A primeira-ministra britânica, Theresa May, sofreu nesta terça-feira (12) outra derrota histórica pelas mãos dos deputados britânicos, que rejeitaram pela segunda vez seu controverso acordo de Brexit, negociado até o último minuto com Bruxelas.
Faltando apenas duas semanas e meia para a data em que o Reino Unido deve deixar a União Europeia, em 29 de março, os deputados rejeitaram este "acordo melhorado" por 242 votos a favor e 391 contra.
O líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, disse após a votação que o destino do tratado negociado por May foi selado.
"Seu acordo, sua proposta, o que a primeira-ministra apresentou, está claramente morto", afirmou Corbyn.
Para o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, a nova rejeição do acordo de divórcio negociado entre Londres e Bruxelas, aumentou "significativamente a probabilidade de um Brexit sem acordo" faltando apenas 17 dias para a data prevista para a ruptura.
O chefe de negociações da UE para o Brexit, Michel Barnier, disse nesta terça que o bloco fez tudo o possível para ajudar na aprovação do acordo.
"O impasse só pode ser resolvido pelo Reino Unido", tuitou Barnier. "Nossos preparativos para um [Brexit] 'sem acordo' são agora mais importantes do que antes", acrescentou.
Mais cedo, faltando minutos para o início da votação no Parlamento britânico, Barnier havia advertido os deputados britânicos de que não poderia haver um período de transição para a saída do Reino Unido se o acordo sobre a mesa fosse rechaçado.
"Parece que há uma perigosa ilusão de que o Reino Unido pode se beneficiar de uma transição na falta do acordo de retirada", escreveu Barnier também no Twitter. "Está muito claro: a única base legal para uma transição é o acordo de retirada", acrescentou.
A derrota representa um novo revés histórico ao tratado que devia pôr fim a 46 anos de integração britânica no bloco europeu, embora tenha sido menor que a derrota humilhante que May sofreu em janeiro, quando 432 deputados votaram contra e 202 a favor de seu projeto.
Na abertura de cinco horas de debate parlamentar, a primeira-ministra conservadora, visivelmente cansada e afônica, tinha advertido que em caso de repúdio, o Reino Unido se "arrisca a um Brexit sem acordo ou nenhum Brexit".
May tentou salvar o texto, um calhamaço de 585 páginas, fruto de um ano e meio de negociações árduas, literalmente até o último minuto.
Perto da meia-noite, ela e o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, tinham anunciado em Estrasburgo, no norte da França, acordos de última hora sobre o ponto mais conflituoso, a "salvaguarda irlandesa".
Mas estes não foram suficientes para acalmar os temores de muitos deputados. Um influente grupo de legisladores eurocéticos, que incluem o chefe de fileiras do partido unionista norte-irlandês DUP - aliado-chave de May no Parlamento - tinha recomendado votar contra após analisar seu conteúdo.
- "Sem mudanças" -
Pesou em sua decisão a avaliação legal do procurador-geral Geoffrey Cox, encarregado de aconselhar juridicamente o governo e que participou pessoalmente nos últimos dias das negociações em Bruxelas.
Em um relatório publicano pela manhã, Cox reconheceu que os novos adendos ao Tratado de Retirada "reduzem o risco" de que o Reino Unido ficasse "indefinida e involuntariamente" preso em uma união alfandegária com a UE.
Mas "os riscos jurídicos continuam inalterados", sentenciou, jogando um balde d'água fria na reavivada esperança de que desta vez o acordo fosse aprovado.
A denominada "salvaguarda irlandesa" busca evitar a reinstauração de uma fronteira física entre a República da Irlanda - país-membro da UE - e a província britânica da Irlanda do Norte para proteger o frágil Acordo de Paz de 1998. Mas os deputados eurocéticos no Partido Conservador de May temem que deixe, de fato, os britânicos fiquem presos indefinidamente nas redes europeias.
A solução apresentada por May e Juncker na segunda-feira consistia em um intrincado "instrumento conjunto legalmente vinculante", pelo qual o Reino Unido poderia denunciar a UE perante uma corte de arbitragem internacional se considerasse que o bloco agia de má fé para impor uma "salvaguarda irlandesa" permanente.
A premiê havia prometido que se os deputados derrubassem novamente o acordo, organizaria uma nova votação na quarta-feira para que os parlamentares deixassem claro se estão a favor ou contra a um Brexit sem acordo, dadas as consequências econômicas catastróficas que esta hipótese teria para o país.
Se o Parlamento rejeitar também esta opção, na quinta-feira deveria haver uma terceira votação sobre a possibilidade de se pedir à UE um adiamento da data do Brexit.
Segundo uma porta-voz do presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, os membros considerariam uma solicitação razoável dos britânicos para adiar o Brexit.
- Risco de eleições antecipadas -
"Votamos a favor de sair da UE, sendo assim devemos sair da UE, somos uma democracia", dizia, indignada, Suzanne Nicholson, de 65 anos, professora aposentada que protestava junto com uma centena de pessoas em frente ao Parlamento de Westminster.
O Brexit "é uma péssima ideia", afirmava ao contrário outra manifestante, Pat Gillies, também aposentada de 65 anos, deixando clara a divisão que reina no país.
Segundo Charles Walker, importante nome do partido de May, uma nova derrota poderia resultar rapidamente em eleições legislativas antecipadas.
"Se não tem êxito esta noite, tão certo como a noite segue o dia, haverá eleições gerais em questão de dias ou semanas", havia dito à rádio BBC4.
Um adiamento poderia resultar também na organização de um segundo referendo, após o de junho de 2016, que terminou com 52% de votos a favor do Brexit e iniciou todo este processo.
A opção enfrenta o repúdio frontal do governo, mas tem cada vez mais adeptos entre os deputados britânicos que gostariam de anular o Brexit simplesmente.