No Brasil, a legislação ambiental vem sofrendo ataques que buscam, entre outras situações indesejáveis, o aumento do desmatamento, a ocupação desordenada de áreas de proteção permanente e a impunidade dos infratores. A afirmação foi feita nesta quarta-feira (20) pelo ex-ministro do Meio Ambiente e atual secretário do Meio Ambiente do Distrito Federal, Sarney Filho, em audiência pública na Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas (CMMC).
Na avaliação de Sarney Filho, o governo Jair Bolsonaro facilita o desmatamento e vai contra a sustentabilidade e a economia verde. Como exemplo, ele citou o Decreto 10.084, de 2019, que revogou o zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar e a determinação para que o Conselho Monetário Nacional fixe normas para o financiamento ao setor sucroalcooleiro.
##RECOMENDA##“Na prática, isso significa uma permissão implícita ao desmatamento da Amazônia e do Pantanal. É uma temeridade que vai se refletir nos compromissos assumidos no âmbito do Acordo de Paria”, alertou.
O coordenador de Comunicação da rede de ONGs Observatório do Clima, Cláudio Ângelo, disse que há um “abandono deliberado” das políticas ambientais, o que vem gerando a perda de confiança no Brasil em âmbito internacional. Ele criticou a ação de autoridades do setor que, contraditoriamente, não reconhecem a existência das mudanças climáticas:
“Isso é preocupante para um país que, até recentemente, era conhecido pela postura extremamente avançada na área de clima, apesar dos nossos problemas”.
A audiência da CMMC foi organizada para debater a regulamentação do Acordo de Paris (de redução do aquecimento global, a vigorar a partir de 2020) e a participação brasileira na Convenção sobre Mudança Climática (COP-25), a ser realizada em Madrid entre 2 e 13 de dezembro.
No Brasil, ressaltou Sarney Filho, o principal emissor de gases do efeito estuda é o desmatamento, não só na Amazônia, mas em outros biomas, o que requer a implementação de uma agricultura de baixo carbono.
“Vivemos desastres ambientais intensos, com secas em períodos normalmente chuvosos, desmoronamentos, inundações súbitas e violentas que estão levando ao comprometimento da segurança hídrica do país, com a redução de água usada na irrigação, na produção de energia e no consumo humano”.
O ex-ministro do Meio Ambiente também defendeu a demarcação de terras indígenas, ações que ele considerou “importantíssimas numa estratégia de baixo carbono, pois os índios são os maiores guardiões das florestas”.
Sarney Filho cobrou “vigilância parlamentar” e disse que medidas destinadas a prevenir ou mitigar as mudanças climáticas devem estar entre as mais urgentes da pauta legislativa, incluindo o pagamento por serviços ambientais, o aumento do estoque de carbono florestal e um maior uso de fontes alternativas de energia, a exemplo da eólica e da solar.
Painéis solares
Encarregada de Negócios da embaixada da Polônia no Brasil, Marta Olkowska disse que as políticas ecológicas devem ser bem implantadas “na casa das pessoas, e não só nos documentos e tratados internacionais”, e defendeu a oferta de financiamento público para a instalação de painéis solares residenciais.
“Na casa em que nasci, na Polônia, se tivermos 150 dias de sol por ano, já é muito bom. Como o Brasil, com tantos dias de sol durante o ano, ainda não acordou para essa possibilidade de ter energia limpa, barata e disponível para todo mundo?”, questionou.
Segundo Marta, “um simples documento como o Acordo de Paris” não será capaz de salvar o mundo se não houver o engajamento de todos os países. Ela defendeu uma aliança global e afirmou que os Parlamentos precisam se esforçar para criar políticas que consigam conjugar o interesse do agronegócio e da mineração com o “bem-estar do planeta”.
Segundo secretário da embaixada do Chile no Brasil, Diego Araya ressaltou que as mudanças climáticas “são um fato real, palpável, com evidência científica, e não uma coisa de ideologia”. O Chile, afirmou, é responsável por 0,25% da emissão dos gases do efeito estufa, mas está entre os dez países mais afetados pelas alterações do clima, que vêm provocando maior seca, diminuição da estação das chuvas, redução das safras, perdas na agropecuária e retrocesso das geleiras.
“A resposta às mudanças climáticas tem quer ser coletiva e com todos os setores envolvidos. E a COP-25 é crucial, tendo em vista a entrada em vigor do Acordo de Paris em 2020”, afirmou.
O chefe da Divisão de Meio Ambiente II do Ministério das Relações Exteriores, Marco Tulio Scarpelli Cabral, lembrou que se encontra pendente a regulamentação do artigo do Acordo de Paris que diz respeito ao mercado de carbono.
“A principal preocupação do Brasil é que haja regras que garantam contabilidade bastante rigorosa no comércio de emissões. O acordo dá margem para interpretações. É necessário haver uma regulamentação precisa e rigorosa. Caso contrário, o risco de distorções e abusos será muito grande”.
No que diz respeito às metas brasileiras de redução de emissões, Cabral disse que será necessário “um esforço nacional muito grande de ações que exigem mudança da economia como um todo”.
O Brasil assumiu perante a Organização das Nações Unidas (ONU) o compromisso de chegar a 2025 com as suas emissões de gases de efeito estufa 37% abaixo dos níveis de 2005, com a redução alcançando 43% em 2030.
O coordenador-geral de Mudanças Climáticas do Ministério da Agricultura, Elvison Nunes, informou que 53% dos municípios brasileiros já praticam agricultura de baixo carbono e acrescentou que o país investiu mais de R$ 19 bilhões desde 2010 na adoção de novas tecnologias para a redução das emissões. Como desafio na área de meio ambiente, Nunes apontou a recuperação de pastagens degradadas.
*Da Agência Senado