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A possibilidade de o país flexibilizar o estado de emergência sanitária foi o assunto de uma reunião entre o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD – MG) e o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, nesta terça-feira (15). “Diante da sinalização, manifestei ao ministro preocupação com a nova onda do vírus, vista nos últimos dias na China. Mas me comprometi a levar a discussão aos líderes do Senado”, publicou o presidente do Senado em sua rede social.

Queiroga, que na semana passada, encontrou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) para tratar do mesmo assunto, também deve se reunir com o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, sobre o tema.

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Balanço

Segundo dados da da última sexta-feira (11), divulgados pela pasta, 91% da população brasileira acima de 12 anos já tomou a primeira dose da vacina contra a Covid-19. Desse total, 84,38% completou o esquema vacinal e apenas 36,48% das pessoas acima de 18 anos receberam a dose de reforço. Nas últimas semanas, alguns municípios e estados revogaram o uso de máscara em ambientes abertos e fechados. Desde o início da pandemia, em março de 2020, o país já registrou 656 mil mortes para o novo coronavírus e aproximadamente 29,4 milhões de infectados.

Com a desaceleração da variante Ômicron e a queda no número de casos de covid-19, o Ministério da Saúde confirmou nesta quinta-feira, 3, que estuda rebaixar o status da doença no Brasil de pandemia para endemia. Grande parte dos especialistas vê como precoce a intenção do governo brasileiro de reclassificar a pandemia neste momento.

Recentemente, Reino Unido, França e outras nações da Europa anunciaram que, por conta da melhora nos indicadores, mudariam a classificação da covid para endemia. Na América do Sul, onde o impacto da Ômicron chegou de forma mais tardia e o pico de casos foi mais recente, também já há discussões em países nesse sentido.

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A Organização Mundial da Saúde (OMS), que é a responsável por decretar que a pandemia teria chegado ao fim do ponto de vista global, ainda não sinalizou mudança na forma de tratar a doença.

Um dos motivos, apontam especialistas, é que enquanto a vacinação avançou de forma rápida em países desenvolvidos, o que os motivou a alterar a classificação da covid, em parte dos países africanos, por exemplo, os índices de cobertura vacinal ficam próximos a 4%. Com a desigualdade ainda latente, menos de 60% da população mundial está vacinada com dose única ou duas doses contra o coronavírus, apontam dados da plataforma Our World in Data, ligada à Universidade de Oxford (Reino Unido).

Na prática, uma doença se torna uma pandemia quando atinge vários continentes de forma intensa. Quando uma enfermidade é classificada dessa forma, países adotam uma série de medidas específicas para combatê-la, como ocorreu a partir de 2020.

A endemia, por sua vez, seria uma doença que, embora tenha frequência acima do esperado em determinada região, convive com a população de forma contínua. Ao classificar a covid dessa maneira, um governo indica que tem meios suficientes para controlar a doença e abre brecha para eliminar uma série de medidas restritivas, como uso de máscaras, por exemplo.

Especialistas apontam que, para além do quesito prático, que pode variar bastante, há efeito simbólico ao rebaixar os status da doença.

"Endemia não é algo que está fora de controle, que está sobrecarregando o sistema de saúde, que está resultando em ondas. É algo mais estável, que se sabe que tem uma maneira de gerenciar", explica a vice-presidente do Instituto Sabin, Denise Garrett.

Segundo ela, a longo prazo, já se previa que o caminho do coronavírus seria se tornar endêmico, uma vez que foram desenvolvidas vacinas específicas para combatê-lo e remédios, como anticorpos monoclonais e antivirais.

"Em vários aspectos, a gente está caminhando para essa direção de endemia. Mas, quando se decreta precocemente, o que se tem - além das medidas que se toma numa pandemia, e não se toma numa endemia - é um fator mental", destaca a epidemiologista. Ela entende que naturalmente existem países que controlaram a pandemia de uma melhor forma e que vão atingir um nível endêmico mais cedo.

A questão, reforça, é que para isso precisam ser adotados parâmetros claros para promover a mudança na classificação da covid do ponto de vista local.

"Hoje, abandonar o uso de máscara em ambiente aberto, por exemplo, é justificável, mas não é, ao meu ver, o momento de abandonar em ambiente fechado. É uma evolução: o que é certo hoje não é certo daqui um mês", diz Denise. "A gente precisa de uma estabilidade antes de tomar essas medidas."

