Quem transita pelas ruas do Recife tem que lidar diariamente com calçadas esburacadas e quebradas, uma situação que se repete em vários bairros de uma cidade que lida com o caos no trânsito diário, mas não valoriza o pedestre, muito menos o passeio público. A equipe do LeiaJá.com esteve em alguns locais onde as calçadas são precárias e confirmou o estado de má conservação ou sujeira das calçadas.
Volta e meia um pedestre tropeça num trecho com buraco ou pedras soltas do calçamento. Em algumas vias, nem calçamento há, e as pessoas são obrigadas a andarem nas ruas ou desviarem devido ao lixo deixado no local ou uma raiz de árvore, que acaba quebrando o calçamento. Outro problema que também atrapalha os pedestres são os ambulantes, que ocupam as calçadas das ruas e muitas vezes deixam o lixo produzido no local, assuntos que já foram investigados pela reportagem em outras matérias. Na época, a equipe circulou pelo bairro da Boa Vista, na região central do Recife.
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Desta vez, nosso percurso teve início em frente ao Mercado de São José e na Praça Dom Vital, no bairro de São José. Ali, o calçamento está mais conservado, mas a sujeira está por toda parte, visto que muitos comerciantes colocam o lixo nas calçadas e ruas, que se acumulam em alguns pontos. Na Rua do Rangel, uma quina da calçada, bem estreita, está quebrada. Mais a frente, um poste força o pedestre a ir para a rua desviar da instalação e depois retornar. Um vendedor de coco vê nossa equipe e brinca. “Aqui só passa se a pessoa for muito magra, como eu”, afirma, passando com pouca dificuldade.
A Avenida Guararapes, no bairro de Santo Antônio, é uma importante via de ônibus, comércio e serviços, e muitas pessoas transitam diariamente pelo local. Lá encontramos Ísio Pausanschy, 69 anos, aposentado, que circulam semanalmente pelo local. “O calçamento é muito ruim. Já tem anos e anos que está assim, é quase uma aventura pra quem precisa passar por aqui”, comentou.
A poucos metros de onde estávamos uma moça tropeçou numa peça do calçamento que estava solta e seguiu xingando em voz alta. Ao nosso lado, encontramos uma sola de sapato de alguém que tropeçou numa das pedras e acabou deixando parte do calçado no local. No trecho, estão duas paradas de ônibus, quase na rua, e várias agências bancárias.
Mais à frente, nas ruas transversais à Conde da Boa Vista, onde o calçamento está mais conservado e há um pouco mais de espaço para o pedestre circular, chegamos a um local conhecido como Beco da Fome, uma passagem localizada entre as Ruas do Hospício e Sete de Setembro, na Boa Vista, mais buracos, calçadas quebradas e denúncias de moradores e comerciantes do local sobre má educação dos moradores do local e falta de manutenção.
O motoqueiro Júnior Celso trabalha há catorze anos num dos bares da rua, e afirma. “As pessoas jogam coisas da janela, até uma bacia sanitária jogaram uma vez. Isso acaba com a calçada. Mas não lembro a última vez que este espaço foi restaurado. O que tem sido feito é que os donos dos bares se juntam e joga cimento por cima dos buracos”, disse. “Agora estão limpando aqui todo dia, mas de que adiante limpar se não ajeitam?”, questiona.
A seu lado, Gilberto Bonfim, 62 anos, morador de um dos prédios confirma com a cabeça. “As pessoas sujam muito. Mas não ajeitam isso aqui, que é um local muito movimentado, os comerciantes se juntam e fazem uma cota pra dar uma tapeada nos buracos”, completou.
O comerciante Jailson Nascimento trabalha na Rua do Hospício há cerca de dez anos e diz não se lembrar da última vez que restauraram a calçada. “Estou aqui de segunda a sábado e não me lembro de ter visto reparos na calçada. Eles agora estão lavando logo cedo, mas não entendo porque não arrumaram o calçamento. Fica limpo, mas segue quebrado e ruim para a gente”.
A equipe procurou a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb) para explicar como funciona a limpeza e manutenção das calçadas. Em nota, o órgão afirmou que a manutenção das calçadas é de responsabilidade dos proprietários dos imóveis, e que a varrição é feita constantemente, variando de acordo com a necessidade de cada local e fluxo.
