O nome do conselheiro Domingos Brazão, do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), é um dos mais pesquisados nos mecanismos de busca do Brasil, nesta terça-feira (23). Isso acontece após ele voltar a ser diretamente citado no Caso Marielle como o possível mandante dos assassinatos de Franco, então vereadora pelo Psol, e seu motorista, Anderson Gomes, mortos em 2018. Acredita-se que ele será o nome apontado na delação do militar reformado Ronnie Lessa, mas Brazão também já foi apontado como mandante em uma outra delação do caso, assinada pelo ex-PM Élcio Queiroz.
Mas, afinal, quem é Domingos Brazão e por que há associação do conselheiro ao crime? Entenda a trajetória política do possível envolvido, suas polêmicas, investigações em seu desfavor e as conexões políticas no Rio de Janeiro, o que inclui Jair Bolsonaro (PL).
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Quem é Domingos Brazão
Domingos Inácio Brazão, de 58 anos, é um empresário do ramo dos postos de gasolina e político carioca filiado ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Ele tem cerca de 25 anos na política e já foi vereador da cidade do Rio, deputado estadual por cinco mandatos consecutivos (1999-2015) e, atualmente, é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ). Seus mandatos são marcados por polêmicas, corrupção e afastamentos.
Em 2011, o político chegou a ter o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) por suposta compra de votos por meio de uma ONG da qual participava. Ele manteve o mandato através de uma liminar na Justiça. Antes, em 2004, uma gravação indicara envolvimento de Brazão e do ex-deputado Alessandro Calazans com a máfia dos combustíveis, área na qual ele possui empreendimento. O caso envolvia licenças ambientais da Feema para funcionamento de postos de gasolina.
Afastamento do TCE
Eleito ao cargo em 2015, o ex-deputado foi afastado do TCE em 2017, quando ele e outros quatro conselheiros chegaram a ser presos temporariamente como parte da Operação Quinto do Ouro, um dos desdobramentos da Operação Lava-Jato no Rio. A investigação apurava suspeitas de fraude e corrupção no tribunal e citou uma mesada de R$ 70 mil, paga individualmente aos cinco, pela Federação das empresas de transporte de passageiros do Estado do Rio (Fetranspor). O patrimônio do conselheiro cresceu 27% entre 2014 e 2016, período que abrange sua saída da Alerj e entrada no TCE-RJ.
Homenagem a Marielle Franco, no Congresso. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Relação com o Caso Marielle
Em 2018, o ex-policial militar Rodrigo Jorge Ferreira, o “PM Ferreirinha”, mentiu em depoimento à Polícia Civil, no intuito de obstruir as investigações do Caso Marielle. À época, ele, que possui envolvimento com a milícia e era matador de aluguel, acusou o então vereador Marcello Siciliano (PHS) e o miliciano Orlando Curicica como sendo os mandantes do crime. Durante a investigação, a PF concluiu que Ferreirinha e sua advogada, Camila Nogueira, faziam parte de organização criminosa cujo objetivo era atrapalhar as investigações sobre a morte da vereadora.
A partir disso é que Domingos Brazão passou a ter envolvimento no caso. Ele se tornou suspeito de ter utilizado um policial federal aposentado, que era funcionário de seu gabinete no TCE-RJ, para levar Ferreirinha ao falso testemunho. O intuito era prejudicar o vereador Siciliano, que entrou na disputa pelo comando da Zona Oeste da cidade, sob domínio da família Brazão. Nascido e criado em Jacarepaguá, Brazão tem na região o seu reduto eleitoral. Domingos também teria, segundo a investigação, vínculo com o Escritório do Crime, envolvido nas mortes.
Em 2018, o jornal O Globo mostrou que tanto o grupo de Brazão quanto o de Siciliano apresentaram projetos de lei que poderiam favorecer a expansão de construções irregulares na Zona Oeste. Marielle vinha atuando em projetos de regularização fundiária na área, o que poderia estar incomodando o grupo.
Desavenças com Freixo
Segundo a reportagem do The Intercept nesta terça-feira (23), a principal hipótese para que Domingos Brazão ordenasse o atentado contra Marielle e Anderson seria uma vingança política contra Marcelo Freixo (PT, à época, no Psol), com quem Marielle trabalhou por 10 anos. Quando Domingos e Freixo estavam no Legislativo do Rio, eles protagonizaram embates relacionados à CPI das Milícias, presidida por Freixo e na qual Brazão foi citado, em 2018.
Marcelo Freixo teve também papel fundamental na Operação Cadeia Velha, deflagrada pela PF em novembro de 2017, cinco meses antes do assassinato da vereadora. Com ela, os deputados estaduais Paulo Melo, Edson Albertassi e Jorge Picciani (morto em maio de 2021), do MDB, foram presos. Essa foi a investigação que posteriormente culminou no afastamento de Brazão do TCE-RJ.
Relação com Bolsonaro
João Vitor Moraes Brazão e Dalila Maria de Moraes Brazão, filho e esposa do deputado federal Chiquinho Brazão (Avante-RJ), irmão de Domingos, receberam, em julho de 2019, passaportes diplomáticos concedidos pelo Itamaraty sob o Governo Bolsonaro. Os integrantes da família Brazão estavam na lista com os 1.694 passaportes diplomáticos emitidos pela gestão de Jair.
Entenda as delações
Em julho de 2023, o ex-policial militar Élcio Queiroz fechou um acordo de delação premiada com a Polícia Federal, homologado pela Justiça. Ele confessou ser o condutor do veículo utilizado na emboscada contra Marielle e Anderson. À época da delação, ele citou o comparsa Ronnie Lessa e detalhou o plano de fuga após os assassinatos. Já o policial militar reformado Ronnie Lessa, preso acusado de ser o autor dos disparos que mataram a psolista e o motorista, pode estar perto de ter seu acordo de delação premiada homologado.
Conforme divulgado pelo colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo, no último domingo (21), Lessa já fechou o acordo de delação com a PF. O mesmo jornal divulgou, nesta terça-feira (23), que o mandante do crime, conforme a delação de Lessa, teria foro privilegiado. Ou seja, se trata de uma autoridade em cargo público. A informação surgiu após ser confirmado que o processo está em tramitação no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o que só seria possível para autoridades. Entenda melhor a implicação do foro privilegiado.
Horas após a matéria do site, o The Intercept confirmou, com exclusividade, que o delatado pelo policial reformado é, sim, o conselheiro Domingos Brazão. Caso a informação seja confirmada pela PF/STJ, a delação de Lessa confirmaria a de Élcio Queiroz e o Caso Marielle poderia estar próximo de um desfecho.