Para o pesquisador da Fiocruz Julio Croda, enquanto a OMS é a responsável por definir a situação pandêmica de um nível global, e faz isso com métodos específicos, cada país acaba trabalhando os indicadores de maneira diferente.

"Os Estados Unidos, por exemplo, introduziram a métrica de hospitalização por 100 mil habitantes, dividiram o país todo nas diferentes regiões de saúde", diz.

É com base em métricas como essa que, reforça, locais como Reino Unido e França têm mudado a situação para endemia.

"Eles não estão decretando o fim da pandemia, e nem que a doença é endêmica. É apenas uma reclassificação local, dentro daquele contexto", explica Croda. "Falta no Brasil um planejamento em relação a uma transição adequada. O Ministério da Saúde nunca trabalhou com indicadores, nem sequer para medidas restritivas. No fim das contas, cada Estado adota as medidas de forma independente."

Nesse contexto, Croda aponta que seria importante estabelecer no País quais seriam os indicadores que demonstrariam uma endemicidade baixa, média e alta. Até porque, reforça, um local com as dimensões do Brasil fica bastante suscetível a distorções territoriais.

"Não se pode falar globalmente no Brasil, existem diferenças regionais de cobertura, número de casos, óbitos e positividade", diz. "A gente quer decretar o fim da pandemia por decreto, sem o planejamento necessário."

Do ponto de vista global, a epidemiologista da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Ethel Maciel aponta que o mundo ainda está muito longe de ter diminuição efetiva de transmissão, adoecimento e óbito. Ela reforça que enquanto alguns países já estão aplicando a 4ª dose em larga escala, como Israel, alguns ainda sequer avançaram o esquema primário. Na Nigéria, apenas 3,8% da população recebeu duas doses ou dose única.

Além de deixar parte da população mundial desguarnecida, as diferenças na imunização abrem brechas para o surgimento de mais variantes de preocupação, o que seria ainda um outro entrave para que a covid deixe de ser classificada como pandemia. Segundo Ethel, o mundo precisaria de avanço da vacinação para acima de 80% e ter controle melhor da pandemia antes de classificar a covid como endemia. "Ainda estamos cercados de incertezas", diz ela, que destaca a importância de acompanhar o desempenho das vacinas contra as novas cepas e de incorporar remédios para tratamento.

Do ponto de vista da classificação local da covid, Ethel ressalta que o ideal seria que os países seguissem com a finalização dos decretos nacionais de pandemia, passando para endemia, somente depois que a OMS fizesse isso.

"Mas desde o início estamos vendo os países agindo de forma independente, um grande embate entre as orientações da OMS e a operacionalização nos países", diz a epidemiologista. "Inclusive a própria iniciativa Covax (consórcio liderado pela OMS para compra e distribuição de imunizantes para nações mais pobres) foi por água abaixo praticamente porque os países foram comprando suas doses, muito mais doses que a população", diz.

"Não há consenso hoje no mundo de quantas mortes a gente pode aceitar de covid (para rebaixar o status para endemia)", diz Ethel. "Conceitualmente, a endemia é quando a gente tem um número de casos e de óbitos menor, ou constante, em um período de tempo e naquele local, comparado com o período anterior. São esses parâmetros que a gente precisa estabelecer."

Enquanto isso não for feito no País, reforça a pesquisadora, seria "prematura" qualquer movimento de reclassificação da doença em território nacional.

"A gente não tem nem como falar isso com mais de 700, 800 pessoas morrendo por dia", aponta a pesquisadora.

Ela destaca que é importante reduzir o número de óbitos, avançar ainda mais a cobertura vacinal, que hoje está pouco acima de 70% para duas doses ou dose única, e aumentar a aplicação de doses de reforço.

Nas redes sociais, Nésio Fernandes, secretário da Saúde do Espírito Santo e vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), reforçou que o decreto 7.616/2011 prevê condições e um rito administrativo para a declaração de uma emergência de saúde pública.

"Para sua revogação devem estar cessadas as condições que o motivaram", escreveu. "Hoje (quinta) temos 512 óbitos e 51.039 casos na média móvel de 7 dias, esses são os indicadores de 'endemia' de óbitos e casos esperados para o território brasileiro?"

