Os ciberataques provenientes da Rússia são agora tão habituais que a Alemanha deve aprender a lidar com os mesmos de forma cotidiana, afirmou nesta terça-feira a chanceler Angela Merkel, depois de seu país sofrer, na véspera o maior ataque cibernético já registrado.
Merkel disse desconhecer quem estava por trás do ataque que deixou quase um milhão de usuários do Deutsche Telekom sem acesso à internet, mas acrescentou que este tipo de ciberataque ou conflitos híbridos como são conhecidos na terminologia russa, fazem parte agora da vida diária, por isso é preciso aprender a lidar com eles.
Mais cedo, o chefe dos serviços secretos da Alemanha alertou contra uma multiplicação de atos de ciberpirataria procedentes principalmente da Rússia.
Segundo ele, esses ataques teriam como alvo os políticos a menos de um ano das eleições legislativas no país.
"A Europa está no centro dessas tentativas de desestabilização e a Alemanha em particular", declarou Bruno Kahl, diretor do Serviço de Inteligência (BND) falando ao jornal Süddeutsche Zeitung, em entrevista publicada no dia seguinte ao ataque.
Se a origem do ataque ainda não foi determinada oficialmente, fontes da segurança atribuem ao software Mirai, desenvolvido pelo grupo de hackers russos Sofacy, de acordo com o jornal Tagesspiegel de Berlim.
Mirai, que infecta inicialmente uma rede de utensílios domésticos conectados, de babás eletrônicas a câmeras de vigilância, antes de lançar ataques em uma escala maior, tinha sido usado para hackear em 2015 o Bundestag, a câmara baixa do Parlamento alemão.
Esta ofensiva havia sido atribuída à Rússia pelos serviços de inteligência.
"O 'malware' (software malicioso) foi mal programado e não fez aquilo para o qual foi projetado, caso contrário, as consequências poderiam ter sido muito piores", indicou nesta terça-feira o porta-voz da Deutsche Telekom, Georg von Wagner.
O G20, as eleições
De acordo com especialistas citados pelo Tagesspiegel, o ataque contra Deutsche Telekom tinha, sem dúvida, "dois objetivos", o de mostrar a fragilidade de uma grande empresa e preparar uma ofensiva em "escala maior" durante, por exemplo, a cúpula do G20 a ser realizada em junho em Hamburgo (norte).
Há também "indícios de que os ataques cibernéticos se produzem com o único propósito de criar incerteza política", considerou Bruno Kahl, perguntado sobre os ataques na Alemanha e nos Estados Unidos durante a campanha eleitoral.
O chefe do serviço secreto externo falou de "elementos" que apontam para a Rússia. "É por definição difícil atribuir esses fatos a um ator estatal, mas vários elementos indicam que eles são, ao menos, tolerados ou desejados por um Estado", ressaltou.
A chanceler Angela Merkel foi ainda mais direta no início do mês, alertando para tentativas de desinformação e ataques hackers provenientes da Rússia em vista das eleições legislativas, durante as quais brigará por um quarto mandato.
"Nós observamos, em nosso mundo conectado, um número crescente de ataques contra infraestruturas sensíveis, bem como casos de espionagem cibernética", enfatizou nesya segunda-feira, advertindo contra uma "ameaça potencial considerável."
'Guerra híbrida'
Vários partidos políticos alemães, incluindo a formação conservadora de Merkel, foram alvos de ciberataques atribuídos a hackers pró-Kremlin, via e-mail que parecia provir "da sede da Otan" e infectados com spyware.
Em maio, o serviço de inteligên cia alemão já havia acusado o governo russo de liderar campanhas internacionais de ataques cibernéticos para fins de espionagem e sabotagem, citando uma "guerra híbrida" orquestrada por Moscou há "sete ou onze anos".
O ministério da Defesa também anunciou no início de outubro a criação de um departamento de cibernética para organizar uma resposta, incluindo 130 funcionários divididos entre Bonn e Berlim.
Enquanto isso, na frente da desinformação, Berlim acusou no início deste ano a Rússia "de instrumentalizar politicamente" o suposto estupro de uma adolescente russo-alemã por migrantes, um caso que se revelou inteiramente inventado.
A imprensa alemã acusa Moscou de procurar influenciar a vida política alemã através dos 3,2 milhões de cidadãos de ex-repúblicas soviéticas que chegaram à Alemanha após o desmantelamento do bloco do Leste.