Tópicos | Márcia Cavallari

Com a experiência de ter presidido por dez anos o Ibope Inteligência e agora à frente do Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec), a estatística Márcia Cavallari vê com preocupação a possibilidade de a Câmara dos Deputados incluir no projeto que revisa a legislação eleitoral o veto à divulgação de levantamentos de intenção de voto na véspera das eleições e a exigência de uma espécie de "taxa de acerto" de empresas do setor.

"Entendemos que proibir a publicação de uma pesquisa é cercear informação ao eleitor. Além disso, sem uma divulgação oficial pelos veículos, abre-se espaço para circulação de boatos e fake news nas redes sociais e contas de WhatsApp. Se isso realmente acontecer, certamente circularão informações que ninguém saberá de onde saíram", afirma. Leia os principais trechos da entrevista:

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Qual o impacto de se vetar a publicação de pesquisas na véspera das eleições?

Em primeiro lugar, é preciso entender que nenhuma pesquisa tem a intenção de adivinhar o resultado da eleição. A intenção é a de se fazer um diagnóstico. Já sabemos que no Brasil os eleitores definem seu voto mais tarde. Quanto mais próximo se faz uma pesquisa da data da eleição melhor é para o eleitor, que pode ou não usar aquele resultado para sua tomada de decisão sem ser tutelado por ninguém. Entendemos que proibir a publicação de uma pesquisa é cercear informação ao eleitor. Além disso, sem uma divulgação oficial pelos veículos, abre-se espaço para circulação de boatos e fake news nas redes sociais e contas de WhatsApp. Se isso realmente acontecer, certamente circularão informações que ninguém saberá de onde saíram.

A proposta prevê o veto à divulgação de pesquisas com menos de 48 horas da eleição. Um dia de diferença altera de forma significativa o resultado?

Há sim uma diferença justamente porque o eleitor define seu voto na última hora. E, geralmente, os últimos debates entre os candidatos ocorrem na quinta ou sexta-feira antes da eleição. Divulgando a pesquisa no sábado (véspera) já não conseguimos pegar todas as últimas movimentações e discussões geradas pelos debates. Com um dia a menos, essa chance é ainda mais reduzida.

Por que a mudança na lei pode ampliar o risco de pesquisas informais e fake news relacionadas a intenção de voto?

Porque não teremos as pesquisas oficiais, regulamentadas, na véspera. E, sem o teor da lei, sem metodologia, sem saber quem foi o contratante, quem pagou pelo levantamento, não haverá transparência no processo. As pesquisas oficiais feitas pelos institutos ainda podem ser auditadas, se for o caso. O eleitor tem o direito de ter informação oficial e decidir o que fazer com ela.

A resistência dos políticos a pesquisas eleitorais não é nova. Mas o que explica esse comportamento?

Discute-se há muito tempo proibir pesquisas. O Supremo já até considerou inconstitucional uma mudança legal feita em 1997. Naquela época, a intenção era vetar a publicação de levantamentos 15 dias antes das eleições. Acho que o que está por trás desse movimento é a crença equivocada de que as pessoas votam de acordo com as pesquisas. Mas quantas vezes vimos viradas na última hora? Candidatos que crescem na reta final? Se as pesquisas tivessem esse poder acertariam todas as vezes e não é isso que a gente vê. Elas não representam uma influência maligna como se quer passar. São só mais uma fonte de informação a ser usada pelo eleitor.

Há outro ponto polêmico em discussão na Câmara: a previsão de se exigir dos institutos uma espécie de "taxa de acerto". É possível calcular isso?

Nem sei o que seria isso. Seria acertar quem ganhou nas últimas eleições, quem foi para o segundo turno? Ou mostrar o resultado exato? É uma proposta muito vaga, sem qualquer critério. Não faz nenhum sentido técnico. Por exemplo: teríamos de misturar acertos de eleições municipais, de alcance nacional? A questão é que não se deve falar em acerto. Não é esse o papel dos institutos. Uma pesquisa não tem o papel de acertar. Ela não é feita para isso, não visa prever o futuro, mas traçar um retrato de determinado período. A partir de sua sequência, uma tendência pode ser ou não confirmada.

Os institutos pretendem questionar essas sugestões?

A Abep (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisas) já está contra-argumentando e preparando uma nota técnica para enviar aos parlamentares e ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A entidade considerou alguma mudança proposta positiva?

Sim, três mudanças pleiteadas pelos institutos: reduzir o prazo para registro de início das pesquisas de cinco para três dias, vetar que institutos façam pesquisas com recursos próprios e possibilitar a publicação dos resultados no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os demais temas nem foram colocados para o debate.

Para a diretora executiva do Ibope Inteligência, Marcia Cavallari, responsável pelas pesquisas de opinião que indicam as chances de êxito de cada candidato, a probabilidade de uma vitória de Jair Bolsonaro (PSL) no primeiro turno é muito pequena, apesar de ele ter crescido no mais recente levantamento do instituto.

Na pesquisa divulgada na segunda-feira, dia 1º, Bolsonaro apareceu com 31% das intenções de voto, quatro pontos a mais do que tinha cinco dias antes.

