirurgia e recebeu alta nesta quinta-feira, 14. A viatura que transportava o homem preso não foi atingida.

Duas meninas foram baleadas por policiais militares durante uma abordagem no Campo Limpo, na zona sul de São Paulo, na noite de quinta-feira. Uma garota de 14 anos foi atingida no nariz e deixou o Hospital Campo Limpo no mesmo dia, depois de ser medicada. Outra menor, de 11 anos, foi alvejada no olho e recebeu alta do Hospital das Clínicas na manhã desta sexta-feira.

Em depoimento prestado no 47º Distrito Policial (Capão Redondo), os policiais disseram que as garotas foram atingidas acidentalmente por balas de borracha, depois de uma perseguição na região do Jardim Mitsunani.

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Os PMs contaram que estavam fazendo uma patrulha no local quando avistaram dois homens com comportamento suspeito passando por uma viela, na Rua Manoel de Oliveira Martini. Um dos policiais foi à pé ao encontro da dupla, enquanto o outro fez o cerco com a viatura. Nesse momento, segundo os PMs, uma outra dupla se aproximou em uma moto Honda CG preta. Os homens estavam de capacete e capa de chuva e o garupa estaria segurando um objeto similar a uma arma.

Um dos PMs - não identificado - atirou para desarmá-lo e atingiu as garotas, que estavam do outro lado, na Rua Francisco Marins. Os homens fugiram e os policiais recolheram uma arma de brinquedo caída no chão. Não há informações sobre os suspeitos que estavam à pé.

Os policiais levaram as duas jovens ao Pronto Socorro Jardim Macedônia, de onde foram transferidas ao Hospital Campo Limpo. A jovem de 11 foi transferida ainda ao HC, onde ficou em observação. O caso foi registrado como lesão corporal.

Susto

Depois ouvir os disparos na rua, a mãe da garota de 11 anos disse que saiu de casa assustada e condenou a ação da polícia. "Eu não acreditei na cena que eu vi: as meninas baleadas, o policial com arma em punho pra mim como se eu fosse uma bandida", relatou a mãe. "Eu coloquei as mãos para cima, assustada, com medo de ser baleada também."

Segundo a garota de 11 anos, elas foram levadas sem os pais para o hospital. Dentro da viatura eu falava: cadê a minha mãe? Eu quero a minha mãe? Por que vocês machucaram a gente? O moço falou assim: cala a boca filha, isso aí foi só um tirinho de raspão", contou a garota.

A assessoria da Policia Militar foi procurada e não confirmou se as garotas foram levadas ao hospital sozinhas. Em nota oficial, a PM lamentou o ocorrido e disse que instaurou um inquérito para apurar os fatos. "Por motivos a esclarecer, um dos policiais efetuou disparos contra os ocupantes da moto e os estilhaços atingiram as duas crianças que estavam do outro lado da rua", disse o comunicado, que termina dizendo que "a instituição é legalista, não compactua com nenhum tipo de irregularidade e apura com rigor qualquer desvio de conduta eventualmente praticado por seus integrantes".

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