Em abril de 2018, milhares de fãs órfãos da banda pernambucana Cordel do Fogo Encantado viram um sonho tornar-se realidade: o grupo que havia se separado em 2010 anunciou seu retorno com o lançamento de um disco novo, Viagem ao Coração do Sol, e vários shows ao redor do Brasil e até nos Estados Unidos e Europa.
Em quase um ano e meio da retomada da carreira, o Cordel (re)encontrou plateias sedentas, matou a saudade do Carnaval do Recife - festa que os alçou ao sucesso no início da trajetória -, aprendeu a lidar com novas tecnologias e formatos de música e viu a legião de fãs crescer ao passo que uma nova geração identificou-se com sua música. Neste sábado (7), o Cordel do Fogo Encantado sobe ao palco do Baile Perfumado, ao lado da Nação Zumbi, em um show que vai comemorar os sete anos de funcionamento da casa.
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Antes do encontro com o público pernambucano, o violonista Clayton Barros falou com exclusividade ao LeiaJá sobre o turbilhão de emoções da volta aos palcos, a necessidade de se colocar em meio ao atual cenário político e social do país e o que está por vir na história do grupo de Arcoverde.
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LJ - Vocês não tocavam no Recife desde o Carnaval, tocar em 'casa' deve ser sempre especial, né?
Recife pra nós é uma cidade que foi um ponto principal da nossa ida pela primeira vez pro Sudeste. É sempre um público muito forte e muito querido, a gente sabe que aqui é uma das nossa maiores forças. Você junta isso com a vontade de tocar e ainda participar de uma noite com a Nação Zumbi e comemorando os sete anos do Baile. Pra nós tem uma simbologia muito forte e é diferente também porque o último show foi no Carnaval, ao ar livre, esse é à portas fechadas então a gente tem uma expectativa bacana das pessoas que movimentam o mercado da música aqui no Nordeste. É uma série de sensações e simbologias.
LJ - Vocês já fizeram um balanço desse um ano e meio de retomada da carreira?
A gente tem falado muito sobre isso. Cada um tem uma impressão, mas uma coisa é unânime: o pensamento de como foi importante pra gente ter voltado nesse momento tão difícil no Brasil. Juntar nossa energia, nossa força artística como uma mensagem também de positividade e de enfrentamento das lutas. Falando tecnicamente, a quantidade de shows - não sei precisar agora quantos foram -, mas tem a ida pra Europa, recentemente ao Central Park (nos Estados Unidos), é muito positivo esse resultado; como o disco tem fluído na mão das pessoas, o público que se faz presente nos shows cantando junto, a recepção sempre muito bacana em todos os lugares, cada show é uma coisa diferente e a gente colhe de cada lugar a energia desse público. Mas resumindo, tem sido muito positivo a gente voltar a tocar no mundo de hoje, com as redes sociais; quando paramos ainda estava germinando o processo de internet no Brasil, não existia streaming, então tudo isso foi uma forma importante pra gente aprender a se comunicar com o público nos dias de hoje através dessas novas ferramentas. É muito positivo o saldo.
LJ - Vocês passaram bastante tempo parados, oito anos, e voltaram, como você disse, em meio a essas novidades de mídias e formatos de música, isso deve ter gerado uma renovação do seu público. Vocês notaram isso?
Antes de voltar pro palco, a gente conversava internamente sobre como seria o encontro com quem já conhecia a banda e as pessoas que já tinham ouvido, mas nunca tinham visto ao vivo, ir de encontro a essa renovação de público tem acontecido de forma muito positiva e muito aliada às redes sociais. A gente tem aprendido muito com o próprio público a dialogar dessa maneira, com essa estrutura, essa nova comunicação.
LJ - Você falou sobre a vontade do grupo em juntar forças a um "enfrentamento de lutas" e o disco novo, Viagem ao Coração do Sol, tem como grande mote a liberdade. Como essa mensagem tem reverberado junto ao público?
Lira mesmo disse que a arte é uma forma de manifestação política, a gente vem pra somar forças na luta, na resistência contra essas forças obscuras da política. Quando a gente fala de liberdade é aquela coisa: conhecer a sua liberdade interior e a liberdade do outro, querer sempre o outro livre. Eu acho que a democracia real é feita disso e não de passar por uma situação de você ser tolhido, perseguido, shows que têm sido censurados, isso a mim pessoalmente, me entristece. Mas ao mesmo tempo, isso promove uma reação de força, de luta, resistência, e de contestação a esses valores - se é que podemos chamar de valores os ataque à liberdade de expressão, os ataques às ideias opostas. Isso traz uma imagem muito negativa e temerosa de um passado, desde o golpe militar. Enfim, eu torço pra que a gente consiga um diálogo mais amplo e efetivo sobre todas essas coisas mas a cada dia que passa eu percebo q é utópica essa visão. Pessoalmente, é bem nítido, tenho visto um dos anos mais temerosos em relação a uma série de coisas na política na arte, nos espaços. Um ano bem difícil tem sido 2019, mas nem por isso se torna um ano inútil, é uma ano de luta e de resistência. A gente sente que soma nessa força, é uma forma da gente expandir essa energia.
LJ - Passado esse turbilhão inicial do retorno, após tantos shows, o Cordel já tem projetos novos?
Estamos preparando coisas para o futuro próximo, ainda não posso falar muita coisa. Filmamos vários shows, temos um material bacana pra um documentário. Estamos decidindo quais setas vão apontar para os próximos passos, a gente tá muito feliz e realizado artisticamente em todo esse processo.