Os pedidos para que os militares fechem o Congresso e a Suprema Corte foram expostos em faixas nas marchas a favor do presidente Jair Bolsonaro nas últimas semanas, mas generais aposentados e observadores próximos das Forças Armadas chamam isso de conversa vazia.
Defensor do golpe militar de 1964 no Brasil e das duas décadas de ditadura que se seguiram, Bolsonaro permitiu que seus filhos e partidários fizessem ameaças a instituições democráticas em parte porque ele foi esquecido, de acordo com analistas.
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Enquanto o populista de direita luta com uma economia em queda, o pior surto do novo coronavírus do mundo fora dos Estados Unidos, e investigações policiais contra sua família e amigos, é provável que essas ações antidemocráticas continuem.
No entanto, três generais aposentados declararam nos últimos dias que não havia risco de uma intervenção militar e expressaram preocupação de que as Forças Armadas estivessem sendo indevidamente politizadas sob Bolsonaro, um ex-capitão expulso pelo Exército por insubordinação e por um suposto plano de atentado terrorista.
"A ideia de colocar as Forças Armadas no meio de uma disputa entre ramos do Estado, autoridades e interesses políticos está completamente fora de lugar", afirmou à agência Reuters Carlos dos Santos Cruz, general aposentado do Exército que serviu no gabinete no ano passado, até que ele brigou com os filhos de Bolsonaro.
"É uma falta de respeito pelas Forças Armadas", acrescentou à agência Reuters.
O próprio Bolsonaro insistiu em defender a Constituição do Brasil. Mas ele acusou os tribunais de abusar de sua autoridade e não fez nada para impedir que seus partidários mais fervorosos exigissem a intervenção militar. Seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro, disse recentemente que uma "ruptura" institucional era uma questão de tempo.
As declarações seguiram uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de investigar uma suspeita de desinformação e rede de intimidação administrada pelos apoiadores do presidente nas mídias sociais que tiveram um grande papel em sua eleição de 2018. O inquérito pode levar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a questionar sua vitória e potencialmente cassar a chapa.
As ameaças de ruptura democrática visam intimidar rivais, promotores e a Suprema Corte, segundo disse à agência Reuters o cientista político Christian Lynch. Mas os comandantes militares descartaram publicamente qualquer probabilidade de golpe
"O Supremo Tribunal Federal chamou o blefe de Bolsonaro", explicou Lynch, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). "Ele não tinha a carta do golpe. Ele estava blefando o tempo todo".
'Inconstitucional'
Para o general aposentado Roberto Peternelli, eleito para o Congresso em 2018 pelo mesmo partido que indicou Bolsonaro, o PSL, os militares simplesmente não obedeceriam a uma ordem presidencial para fechar o Congresso ou a Suprema Corte.
"As Forças Armadas respeitam totalmente a Constituição e essa ordem seria inconstitucional e ilegal", avaliou à agência Reuters o ex-militar, que comandava a frota de helicópteros do Exército brasileiro.
O general aposentado Paulo Chagas, ex-oficial de Infantaria, declarou à agência Reuters que o presidente não tem o poder de fechar o Congresso ou o tribunal superior e perderia a legitimidade se tentasse.
Alguns críticos dizem que Bolsonaro já está politizando as Forças Armadas, que trabalharam por décadas para se estabelecer como um ente defensor apolítico da democracia após os abusos dos direitos humanos da ditadura de 1964 a 1985.
Com bronze militar em um terço dos cargos de Bolsonaro, incluindo dois generais de serviço ativo entre seus conselheiros mais próximos e o general da reserva Antonio Hamilton Mourão como vice-presidente, a reputação das Forças Armadas está ligada ao governo.
De acordo com uma investigação do Tribunal de Contas da União (TCU), agora existem até 3 mil militares em cargos no governo.
Chagas, que fez campanha para a eleição de Bolsonaro, disse que ainda acredita que o presidente é o melhor homem para liderar o país, mas ele sugeriu que os oficiais do serviço ativo deveriam recusar ou se aposentar de empregos no governo, a fim de manter uma distância entre as esferas militar e política.
Paulo Kramer, professor da Universidade de Brasília (UnB) que conhece bem o gabinete de Bolsonaro, destacou à agência Reuters que os generais que estão no gabinete, como o assessor de segurança Augusto Heleno, lembram-se vividamente de como o legado do golpe de 1964 manchou a reputação das Forças Armadas.
"Esta geração do general Mourão e Heleno é vacinada contra qualquer tentativa de golpe. Eles se sentem desconfortáveis quando o presidente e seus filhos fazem essas ameaças", pontuou Kramer.
Da Sputnik Brasil