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Há dias, médicos, virologistas, infectologistas e epidemiologistas multiplicam mensagens no Twitter, informando a seus assinantes como acompanhá-los em outras plataformas, caso a rede social comprada pelo bilionário Elon Musk entre em colapso.

Após a aquisição no final de outubro, a empresa demitiu metade de seus 7.500 funcionários, levantando preocupações sobre a capacidade da rede de continuar operando. A imprevisibilidade do novo patrão também suscita receios de medidas que alterem a essência da plataforma.

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Desde o início da pandemia da Covid-19, muitos especialistas fizeram do Twitter uma ferramenta valiosa: para obter informações, compartilhar suas pesquisas, comunicar mensagens de saúde pública, ou até mesmo construir relações de trabalho com colegas.

A pandemia "foi realmente um ponto de virada no uso das mídias sociais como recurso para os pesquisadores", disse à AFP Jason Kindrachuk, virologista da Universidade de Manitoba, no Canadá.

Em janeiro de 2020, a Covid-19 começou a se espalhar pelo mundo. Estudos em todos os lugares buscavam entender como o vírus se espalhava e como se proteger contra ele. Pesquisas eram compartilhadas imediatamente no Twitter para responder à ansiedade dos profissionais de saúde e do público em geral.

Foi o advento dos "preprints", ou a primeira versão de um estudo científico, antes de ser revisado por pares e publicado em um periódico reconhecido.

"Em meio a uma pandemia, a capacidade de compartilhar informações rapidamente é essencial para a tradução e disseminação do conhecimento, e o Twitter pode fazer isso de uma forma que normalmente não é viável para livros, ou revistas especializadas", destacou o Canadian Journal of Emergency Medicine, em abril de 2020.

No Twitter, o processo de verificação dos resultados é feito quase simultaneamente, e os cientistas compartilham publicamente suas interpretações e críticas a cada novo estudo.

Isso, às vezes, pode ter um efeito perverso: certos trabalhos recebem atenção que não merecem, e não especialistas se expressam sobre temas fora de seu campo.

- Colaboração internacional -

Graças ao Twitter, muitos especialistas também começaram a trabalhar juntos remotamente.

"Existem pessoas com quem trabalho agora de relacionamentos que nasceram no Twitter. Pensar que isso pode mudar em um futuro próximo é uma fonte de preocupação", diz Jason Kindrachuk, especialista em ebola na África que tem 22 mil seguidores.

Além da pesquisa em si, a rede social também desempenha um papel importante em termos de comunicação com os políticos e o público em geral.

Quando a variante ômicron apareceu no final de 2021, "nossos colegas na África do Sul e em Botswana compartilharam essas informações publicamente via Twitter", aponta Kindrachuk, "permitindo que muitos países começassem a se preparar".

O impacto é ainda maior, porque o Twitter sempre foi muito frequentado por outro grupo de profissionais: os jornalistas.

"Como o Twitter é uma plataforma muito seguida por jornalistas, ajuda" a ampliar a mensagem, que provavelmente chegará à mídia tradicional, estima Celine Gounder, especialista em doenças infecciosas com 88.000 seguidores.

Preocupada com o futuro da rede de Musk, Gounder disse à AFP que transferiu uma discussão com uma dezena de colegas para o aplicativo de mensagens Signal, e que relançou suas publicações na rede profissional LinkedIn e na plataforma Post News.

Muitos especialistas estão compartilhando seu perfil no Mastodon, uma rede rival no Twitter, e outros, um link para suas postagens na plataforma Substack.

No caso de um problema com o Twitter, "vamos nos adaptar", garante Kindrachuk.

"Encontraremos outras plataformas de mídia social para fazer isso, mas levará tempo e, infelizmente, as doenças infecciosas não esperam que encontremos novos mecanismos de comunicação", completou.

Como explicar a doença inflamatória potencialmente vinculada à Covid-19 que afeta algumas crianças? Duas semanas após serem reportados os primeiros casos em alguns países, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a comunidade científica tentam entender a causa.

