O PSDB vai eleger, nesta sexta-feira (31), o seu novo presidente nacional e se tudo seguir como apontam as conversas de bastidores, o novo comandante do partido será o ex-deputado federal Bruno Araújo (PE). A incógnita maior, contudo, não é sobre quem vai liderar a sigla nos próximos anos, mas qual a linha política que seguirá, se mais alinhada ao centro-esquerda e a social-democracia - perfil de quando foi criado em 1988 - ou à direita - tendo como principal aliado o presidente Jair Bolsonaro (PSL), atual protagonista da extrema-direita no país.
Nos últimos tempos, o PSDB deixou de ser o terceiro maior partido com representação da Câmara, perdeu governos estaduais e a tradicional polarização eleitoral contra o PT nas disputas pela Presidência da República. Em 2018, o candidato do partido e ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, recebeu 5,9 milhões votos e ficou em quarto lugar na disputa. Foi o pior resultado de um postulante tucano ao cargo.
##RECOMENDA##Após isso, Alckmin, que seguiu presidente nacional, perdeu espaço e a liderança-mor interna para o governador de São Paulo, João Doria; que até pouco tempo era neófito na política, mas hoje já tem o nome ventilado como eventual candidato à Presidência em 2022.
Apesar da projeção eleitoral de muitos, Doria hoje é aliado de primeira hora de Jair Bolsonaro, vem comungando com algumas de suas posturas conservadoras, já avisou que pretende fazer uma "faxina ética" no PSDB e é quem chancela o nome de Bruno para capitanear o partido.
Entretanto, a visão Doria não é a única dentro do PSDB. A legenda, como já é sabido, tem nomes históricos, como o do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), do ex-senador José Serra, do deputado federal Aécio Neves e do senador Tasso Jereissati, além do próprio Alckmin. Uma estafe chamada recentemente de "cabeças brancas". Essa porção partidária concorda com a visão de reestruturação interna, após uma série de perdas, mas aparentemente não comunga com a adoção de traços baseados no bolsonarismo.
A saída da social-democracria
Na ótica do cientista político e professor do Instituto de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB), Frederico Bertholini, apesar da discordância da ‘velha guarda’ tucana, o que deve predominar é a estratégia de João Doria, apontado como um dos atores políticos que percebeu, antes até das eleições, que eles seriam derrotados nas urnas.
Segundo Bertholini, o resultado da eleição presidencial de 2018 levou o PSDB a “uma reflexão sobre o papel que tem no sistema político” e as novas lideranças tucanas que surgiram perceberam que a recuperação do protagonismo majoritário federal vai passar por uma readequação da linha ideológica da sigla.
“O PSDB viu na eleição do Bolsonaro um espaço para se redirecionar no espectro político e caminhar um pouco mais para direita, com uma ideia conservadora e uma agenda mais de valores conservadores. Tudo isso atrelado com algo que o PSL não tem, que são quadros. O PSDB sempre teve quadros com uma forte interlocução com a academia e com essa boa interlocução com políticos. O que passa uma ideia de menos demonização da política e mais compreensão de como governar”, observou.
Esse redirecionamento, contudo, pode fazer com que o partido perca parte do tucanato mais antigo. “É uma espécie de encruzilhada, ao mesmo tempo que as novas lideranças querem levar o partido mais para direita, existe uma outra força que pode complicar o jogo, pois talvez essa guinada faça com que o PSDB perca esses quadros que são o diferencial diante do PSL”, destacou.
Indagado se Fernando Henrique Cardoso e outras lideranças deixariam de ser protagonistas internos do PSDB, com a estratégia do governador de São Paulo, o cientista político disse que não tanto.
“É evidente que eles têm muito poder no partido, não vão perder completamente espaço, mas a tendência é que as novas lideranças levem o partido a ser aquilo que não exatamente reflete as ideias deles. E essas novas lideranças fazem isso percebendo que o espaço da social-democracia esteja ocupado por partidos que estão mais ligados com a esquerda”, salientou Frederico Bertholini.
Tomar o espaço de Bolsonaro
Para o professor da UnB, João Doria parte da premissa que o PSDB perdeu voto do campo social-democrata e quer aproveitar os que elegeram Bolsonaro por repudiar o PT.
“Essa estratégia acorda o PSDB para o seguinte quadro: tem um monte de eleitor que odeia o PT e outros que odeiam as ideias que o PT defende. Esses eleitores foram os que abraçaram Bolsonaro, que é um quadro visivelmente despreparado para as funções que exerce, então porque nós, um grupo preparado para governar, não podemos ocupar esse espaço”, argumentou o estudioso.
Dentro do PSDB, essa estratégia do governador de São Paulo é vista, como por exemplo pelo ex-presidente nacional Alberto Goldman, como uma tentativa de tomar conta do partido para disputar a Presidência em 2020. O cientista político vê como uma “sinalização importante para a sociedade”, mas o resultado disso também pode se dar na retomada de espaço no Legislativo federal.
*Foto dentro da matéria: Clauber Cleber Caetano/PR