Arremesso de peso, lançamento de disco e salto à distância. Esportes como esses são consagrados em Pan-Americanos, e que fazem parte da vida de Janaína Gomes dos Santos, de 27 anos. Morena, cabelos escuros e dona de um olhar assustado, essa triatleta de sorriso singelo possui uma história de superação e luta, que dedicou todas as suas forças a um ideal repleto de sabedoria e sonhos.
Moradora da cidade de São Lourenço da Mata, Zona da Mata de Pernambuco, que fica aproximadamente seis quilômetros da cidade do Recife, adquiriu, ainda na adolescência, um câncer maligno em sua perna esquerda, chamado osteossarcoma, um câncer nos ossos, que pode se propagar para o pulmão e demais órgãos do corpo. Ela começou a dar sinais após a primeira gestação, aos 19 anos, que foi interrompida por um aborto espontâneo.
Janaína só começou a sentir as dores que a doença causava, quando engravidou pela segunda vez, dois anos depois. A cada mês que passava a dor aumentava, e aos três meses de gestação ela não aguentava pisar no chão e começou a andar com dificuldades. Janaína procurou alguns médicos, e muitos afirmaram que era apenas uma contusão, até encontrar o obstetra Pablo Andrade, que solicitou alguns exames específicos. Foi detectado a partir de um raio X uma macha no joelho esquerdo, e os médicos a encaminharam para uma ressonância que, finalmente, comprovou o câncer nos ossos.
O problema se agravou quando Janaína foi informada que precisaria fazer uma escolha, entre o filho e a própria vida. “Os médicos junto com os meus familiares se reuniram para tentar me convencer a fazer o aborto. Porém, como não tinha como fazer um aborto oficial por causa da Justiça, eles iriam começar a aplicar a quimioterapia, sem se preocupar com a saúde da criança. A prioridade para a junta médica era salvar a minha vida naquele momento, mas, para mim, o meu filho era mais importante.”
Sem esperanças, Janaína tentou encontrar um meio termo, “Pensei no que eu poderia fazer para nos salvar, se caso não tivesse jeito morreria os dois”. O tempo foi passando, exames foram feitos, até sair a biopsia do câncer, informando que a doença estava muito agressiva, e que já tinha perfurado o osso do joelho, podendo causar a morte. A situação do bebê também era delicada, pois Janaína estava no quinto mês de gestação. “Como eu tenho muita fé em Deus, eu confiei nele e aceitaria qualquer decisão que ele me mostrasse, desde que eu pudesse ficar com o meu filho”.
Segundo ela, os médicos afirmavam que não havia outra alternativa, a não ser fazer o aborto para que ela sobrevivesse. “Depois que o médico me informou a notícia ruim, ele saiu da sala, e quando voltou, disse que tinha outra opção, a de amputar a minha perna.” E determinada para ter o tão esperado filho a jovem mãe respondeu de pronto: “Marque o dia e ampute”.
Quinze dias depois de tomar a decisão, Janaína deu entrada no Hospital das Clínicas tendo bulimia pulmonar, provocado pelo câncer. “A única coisa que pensei foi na morte. Tinha certeza que não voltaria pra casa”. Por causa das dores intensas e constantes, Janaína começou a tomar morfina de 15 em 15 minutos, mas mesmo assim, as dores persistiam. Um dos cirurgiões implantou um cateter diretamente no osso da perna. O que amenizou as dores nas pernas.
E no dia 21 de fevereiro de 2006, a então futura mamãe entrou no bloco cirúrgico para ser submetida a amputação da perna esquerda. “Não chorei, não me desesperei, só à noite que senti muitas dores, porque a gente fica com aquela sensação do membro fantasma”, explicou. Daquele dia em diante, a jovem que sofreu por ter perdido o seu primeiro filho, agora estava se dedicando a tão sonhada gestação.
Quatro meses depois Rafael, Gomes Ribeiro nasceu em uma quinta-feira, em um parto cesariano. Mãe e bebê só puderam se conhecer dois dias depois. “Eu não senti falta dele nesses dias, porque eu passei a gestação inteira com medo de que ele viesse ao mundo com alguma deficiência, por conta da medicação forte que eu ingeria”.
E com alívio em seu coração, Janaína pôde finalmente colocar o pequeno Rafael nos braços e fazer o seu papel de mãe: amamentá-lo. “Foi a minha primeira vez que eu realmente pude sentir a emoção de ser mãe”.
Após a complicação da gravidez para ter Rafael, Janaína ainda foi vítima de depressão pós parto, que se agravou por causa de uma infecção generalizada, devido as seções de quimioterapia e de complicações no casamento. “Mulher grávida já fica sensível, imagina com um câncer. Meu marido era muito novo e não soube lidar com a situação. A gente brigava muito, ele me agredia verbalmente, não aguentei e caí (entrou em depressão)”.
Janaína passou quase um mês internada no centro psiquiátrico do Hospital das Clínicas. O pequeno Rafael estava sendo cuidado pela ex-sogra, durante esse tempo. “Eu lutei e sofri muito para ter meu filho, e não vou passar o resto da minha vida dependente de remédios antidepressivos, eu quero sair dessa vida”.
De 2008 para 2009, ela conheceu uma das atletas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que falou do Projeto Paratleta do Núcleo de Educação Física e Desporto (NEFD). A partir daí, Janaína ingressou no Núcleo e hoje é uma das atletas do campus. Em 2011, a jovem mamãe participou de uma competição regional e de outra nacional. Hoje o sonho dela é chegar competir no mundial de atletismo. “Por ele (o filho) tudo valeu a pena, porque eu sei que Deus não o mandou em vão. Isso é ser uma mãe de verdade, é um amor incondicional, agora eu sei, porque eu sou mãe.”