No ano de 2011, precisamente no dia 31 do outubro, a ONU projetou o nascimento do sétimo bilionésimo habitante do Planeta.
O nascimento de um ser humano é motivo de celebração da vida e da perpetuação da espécie; o nascimento do sétimo bilionésimo ser humano é um dado estatístico preocupante.
##RECOMENDA##Eis o que diz o renomado cientista e ecologista James Lovelock: “[...] Crescemos em número e em transtornos para Gaia a ponto de nossa presença ser perceptivelmente inquietante [...] Gaia está sofrendo de Primatemaia Disseminada, uma praga de gente”.
De outra parte, há quem afirme que a destruição do mundo natural não resulta das falhas das instituições humanas, mas é consequência do sucesso evolucionário do primata que, ao atingir avanços notáveis, gerou, em grande número, o Homo Rapiens, uma subespécie visceralmente ligada à devastação ecológica.
A associação do crescimento patológico da população mundial com o conceito do homem/rapina é uma atualização aterradora da teoria de Thomas Malthus, pai da demografia, que apontou a incompatibilidade do ritmo de crescimento de duas variáveis – população e meios de subsistência – e, a partir de um fatal desequilíbrio, profetizou a fome apocalíptica.
O paradigma malthusiano exerceu importante influência em vários campos do pensamento, porém subestimou os benefícios da industrialização e do progresso tecnológico. De fato, a tecnologia da produção respondeu ao desafio da escassez; a política, no entanto, falhou diante dos gigantescos passivos sociais e ambientais, ameaças concretas ao futuro da espécie humana.
Saindo do campo da abstração conceitual e reconhecendo realisticamente a necessidade de mudar o rumo do projeto de civilização, é imperioso perceber a mensagem dos dados contidos em recente artigo publicado na revista Science, de autoria de David E. Bloom, Professor de Economia e Demografia do Departamento de Saúde Global e População da Harvard School (aliás, muito bem interpretado por Drauzio Varella no artigo “Superpopulação”, Folha de São Paulo, edição de 22/10/11).
Em milhões de anos, chegamos por volta de 1800 a 1 bilhão de pessoas. A partir de 1960, foram adicionados outros bilhões a cada 10 ou 20 anos. Hoje são sete bilhões e, em 2050, 9,3 bilhões de habitantes.
Por trás dos números absolutos, cabe acrescentar outras leituras: o aumento médio da expectativa de vida mundial de 1950 a 2010 foi de 20 anos e a taxa de fertilidade global diminui de 5 para 2,5 filhos por mulher no mesmo período.
De outra parte, é significativa a diferença do impacto dos números: quanto mais pobre o país e a região, maior é a taxa de natalidade. Consequências: de 1950 para 2050 crescerá a proporção pobres/ricos de 3 para 6 pobres para 1 rico. Razão: quanto mais rico o país mais envelhecida e menor a população, ocorrendo o inverso com o país pobre, logo a composição demográfica determinará (ou não) políticas publicas capazes de enfrentar sérios problemas de saúde, previdência, meio ambiente, tudo agravado com a tendência infrene da urbanização que ratifica a máxima segundo a qual a humanidade nasceu no campo e foi morar nas cidades. Hoje 50% da população mundial vivem em áreas urbanas e, em 2050, seremos 70%.
Com efeito, estes dados e suas tendências lançam densas sombras sobre a possibilidade do “Nosso Futuro Comum”, título do Relatório Brundtland, documento seminal sobre o conceito de desenvolvimento sustentável (ONU, 1987).
Entretanto, não se enfrentam fatos aparentemente irreversíveis, brandindo otimismo ingênuo. O caminho da luta é o alinhamento aos que tem “fé criadora”, entre eles, o grande cientista, René Dubos, um dos redatores do relatório da Primeira Conferência Internacional sobre o Meio Ambiente (Estocolmo, 1972), precursor das advertências sobre os desastres ecológicos.
Além da magnífica obra, Dubos deixou-nos duas mensagens encorajadoras quanto ao uso responsável da ciência e da tecnologia: “Tendência não é destino” e “Pense globalmente, aja localmente”.
* Texto opinativo produzido pelo ex-Ministro da Fazenda e ex-Governador de Pernambuco Gustavo Krause. Os textos opinativos são de responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião por portal.