Líderes latino-americanos adotaram nesta sexta-feira (10), último dia da Cúpula das Américas, a Declaração de Los Angeles, que aplica o princípio da responsabilidade compartilhada para uma migração organizada, como solicita o presidente americano Joe Biden, uma medida ainda simbólica para o tamanho do problema.
"Uma migração segura e organizada é boa para todas as nossas economias, incluindo a dos Estados Unidos. Pode ser um catalisador para o crescimento sustentável, enquanto a migração irregular não é aceitável", afirmou Biden na quarta-feira, no discurso de abertura da nona Cúpula das Américas.
As palavras cruciais para Biden são responsabilidade compartilhada, porque Washington não deseja carregar todo o peso do fluxo migratório. Menos ainda a poucos meses das eleições de meio de mandato de novembro, quando a inflação elevada derruba sua popularidade.
Os detalhes do texto não foram divulgados, mas uma fonte do governo que pediu anonimato afirmou que Biden "está pedindo a todos os governos ao longo da rota migratória que estabeleçam ou fortaleçam o processo de asilo em seus respectivos países".
Também solicita que "reforcem suas fronteiras de maneira mais efetiva, com medidas de controle e expulsando as pessoas que não são elegíveis para asilo", acrescentou.
De acordo com a Casa Branca, com a Declaração de Los Angeles sobre Migração e Proteção, os EUA acolherão 20.000 refugiados da América Latina em 2023 e 2024 (três vezes mais que neste ano) e desembolsarão 314 milhões de dólares em ajuda para migrantes da região.
O número é bem menor do que os 100 mil ucranianos que os Estados Unidos se dispuseram a receber após a invasão russa.
Quase 7.500 migrantes sem documentos, em sua maioria procedentes da América Central, tentam atravessar diariamente a fronteira com os Estados Unidos, de acordo com dados oficiais do mês de abril.
O México aumentará de 10 mil a 20 mil o número de Cartões de Trabalhador de Fronteira e lançará um novo programa de trabalho temporário para entre 15 mil e 20 mil pessoas da Guatemala a cada ano, e espera ampliar o benefício para Honduras e El Salvador.
Belize, Costa Rica e Guatemala, entre outros, também colaboram, mas estas iniciativas estão longe de aliviar a situação dos migrantes que fogem massivamente da pobreza, violência e corrupção.
- Caravana -
Os migrantes passam pelo México, onde uma caravana de milhares de pessoas avança atualmente em direção aos Estados Unidos. Vários deles contaram à AFP que estão exaustos e alguns, em um ato de protesto pela demora nos procedimentos de salvo-conduto, costuraram os lábios.
A lista de países convidados à reunião de cúpula provocou discórdia, depois que o governo Biden optou por excluir Nicarágua, Cuba e Venezuela.
Em resposta, alguns países, liderados pelo México, decidiram boicotar o evento, como Bolívia e Honduras.
Outros participam do encontro, mas como porta-vozes dos que não foram convidados ou para expressar suas reivindicações.
- "Imperdoável"-
Na primeira sessão plenária da cúpula, na quinta-feira, o presidente argentino, Alberto Fernández, confrontou Biden ao discursar na qualidade de presidente 'pro tempore' da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), organização que conta com os três países excluídos pelos Estados Unidos.
"O fato de ser país anfitrião da Cúpula não outorga a capacidade de impor o direito de admissão", disse.
O primeiro-ministro de Belize, John Briceño, acompanhou o protesto. "Esta reunião de cúpula pertence a todas as Américas. Portanto, é imperdoável que todos os países das Américas não estejam aqui".
O presidente chileno, o esquerdista Gabriel Boric, reforçou sua reprovação às exclusões. "Seria diferente discutir em um fórum como este, com todos os países presentes, incluindo aqueles que decidiram não participar, a urgente necessidade da libertação dos presos políticos da Nicarágua e também a importância moral e prática de terminar de uma vez por todas com o injusto e inaceitável bloqueio dos Estados Unidos ao povo de Cuba", afirmou.
Além dos protestos pelas exclusões, existe, segundo a Argentina, a necessidade de "reconstruir instituições que foram pensadas" para a integração.
"A OEA, se quer ser respeitada e voltar a ser a plataforma política regional para a qual foi criada, deve ser reestruturada, removendo imediatamente aqueles que a dirigem", disse Fernandez, somando-se às críticas do México ao secretário-geral da organização, Luís Almagro.
Irritado com as exclusões, o presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador não compareceu à cúpula e enviou o chanceler Marcelo Ebrard, que chamou as ausências de "erro estratégico".
Ebrard também criticou Almagro e defendeu "refundar a organização interamericana" durante a cúpula que, segundo declarou nesta sexta-feira, lança resultados muito positivos no tema migratório.
Reuniões bilaterais também ocorreram durante a cúpula, como a de Biden e o presidente Jair Bolsonaro, que afirmou ficar positivamente surpreso com o primeiro encontro entre ambos.
Bolsonaro, criticado com frequência por ecologistas por suas posições, surpreendeu nesta sexta-feira ao afirmar que não precisa da Amazônia "para expandir o agronegócio".
Além da Declaração de Los Angeles sobre Migração e Proteção, a reunião de cúpula deve adotar projetos de compromisso político sobre a governança democrática, saúde e resiliência, mudanças climáticas e sustentabilidade ambiental, transição para energia limpa e a transformação digital.