- Qual é a relação com a Covid-19?

A OMS anunciou nesta sexta-feira que estuda o possível vínculo e pediu a colaboração mundial para "entender melhor esta síndrome infantil".

Em um relatório divulgado hoje, o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC) classificou a nova doença de "síndrome inflamatória multissistêmica (que pode afetar todos os órgãos) temporariamente associada a uma infecção pelo Sars-CoV-2". A associação "ainda não foi estabelecida, mas é plausível", considerou o órgão.

Os casos ocorreram durante a epidemia do novo coronavírus e muitos dos pacientes testaram positivo para a Covid-19. A agência de saúde francesa, Santé Públique France, estima que a nova doença surja, "em média, quatro semanas após a infecção".

Cientistas trabalham com a hipótese de que as crianças afetadas sofram uma aceleração do sistema imunológico. "Elas tinham o vírus, o organismo o combateu. Mas agora há uma resposta imunológica diferida e excessiva", explicou à AFP o pediatra Sunil Sood, do centro médico infantil Cohen, localizado em Nova York.

Em geral, a grande maioria das crianças apresenta apenas os sintomas da Covid-19, ou mesmo nenhum sintoma.

- Quantos casos?

Na Europa, foram detectados cerca de 230 casos suspeitos da nova doença, segundo o ECDC, o qual assinalou que se trata de um mal raro e que as chances de uma criança ser afetada são muito pequenas.

Entre estes casos, houve duas mortes: uma no Reino Unido, de um adolescente de 14 anos, e outra na França, de um menino de 9 anos, anunciada hoje.

O caso fatal francês ocorreu em Marselha. A criança foi vítima de uma "afecção neurológica ligada a uma parada cardíaca", disse à AFP o médico que a atendeu, Fabrice Michel, do hospital de La Timone. Autoridades francesas reportaram 135 casos no país desde o começo de março.

Nos Estados Unidos, autoridades do estado de Nova York deram conta de três menores mortos e uma centena de casos. Também houve casos na Itália, Espanha e Alemanha, sem mortes.

- Quais são os sintomas?

Entre os sintomas, estão febre alta, dores abdominais, problemas digestivos, erupção cutânea, conjuntivite, língua avermelhada e inchada e problemas cardíacos. "Eles são uma mistura da doença de Kawasaki e da "síndrome do choque tóxico", segundo o ECDC.

A doença de Kawasaki afeta principalmente as crianças mais novas, com uma inflamação de seus vasos sanguíneos. Mas nos casos suspeitos de estarem relacionados à Covid-19, os problemas cardíacos e o caráter inflamatório são "mais marcados", segundo a agência sanitária francesa. Além disso, a doença pode afetar as crianças mais velhas, enquanto a doença de Kawasaki atinge essencialmente menores de 2 anos.

Um estudo italiano publicado na revista médica "The Lancet" aponta que o número de casos na região de Bérgamo se multiplicou por 30 desde o surgimento da epidemia atual, com 10 crianças de 7 anos em média diagnosticadas entre 18 de fevereiro e 20 de abril.

- Pista genética?

A causa da doença de Kawasaki é desconhecida, assim como a desta nova afecção, mas uma das hipóteses consideradas é a genética.

Na Inglaterra, seis dos oito primeiros casos observados foram de crianças negras de origem "afro-caribenha", segundo um estudo publicado na The Lancet. A criança que morreu na França era de origem africana, segundo seu médico.

Não foi reportado nenhum caso na Ásia, nem mesmo na China, onde a Covid-19 surgiu. Já a doença de Kawasaki afeta principalmente asiáticos.

A aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que limita o crescimento dos gastos públicos à taxa da inflação pelos próximos 20 anos, será "desastrosa" para o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil, segundo o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich. Pesquisadores temem que o resultado seja um congelamento do orçamento dedicado hoje ao setor, considerado extremamente baixo.

"Se continuarmos na situação atual por mais 20 anos será mortal; vamos voltar ao status de colônia extrativista", disse Davidovich à reportagem. "Na verdade, não digo nem 20 anos. Se for cinco, já será extremamente complicado."