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Quais as chances de uma eventual vitória de Bolsonaro já no primeiro turno?

Essa possibilidade existe. Mas é uma probabilidade muito pequena. Bolsonaro tem 38% de votos válidos, segundo nossa pesquisa mais recente. Ele teria de crescer 12 pontos porcentuais até o dia da eleição, já que precisaria de 50% mais um. E não estamos vendo movimentação, pelo menos até a pesquisa de segunda-feira, de perda de votos dos demais candidatos. Isso reduz o espaço para crescer 12 pontos nessa semana. Se outros candidatos estivessem em curva descendente, o Ciro, o Alckmin, o próprio Haddad… Mas não é o que estamos vendo. Ciro está estável com 11% há muito tempo, Alckmin oscila em torno de 8% há muito tempo.

Haveria espaço para movimentação entre os eleitores não convictos?

Na pesquisa espontânea, ainda há um terço dos eleitores que não cita nenhum nome. Há 19% de indecisos e mais 14% que votam branco e nulo. Esses 33%, ao longo dessa última semana, podem tomar decisões diferenciadas, o que deixa a eleição ainda aberta.

De onde vieram os novos eleitores de Bolsonaro?

O que está diminuindo é a quantidade de eleitores indecisos. Esse crescimento do Bolsonaro vem muito daí. Gente que está votando branco e nulo pode ir para ele. A possibilidade de vitória no primeiro turno não é zero. Ela existe. Mas, com o resultado da pesquisa de ontem, essa probabilidade é pequena, porque o movimento teria de ser muito rápido e significativo. Para crescer 12 pontos, ele teria de tirar dos demais candidatos ou reduzir branco e nulo.

Há quem veja a possibilidade de haver no quadro nacional uma repetição do que aconteceu com João Doria, que em 2016 surpreendeu ao vencer a Prefeitura de São Paulo já no primeiro turno.

Essas movimentações mais rápidas em um município são mais fáceis de ocorrer que em um país com as dimensões do Brasil. Em um município há um universo pequeno, que se movimenta rápido. O Brasil inteiro se movimentar nessa velocidade? Pode acontecer, mas é mais difícil.

Há uma diferença grande de intenção de votos em Bolsonaro entre quem acessa a internet e quem não acessa.

Há uma clivagem social forte. Eleitores com nível de escolaridade mais alta votam em maior proporção em Bolsonaro, assim como os eleitores com renda mais alta. São perfis antagônicos nessa polarização entre Bolsonaro e Haddad. Essa questão de acesso à internet está ligada a isso. O eleitor do Bolsonaro tem também uma militância espontânea nas redes sociais, é mais jovem, é muito mais ativo na internet.

Voltaremos a ter uma divisão geográfica na votação?

Sim, mas será diferente da divisão que ocorria nas disputas entre PT e PSDB. Antigamente tínhamos uma divisão geográfica mais acentuada. Agora Bolsonaro lidera em todas as regiões, exceto no Nordeste.

Por que Marina está em queda desde o início da campanha?

Isso também aconteceu com ela na eleição de 2014, quando entrou como candidata, substituindo Eduardo Campos. Ela entrou bem forte, quase alcançando Dilma Rousseff, e depois, ao longo da campanha, foi caindo. Na eleição de agora ela está em uma situação mais complicada ainda em termos de estrutura de campanha, de quantidade de deputados, estrutura partidária. O nome dela tinha um recall, mas, à medida que a campanha foi avançando, ela não conseguiu segurar aquele eleitorado, seja pela questão da polarização que se apresenta na eleição, seja por outros motivos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

O quadro eleitoral, que mostra a presidente Dilma Rousseff (PT) na liderança no primeiro turno com 38% das intenções, seguida por Marina Silva (PSB), com 29%, está bem definido, embora continue em movimento. A avaliação é da diretora-executiva do Ibope Inteligência, Márcia Cavallari, em entrevista exclusiva ao Broadcast ao Vivo. Ela acredita que Marina pode manter o recente movimento de queda lenta e consistente, diminuindo a distância em relação a Aécio Neves (PSDB), que havia subido de 15% para 19% e manteve o mesmo patamar na última pesquisa, mas isso não deve ameaçar a ida da ex-ministra ao segundo turno. Já Dilma tem oscilado na faixa atual, entre 35% a 38% das intenções de voto.

Márcia ressaltou, porém, que qualquer novo episódio na campanha presidencial pode ter um efeito rápido nas intenções de voto e lembrou que o eleitor costuma consolidar sua escolha na última semana antes do comparecimento às urnas. A diretora do Ibope vê um segundo turno bastante apertado entre Dilma e Marina e diz que o cenário está totalmente aberto para a vitória de qualquer uma das duas. Segundo ela, o desejo de mudança do eleitor visto atualmente só foi maior na eleição de 2002, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceu o candidato da situação, José Serra (PSDB).

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Em relação às pesquisas clone, contratadas na tentativa de antecipar os resultados dos levantamentos registrados no Tribunal Superior Eleitoral, Márcia disse que não sabe como essas sondagens são realizadas, qual a metodologia usada e a quem elas convêm. "Não sei o quanto as pesquisas clone têm o tipo de rigor que nós temos, mas estão se prestando bem ao papel de especulação do mercado".