Um dia após o Brasil atingir 650 mil mortes pelo novo coronavírus, e sem realizar qualquer comentário sobre o número, o presidente Jair Bolsonaro (PL) publicou nas redes sociais nesta quinta-feira (3) que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, estuda rebaixar para endemia o contágio da Covid-19 no Brasil. Até o momento, a Organização Mundial da Saúde (OMS), que concentra os esforços globais para combater a doença, ainda não rebaixou o status da Covid-19 de pandemia para endemia.

"Em virtude da melhora do cenário epidemiológico e de acordo com o parágrafo 2º do Art. 1º da Lei 13.979/2020, o @minsaude , @mqueiroga2 , estuda rebaixar para endemia a atual situação da Covid-19 no Brasil", publicou o presidente, em foto ao lado de Queiroga.

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O artigo de lei citado diz que o ministro da Saúde é o responsável por dispor sobre a situação da emergência de saúde. O Brasil registrou ontem 335 novas mortes pela Covid-19 e anotou 650.052 óbitos desde o começo da pandemia, segundo dados do consórcio de veículos de imprensa.

Uma pergunta que ressurge entre os brasileiros a cada nova notícia e novo dado divulgado é: quando a pandemia vai acabar? O que antes era uma questão muito distante, hoje já é uma possibilidade mais próxima, de acordo com especialistas no assunto. Apesar da pandemia ser um problema global, cada país conta com suas particularidades e, no caso do Brasil, problemas de comunicação e atraso na vacinação fizeram com que o cenário se agravasse e persistisse por mais tempo. 

No entanto, a tendência mundial também deve ser seguida por aqui: a força do coronavírus está prestes a trocar de nomenclatura, é o que explica a doutora Sandra Gomes de Barros, infectologista e professora do curso de medicina da Universidade Santo Amaro (Unisa), entrevistada pelo LeiaJá para tratar do assunto. De acordo com a especialista, o Brasil deixará a pandemia e entrará em um quadro endêmico, mas isso não significa que o vírus sairá de circulação. 

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“Acreditamos que estamos caminhando para o fim da pandemia. Vamos entrar numa fase endêmica e com certeza vamos ter aí períodos sazonais epidêmicos. Igualmente como já acontece com a gripe e com a dengue. Nós vamos passar de pandemia para uma endemia. Isso não vai significar que a gente está numa situação de fim totalmente da doença. Vamos ter situações em que o vírus vai acontecer, causar doença, fazer novas internações e poderemos ter óbitos. Não é um impacto em termos de hospitalização e óbito; ainda vai acontecer, mas será muito menor e acreditamos que não deverá ter, a curto prazo, necessidade de medidas tão radicais como a gente passou nesses últimos dois anos”, afirma Barros, que enxerga também uma flexibilização gradual das medidas protetivas individuais. 

Neste sábado, 26 de fevereiro, a pandemia completa exatos dois anos no Brasil. O primeiro caso foi identificado em São Paulo, em um homem de 61 anos, em 26 de fevereiro de 2020. De lá para cá, 648.160 brasileiros perderam suas vidas para Covid-19, enquanto 28.670.024 casos foram confirmados, entre recuperados e em observação. Por outro lado, os recuperados foram maioria: 25.994.566, de acordo com o Ministério da Saúde. A vacinação foi crucial para que esse número de casos revertidos crescesse com os meses e refletisse na queda do número de mortos. 

“Já está se estudando essa cobertura vacinal [periódica] mas também irá depender muito de cada região, da letalidade do vírus em cada região e da dinâmica da transmissão que está ocorrendo em vários estados”, complementa a infectologista.  

Hoje, o Brasil tem 86,09% (172.315.519) da população vacinável (cinco anos de idade ou mais) parcialmente vacinada. Ou seja, pessoas que receberam, ao menos, uma dose de imunobiológico. Até o momento, três doses estão disponíveis à toda a população, ou duas, no caso de quem toma a dose única da Janssen somada à dose de reforço 

“A gente sabe que as vacinas perdem efetividade e proteção ao longo do tempo, principalmente quando vão surgindo aí novas variantes. As vacinas continuam protegendo contra a hospitalização e óbitos, mas acreditamos que a gente vá ter aí uma periodicidade definida. O auto-teste pode ser uma ferramenta eficaz e de muito auxílio, porque vivemos uma época em que faltaram testes para realização do diagnóstico. É uma ferramenta que pode ajudar no diagnóstico, sim”, continua a médica. 

