Diante da alta rotatividade dos trabalhadores, apurada por estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, a pasta proporá um redesenho da concessão de benefícios de abono salarial e salário-família, para estimular a permanência dos trabalhadores no emprego formal. De acordo com o chefe interino da SAE e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcelo Neri, o desafio é enfrentar a rotatividade, que causa dificuldades como o aumento dos gastos públicos - com benefícios como seguro-desemprego - e queda no investimento em conhecimento do profissional.
"O mercado de trabalho brasileiro teve um desempenho excepcional nos últimos dez anos, mas permanece um grande problema, que é a rotatividade. Com isso, as despesas públicas são infladas e vivemos a situação paradoxal de estarmos próximos do pleno emprego, mas ao mesmo tempo as despesas com seguro-desemprego nunca foram tão altas", afirmou.
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A SAE pretende unificar os benefícios de abono salarial e salário-família, que atingem trabalhadores que recebem de um a dois salários-mínimos. Hoje, o abono salarial é recebido pelo trabalhador anualmente. A ideia é que o benefício seja recebido no mês corrente. Também é proposto que o valor do benefício decline, continuamente, com aumentos de remuneração "evitando assim a descontinuidade atual em dois salários-mínimos".
A rotatividade entre trabalhadores que ganham até dois salários-mínimos chega a quase 60% ao ano, de acordo com o estudo da SAE. "Os dados mostram que só 38% dos que deixam os empregos não se reempregam no espaço de um ano", afirmou. Em 2004, essa porcentagem chegava a 50%. "Então, o trabalhador saca o seguro-desemprego, saca o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Encontrar emprego com mais facilidade e ter acesso a benefícios, que precisam de novo desenho, talvez estimulem (a rotatividade)."
A proposta, que segundo Neri é uma ideia para ser debatida e não um projeto encaminhado oficialmente, foi apresentada nesta segunda-feira, em São Paulo, durante a divulgação do quarto caderno Vozes da Classe Média. "Se eu ganho até dois salários-mínimos, trabalho um mês e depois saio, tenho direito ao abono cheio. Depois de um tempo, o trabalhador pede para ser demitido, por exemplo, para ter acesso ao seguro-desemprego, ao FGTS, para fazer um curso", completou.
Os comentários vêm cerca de 15 dias depois de o governo se ver às voltas com uma discussão sobre um possível reajuste do seguro-desemprego, defendida, inicialmente, pelo Ministério do Trabalho. O Ministério da Fazenda negou uma decisão final sobre correção do benefício, justificando que não seria conveniente aumentar as despesas neste momento e, alguns dias depois, o a pasta do Trabalho também voltou atrás.
A nova formulação do abono salarial proposta pela SAE prevê também valor proporcional ao número de meses trabalhados e não independente. Além do redesenho dos benefícios, há previsão também de estimular cursos de formação profissional para trabalhadores ocupados, de 40 horas, com metade das horas cedidas pelo empregador e a outra metade, parte do tempo de lazer do empregado.
Conforme o chefe interino da SAE da Presidência da República e presidente do Ipea, "há uma série de incentivos da lei para que o trabalhador force a demissão". Neri reforçou a preocupação com a rotatividade do trabalho, afirmando que a taxa do País não só é alta se comparada com demais países, como é crescente.
O subsecretário de Ações Estratégicas da SAE, Ricardo Paes de Barros, disse que, na última década, o Brasil fez uma transição de um País altamente informal para um predominantemente assalariado e formal. "Se antes era menos importante estar tão preocupado com as relações de mercado de trabalho formal, hoje passa a ser uma questão central. Precisamos modernizar a legislação e os programas públicos", disse. A proposta de reformulação do abono salarial, defende a SAE, é uma forma de melhorar a vida do trabalhador sem aumentar o custo do trabalho.