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O orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (hoje chamado MCTIC, após fusão com a pasta das Comunicações) encolheu consideravelmente nos últimos anos. Em valores corrigidos pela inflação, é quase 30% menor do que dez anos atrás, e aproximadamente metade do que era em 2010. "Estamos partindo de um patamar muito baixo", diz Davidovich, físico da Universidade Federal do Rio (UFRJ). "Vamos ficar estacionados numa situação que já é muito ruim."

Aprovada com folga em primeira votação na Câmara do Deputados, no dia 10, a chamada PEC do Teto determina que os gastos do poder público federal só poderão crescer ao mesmo ritmo da inflação pelas próximas duas décadas - com possibilidade de alterações a partir dos primeiros dez anos.

"É um cenário trágico para a ciência", diz a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Helena Nader. Ela teme uma fuga em massa de cérebros para o exterior, caso a situação de perpetue dessa forma. "O que estamos dizendo para os nosso jovens cientistas é: se você tem condições de ir embora do Brasil, vá; porque aqui a ciência não é valorizada."

"Vamos voltar à realidade da década de 1990, quando a única saída para ciência, tecnologia e inovação no Brasil era o aeroporto", diz o bioquímico Jerson Lima da Silva, professor da UFRJ e diretor científico da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).

Segundo ele, o sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação vinha crescendo e funcionando bem desde o início dos anos 2000, até que os investimentos começaram a encolher em 2011. "O sistema só não entrou em falência total até agora porque tem uma certa inércia", avalia.

Flexibilidade

Segundo o MCTIC, a PEC 241 não representa um "congelamento" de investimentos, pois não impõe um limite máximo às despesas de nenhum setor em particular. Trata-se de um teto universal para todo o orçamento federal. Ou seja, o governo terá flexibilidade para distribuir recursos como achar melhor entre uma área e outra.

"Nada impede que o Poder Executivo ou o Poder Legislativo fixe despesas para a ciência acima do exercício anterior, desde que outras despesas sejam ajustadas para acomodar tal elevação ao limite total do conjunto de gastos", afirma a pasta.

As expectativas da comunidade científica com relação a isso, porém, são pouco otimistas, já que o setor tem tradicionalmente pouco peso político nas decisões de Brasília. "A PEC coloca uma série de incógnitas, mas dá para adivinhar o que vai acontecer", prevê Davidovich. "A competição por recursos será muito dura."

O orçamento do MCTIC este ano é de R$ 4,6 bilhões, dos quais cerca de R$ 500 milhões estão contingenciados (indisponíveis). O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) enviado pelo governo federal ao Congresso no início de setembro prevê um aumento da ordem de 20% nos recursos para ciência, tecnologia e inovação em 2017. Ainda assim, considerada a inflação deste ano, o valor continua sendo bem menor do que dez anos atrás.

"À medida que houver crescimento econômico, haverá crescimento do orçamento", disse o ministro do MCTIC, Gilberto Kassab, ao Estado. Ele garante que o governo está sensível às preocupações dos cientistas e à necessidade de aumentar investimentos no setor. "Sem a PEC 241 a preocupação seria muito maior. Com certeza a situação será melhor."

Recuperação

O PLOA 2017, segundo Kassab, já foi planejado prevendo a aprovação da PEC. "Iniciamos uma recuperação que pretendemos seja gradual e perene da verba destinada à área científica em anos anteriores. Acreditamos que esse objetivo poderá ser atingido nos próximos anos porque a PEC 241, além de controlar a crise fiscal, seguramente dará mais confiança à iniciativa privada e aos investidores", diz a pasta.

"Você acha que o mundo vai ficar esperando o Brasil? Vamos andar 20 anos para trás", diz Nader. Ela propõe que as áreas de Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação sejam isentas do teto imposto pela PEC, por serem estratégicas para o desenvolvimento do país.

A proposta ainda precisa passar por uma segunda votação na Câmara e pelo plenário do Senado.

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