- - > LeiaJá também: Recapitulando os dois anos de pandemia no Brasil 

Novas variantes 

Para lidar com os impactos da variante Ômicron, a mais recente e predominante entre os casos de Covid-19 no Brasil, o país deve-se guiar por sua situação epidemiológica individual, recursos disponíveis, status de vacinação e contexto socioeconômico. Nas últimas semanas, países em todo o mundo, especialmente na Europa, sentiram a força da onda Ômicron. No Brasil, a variante se tornou a mais presente em território nacional ainda em janeiro, menos de dois meses após a sua primeira infecção registrada. 

Embora a Organização Mundial da Saúde tenha sugerido que um grande número de infecções pela Ômicron poderia sinalizar o fim da pandemia, por causa do aumento de imunidade de curto prazo que se seguirá, os pesquisadores alertam que a situação permanece volátil e difícil de modelar. Uma pandemia geralmente é considerada “superada” quando um vírus se torna endêmico, mas o perigo de encerrar a pandemia antes que ela realmente acabe permanece. 

“A gente precisa observar a dinâmica e os indicadores do nosso país para, posteriormente, podermos planejar as medidas que vamos adotar. Acredito que ainda temos que fazer bastante discussão a esse respeito, mas março promete bastante, e a partir de 15 a 20 de março, a gente vai ter uma situação real dos nossos indicadores e, tendo uma situação favorável, a gente já pode implementar medidas com uma flexibilização maior. Isso deve acontecer à medida que nossos indicadores vão caindo e a nossa curva de novos casos começa a declinar”, pontua Sandra Barros. 

Embora a Covid-19 possa nunca desaparecer completamente, não se espera que as variantes futuras sejam tão severas quanto as anteriores. “Estamos vivendo um momento agora de mais tranquilidade. Teremos o Carnaval, e a depender da cidade do estado, a gente pode ver uma queda ou um aumento no número de casos, mas eu não acredito em um novo período de pandemia”, complementa. 

E continua, no mesmo tópico: “Houve uma subida do número de casos depois do Natal, mas acredito que agora a gente tem uma cobertura vacinal importante. É quase 80% [de vacinados] e isso daí muda bastante a magnitude desse impacto e a dinâmica da pandemia. Mesmo tendo aglomeração em um evento de massa, a gente não acredita que haverá pessoas suscetíveis o suficiente para a gente ter um novo pico e uma nova onda ou novas variantes trazendo doença e trazendo hospitalização. A não ser que surja aí uma variante mega transmissível”. 

Erros e acertos 

No caso do Brasil, alguns erros de gestão da pandemia ficaram escancarados e se tornaram tópico mundial, entre aliados e opositores. O país, que presenciou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de investigação da gestão da pandemia pelo Governo Federal, teve que lidar com um atraso vacinal enquanto o pico de óbitos subia, ao mesmo tempo em que muitas informações circulavam, sem que nem todas fossem relevantes ou verdadeiras.

Com a vacinação e o Plano Nacional de Imunização priorizando o reforço dos imunizantes, o cenário ganhou uma chance de mudança. “O grande acerto nesses dois anos de pandemia foi o avanço que tivemos na vacinação”, pontua a especialista.

Por outro lado, os erros aconteceram em momentos iniciais e essenciais para a condução do restante da pandemia, que já persiste por dois anos. “Em termos de gerenciamento, foi uma pandemia conturbada, porque cada município, cada cidade, cada estado determinava suas próprias normativas. Não teve uma padronização de conduta”, afirma Sandra Gomes de Barros. 

Algumas alternativas, de acordo com a infectologista, se dariam através de uma plataforma fixa e contínua de informação, com alcance nacional, com momento pré-determinado, como ocorre com o horário de propaganda política durante o período eleitoral.

“O governo errou em não distribuir máscaras, assim como distribui preservativos em metrô. Não houve uma distribuição de álcool gel, não houve uma informação adequada, diária para população a nível nacional, como existe o horário político. Deveria ter sido usado um horário através da mídia, através do jornalismo exclusivo, para a população para todas as orientações necessárias, porque houve muito conflito de informação e isso confundiu a população”, completa Sandra, ao mencionar os erros da gestão da Saúde federal.

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