O advogado criminalista Nythalmar Dias Ferreira Filho fechou um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR) no qual acusa o juiz Marcelo Bretas, principal responsável pelos processos da Lava-Jato na 7° Vara Federal no Rio de Janeiro, de negociar penas, combinar suas ações com o Ministério Público e orientar advogados de acusação. A denúncia foi publicada na edição desta sexta-feira (4) da revista Veja.
De acordo com a reportagem, a história começa em outubro do ano passado, quando Nythalmar Ferreira, que atuava desde 2016 na Vara comandada por Marcelo Bretas, no Rio de Janeiro, telefonou para o Supremo Tribunal Federal (STF), na intenção de marcar uma audiência com o ministro Gilmar Mendes. Assustado, o criminalista, que afirmava sofrer perseguição e queria consultar o ministro sobre a possibilidade de obter um acordo de colaboração, tinha sido alvo de mandados de busca e teve celulares apreendidos pela Polícia Federal.
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Inicialmente, os contatos de Nythamar foram ignorados, contudo, o advogado persistiu no contato com as autoridades, afirmando ter provas, inclusive áudios de conversas com Marcelo Bretas, sobre graves ilegalidades cometidas no braço fluminense da operação Lava-Jato. No acordo de delação, o advogado revela detalhes de como funcionava a sua relação com o juiz, confessando, ainda, que de admirador de pautas lava-jatistas, passou a presenciar pressões para que réus confessassem crimes em troca de penas mais brandas.
Negociação de penas
Para provar a veracidade dos fatos, o advogado teria apresentado uma gravação na qual Bretas garante que vai "aliviar" acusações contra o empresário Fernando Cavendish, delator e que também chegou a ser preso pela Lava-Jato no Rio de Janeiro.
A revista transcreve o áudio, na qual Bretas afirma: "Você pode falar que conversei com ele, com o Leo, que fizemos uma videoconferência lá, e o procurador me garantiu que aqui mantém o interesse, aqui não vai embarreirar", diz, na gravação. "E aí deixa comigo também que eu vou aliviar. Não vou botar 43 anos no cara. Cara tá assustado com os 43 anos", garante, em outro trecho do diálogo.
Leo seria o procurador Leonardo Cardoso de Freitas, então coordenador da operação no Rio de Janeiro. Os "43 anos" se referem à decisão de Bretas, que condenou o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, a 43 anos de prisão logo no início da Lava-Jato, em 2016, fato que teria gerado temor generalizado entre os réus.
Acordos com o Ministério Público
Segundo o delator, outra situação que comprova este comportamento impróprio tem relação com a mediação do juiz Bretas no acordo informal firmado com o ex-governador Sérgio Cabral, em que a moeda de troca seria poupar a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo das investigações sobre corrupção. No acordo de colaboração, Nythalmar detalha que, por volta de maio de 2018, a pedido do filho de Cabral, procurou Bretas com a proposta de livrar Adriana. O juiz concordou, e ajustou os detalhes com o procurador Eduardo El Hage, então chefe da Lava-Jato no estado, e deu ordens para que Cabral e Adriana redigissem uma carta, de próprio punho, “abrindo mão de todo o patrimônio”.
Preso em Bangu 8, Sérgio Cabral passou a confessar seus crimes a Bretas em junho de 2018. Em agosto do mesmo ano, o magistrado revogou a prisão domiciliar de Adriana Ancelmo e autorizou que ela respondesse às acusações em liberdade. O delator informou também que tem guardada uma gravação que “demonstra a participação, ciência e aquiescência de acordo similar” ao do ex-governador.
Interferência nas eleições do Rio de Janeiro
Sob o título de “interferências nas eleições de 2018”, um dos capítulos da colaboração premiada do advogado, de acordo com a revista Veja, acusa Bretas de ter atuado para influenciar o resultado das eleições em que o ex-governador Wilson Witzel (PSC), afastado do cargo após um processo de impeachment, saiu vencedor. Punido recentemente pelo Tribunal Regional da 2° Região (TRF2) por ter participado de atos políticos ao lado do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), Bretas não esconde sua proximidade com detentores de mandatos eletivos.
Durante as eleições ao governo do estado do Rio de Janeiro, em 2018, Nythamar afirma que, às vésperas do primeiro turno da disputa, Bretas teria vazado o depoimento de um ex-assessor de Eduardo Paes (PSD), então líder nas pesquisas de intenção de voto, acusando o candidato de envolvimento em fraude de licitações e recebimento de propina. O delator afirma ainda que ouviu, do próprio juiz, a revelação de que ele nutria antipatia pelo ex-prefeito, e que “foi importante para a população fluminense saber quem era Eduardo Paes antes da eleição”.
Seguindo a mesma toada, o advogado esmiuçou um outro acordo, firmado no segundo turno das eleições, quando Paes, em busca de “trégua”, teria se comprometido, caso eleito, a nomear uma irmã de Bretas para uma secretaria no futuro governo. Segundo Nythamar, após ser derrotado por Witzel, Eduardo Paes fez um acordo informal com o magistrado, por meio de um advogado de sua campanha, garantindo que abandonaria a política “em troca de não ser perseguido”. Concomitantemente, Wilson Witzel nomeou Marcilene Cristina Bretas, irmã do juiz Marcelo Bretas, para um cargo na Controladoria-Geral do Estado.
Para a Veja, o juiz Marcelo Bretas afirmou não conhecer o teor da delação feita por Nythalmar, mas disse que não há irregularidades no trabalho da 7° Vara e negou as acusações de que atuaria com parcialidade na condução da Lava-Jato carioca. “Já há algum tempo querem achar alguma coisa para indicar (contra mim), mas vamos esperar que alguém demonstre alguma coisa, porque falar realmente é muito fácil”, disse, em resposta à Revista.