A diretora falou sobre os cuidados para garantir a segurança dos resultados das pesquisas feitas pelo Ibope. Segundo ela, os números só são consolidados em um único local e geralmente 2 horas antes de sua divulgação. Sobre as disputas para os governos estaduais, Márcia explica que muitos governos estão desgastados, com avaliações inferiores ao observado no pleito de 2010. "É uma eleição de mais renovação".

Olhando para os possíveis resultados nos Estados e no Congresso, Marcia avalia que o PT, que vinha crescendo, pode diminuir em número de governadores e deputados eleitos. O PSB também era uma legenda em ascensão e tem probabilidade alta de ganhar representatividade. O PMDB sempre foi um partido forte para compor a Câmara e tem muitas coligações regionais que devem garantir um espaço significativo na política. O PSDB, que não vinha de uma tendência de crescimento, dependerá do desempenho dos governadores para fazer com que mais deputados sejam eleitos.

A análise do cenário político estabelecida no texto é de responsabilidade de seu autor, o economista Maurício Costa Romão

 

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Os principais institutos de pesquisas de intenção de votos conseguem prognosticar acertadamente, dentro da margem de erro, cerca de 95% dos resultados nas eleições majoritárias do país. Este ano não foi diferente.

Entretanto, algumas estimativas incorretas no primeiro turno desta eleição, principalmente em Salvador, Teresina, Manaus e Curitiba, empanaram o brilho do desempenho global, arranhando ainda mais a já negativa imagem que se tem das pesquisas. 

O Ibope e o Datafolha tributam essa ausência de acuracidade nesses casos atípicos a um fenômeno que se tem detectado recentemente nas eleições brasileiras: uma paulatina mudança de comportamento do eleitorado, que cada vez mais posterga sua decisão de voto para a reta final das eleições. 

No pleito de São Paulo este ano o Datafolha detectou que 23% dos eleitores deixaram para definir seus votos nos dois últimos dias. Em Salvador, na pesquisa de véspera do Ibope, 34% não tinham candidato declarado na pergunta espontânea.

No Recife, o Datafolha identificou nos dias 2 e 3 de outubro (segunda e terça-feira) que na pergunta espontânea 30% dos eleitores ainda não tinham candidato definido e no sábado, dia 6, quase um quarto (23%) ainda não sabia em quem ia votar.

Segundo Márcia Cavallari, do Ibope, ”neste ano, em metade das capitais, a quantidade de eleitores que não citam candidatos na pergunta espontânea (se declaram indecisos ou que votarão em branco ou nulo) é 34% maior do que nas eleições de 2008”. 

Isso significa que uma grande parte dos eleitores brasileiros perpassa toda a campanha apenas observando a movimentação político-eleitoral, coletando informações, analisando desempenhos, mas guardando sua decisão de voto para os últimos dias. Se por acaso, em determinado momento, alguns eleitores desse conjunto declararam voto nas pesquisas, o fizeram para não parecerem desinformados, alienados, porém esses votos podem mudar na cabine de votação. 

Qual a implicação desse fenômeno para a pesquisa eleitoral? 

Bem, a pesquisa eleitoral continuará sendo o que é próprio delas: importante ferramenta estatística de predição, que aponta tendências a partir de levantamentos sucessivos. Mas, agora, enfrentando um desafio adicional: o aumento do já elevado grau de volatilidade do eleitorado ou, simplificadamente, “a volatilidade do voto”.  

De fato, como lidar com uma situação em que, por exemplo, 20% dos eleitores não declararam candidato na pesquisa de antevéspera ou de véspera do pleito? Só se vai saber a destinação desses 20% de votos depois dos eleitores pressionarem a tecla “confirma”. Antes disso, mistério total.

Aí pode acontecer como no primeiro turno deste ano em Teresina. Na antevéspera da votação, o Ibope apontou o candidato à reeleição, prefeito Elmano Férrer (PTB), oito pontos de percentagem à frente do segundo colocado, ex-prefeito Firmino Filho (PSDB). Abertas as urnas, o tucano é quem ficou cinco pontos acima do oponente petebista.

Este exemplo é paradigmático porque mostra que a volatilidade do voto pode levar a um tríplice erro das pesquisas: errar o nome do vencedor, errar a ordem de colocação dos candidatos e fazer estimativas fora da margem de erro. O primeiro erro, “pecado mortal” em pesquisa, é muito raro de acontecer ou, pelo menos, era, antes do advento da volatilidade.

O corolário dessa nova dinâmica eleitoral é que os institutos de pesquisa, que hoje não possuem ferramentas nem velocidade para lidar com esse grau de imprevisibilidade, terão que se adequar minimamente à nova configuração comportamental do eleitor, sob pena de não o fazendo, ver diminuir sua capacidade preditiva e, por via de consequência, sua importância para decisões estratégicas.

Por fim, face ao novo modus agendi do eleitor, urge que os cientistas sociais e políticos se debrucem sobre as causas que o têm motivado a postergar sua decisão de voto para os estertores do pleito. 

 

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