Em relação à recuperação dos passeios públicos, a Emlurb afirma que está com uma ação desde julho de 2013, em parceria com a Secretaria de Mobilidade que focaliza canteiros centrais de vias, frentes de água, praças, parques e imóveis públicos e implantação de novos passeios nos corredores viários da cidade, com instalação de rampas de acessibilidade. A previsão de conclusão do serviço é em julho, e, neste momento, as ruas do polígono do Carmo (no centro da cidade), largos de Água Fria e de Casa Amarela passam por obras.
Já a Companhia de Serviços Urbanos do Recife (Csurb) informou que o ordenamento do comércio informal no centro do Recife está sendo feito, e que, nos entornos do Mercado de São José foram desapropriados quatro imóveis, que passam por processo de adequação para a construção dos boxes que vão abrigar os comerciantes da área. Por enquanto, não há previsão de data para a mudança definitiva.
A Csurb também disponibilizou um número para que os cidadãos façam denúncias sobre comércio informal: 3355-2414. A partir das informações recebidas, os fiscais poderão atuar nas áreas e pensar em maneiras de melhorar o deslocamento dos pedestres nas calçadas.
Lixo e falta de educação: é mais fácil jogar na rua?
Este motivo também foi alegado pelos pedestres que circulam pelas ruas, que acreditam que cada um tem parte na sujeira total e na responsabilidade de fazer a limpeza. È o que pensa a analista de operação Jessilane Cavalcante. “Acho que a educação é a saída, porque temos várias lixeiras espalhadas aqui (no Centro). O povo podia ser mais educado”, afirmou.
De modo geral, percebe-se que há lixeiras espalhadas nas ruas, que não são suficientes para a demanda de lixo produzido, mas é fácil ver pessoas jogando lixo nas ruas e calçadas e pela janela dos automóveis. O técnico em informática Thiago Travassos fala sobre a sujeira que os ambulantes produzem. “Acho que a solução é a educação, já tive que andar pela rua devido a quantidade de lixo que os ambulantes despejam nas calçadas”, disse. Sobre este assunto, a Emlurb afirmou que afirmou que a coleta do lixo é feita diariamente, de segunda a sábado, em período noturno, quando as atividades do comércio são encerradas.
Ambulantes e acessibilidade: todos querem um espaço para chamar de seu
Entre as pessoas entrevistadas, a equipe conversou com dois portadores de deficiência quando tratou de lixo na área central da cidade, um cadeirante e um deficiente visual, e a resposta foi unânime: os ambulantes que ocupam as calçadas e colocam o lixo na rua dificultam a passagem de pessoas com deficiência. “Precisamos pedir ajuda de pessoas para conseguir subir a calçada, e muitas rampas de acesso são ocupadas com entulhos”, foi o que o administrador Edson Ferreira afirmou.
Amaro Resende, que é deficiente visual, também reclama da sujeira dos ambulantes. “Buracos e o lixo atrapalham, mas os vendedores que colocam barraca nas calçadas são o meu maior obstáculo. Às vezes bato sem querer em um ambulante e ele reclama mesmo sabendo que não consigo ver”, lamentou.
Para os ambulantes, ter um comércio na Avenida Conde da Boa Vista como ponto de venda é questão sobrevivência, e a negociação de um terreno com a prefeitura não tem agradado muito a categoria. “O terreno que eles querem é mais escondido, não vão nos ver”, disse o comerciante José Marcos. O terreno almejado pela categoria é tombado como patrimônio, fica entre um centro de compras e uma loja de atacado e não pode ser ocupado. “Acho que não querem ceder este terreno pela localização, já que seríamos concorrência pra os lojistas”, completa Marcos.
Segundo a Secretaria de Mobilidade, existem cinco opções de terrenos para a remoção e deslocamento dos ambulantes da avenida, mas não há uma data para que isto aconteça. No momento, estão sendo feitas as desapropriações dos terrenos, que serão entregues de uma vez. Ainda segundo a secretaria, as negociações com os ambulantes continuam em curso, e, por enquanto, ações de fiscalização para o ordenamento das barracas nas calçadas são feitas.