Nesta quarta-feira (17), cerca de 600 trabalhadores e trabalhadoras da Zona da Mata de Pernambuco marcham pelo Centro do Recife para cobrar desapropriação ou adjudicação de terras de usinas falidas e desativadas na região. A manifestação, que partiu da praça do Derby, cruzou a Avenida Conde da Boa Vista em direção ao Palácio do Campo das Princesas, onde uma comissão formada por representantes das comunidades e de organizações sociais como a Federação dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado de Pernambuco (Fetape), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) deve ser recebida pelo governador Paulo Câmara, às 16h.
De acordo com a CPT, as s famílias presentes no ato exercem posse sobre essas áreas há várias décadas, o que lhes dá direito de permanecer no local. Ocorre que seus lotes tornaram-se alvo constante de leilões judiciais que desoneram as empresas de açúcar e álcool de suas dúvidas milionárias, inclusive, as trabalhistas, as quais seguem ativas.
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Os camponeses também cobram uma maior fiscalização dos leilões judiciais de terras e temem ser despejados com o fim da lei que proíbe os despejos durante a pandemia, prorrogada até 30 de outubro. “Somos pobres, trabalhadores, agricultores, mas não invadimos nada de ninguém não. Estamos pedindo nossos direitos. Era assalariado e hoje estou plantando nas terras que meu pai deixou pra mim. E de lá eu não quero sair nem tão cedo, quero criar meus netos, meus filhos, porque eu não sei fazer outra coisa. Sei plantar banana, macaxeira, milho”, ressalta Manoel Messias, da comunidade Barro Branco, município de Jaqueira, na Mata Sul.
Moradora da comunidade de Barra do Dia, localizada na cidade de Palmares, Edna Maria da Silva, relata que está prestes a ser expulsa das terras em que produz e vive. "Um usineiro que se diz dono das terras está querendo tomar tudo da gente. Só que ele não conseguiu até hoje nos provar que é dono de lá. A comunidade em si, não temos um levantamento, mas tem gente idosa, com 80 anos, nascida e criada lá", relata.
Ao chegar no Palácio, a mobilização foi recebida por duas barreiras de segurança. "A gente se sente mal. É um descaso com o trabalhador que bota a comida na mesa dele [do governador], ele depende da gente e não a gente dele. Isso a gente não aceita, é um descaso a gente ser tratado como marginal. Estamos lutando por um direito nosso, cuidamos da terra, protegemos ela. Somos agricultores, não bandidos", desabafa Edna Maria.
Histórico
A ameaça de despejo provocada pelos leilões judiciais vem intensificando o quadro de violência e conflitos agrários na região, que já havia sofrido agravamento durante o período de pandemia de covid-19, sobretudo na Mata Sul. Os relatos das famílias camponesas envolvem situações de ameaças, intimidações, perseguições, utilização de drones para vigilância, aplicação de agrotóxicos nas plantações e destruição de lavouras e esbulho de suas posses por empresários que querem ocupar as terras para criar gado. Em agosto de 2020, o LeiaJá relatou o drama dos camponeses jurados de morte na região.
Em fevereiro deste ano, o menino Jonatas Oliveira, de 8 anos, foi assassinado dentro de sua casa, no Engenho Roncadorzinho, uma das comunidades em conflito. O caso foi denunciado pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal e da Assembleia Legislativa de Pernambuco como um crime ligado à disputa pela terra.
Diálogo
Na última segunda-feira (15), a Comissão Estadual de Acompanhamento dos Conflitos Agrários de Pernambuco (CEACA/PE), instituída por decreto pelo governador Paulo Câmara, promoveu uma reunião extraordinária com o secretário de Justiça e Direitos Humanos, Cloves Benevides, com o objetivo de debater os principais pontos reivindicados pelas comunidades do campo. Essa foi a quinta reunião realizada desde a criação da CEACA, um espaço de diálogo entre sociedade civil e governo visando ao fim dos conflitos agrários e à garantia do direito à terra pelas famílias.