O governo americano quer fechar o cerco às milícias leais ao presidente Nicolás Maduro na nova fase de ações contra o regime chavista. Para a Casa Branca e senadores do Partido Republicano, o recente pedido do líder venezuelano para que esses grupos civis armados, conhecidos como "coletivos", reprimam manifestações é um sinal de que as Forças Armadas já não estão tão dispostas a empregar a violência contra a população civil.
Segundo a ONG venezuelana de direitos humanos Provea, desde o começo do ano morreram 50 pessoas em manifestações contra o governo na Venezuela. Destes, 14 foram mortos por grupos civis armados - 38% do total. Um levantamento similar feito pelo Observatório Venezuelano de Violência nos protestos de 2014 mostra que de 43 mortes em protestos, 8 foram cometidas por civis armados - 18% do total.
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No começo do mês, ao anunciar o racionamento de energia elétrica depois de dois apagões em março, Maduro pediu aos coletivos que "se mobilizassem para defender cada bairro, cada rua e cada bloco" dos protestos liderados pelo opositor Juan Guaidó.
Dias depois, um despacho atribuído ao ministro da Defesa, Vladimir Padrino, a seus comandados endossou a orientação do líder bolivariano, mas apresentou uma sutil e importante divergência. Ele alertou contra "o uso de violência de grupos que se autointitulam coletivos chavistas". "
Nenhuma associação que provoca violência pode se autodenominar coletivos", diz o texto, difundido em redes sociais. No ano passado, o general Padrino deu declarações similares, tentando desvincular as Forças Armadas desses grupos.
Essa dissonância chamou a atenção do governo americano. Em uma entrevista a vários meios de comunicação, entre eles o jornal O Estado de São Paulo, uma fonte da Casa Branca que participa da elaboração de políticas do governo Trump para a Venezuela, disse que a atuação dos coletivos tornou-se um foco de preocupação dos Estados Unidos.
"Se Maduro tivesse mais apoio, não pediria aos coletivos que reprimissem, mas sim à Guarda Nacional Bolivariana", disse. "O apoio de Maduro a esses grupos, que nada mais são do que grupos terroristas domésticos, prova que sua margem de manobra está diminuindo", afirmou a fonte, usualmente mantida pelo governo em anonimato.
"Terroristas"
O senador Marco Rubio, republicano da Flórida, pediu nesta semana ao Departamento de Estado e ao Departamento do Tesouro que envolvam os coletivos chavistas mais violentos nas próximas sanções contra a Venezuela.
Na avaliação do senador, eles devem entrar para a lista de organizações terroristas e ter os bens congelados. A avaliação dele foi endossada pelo senador Rick Scott, também republicano da Flórida, e o assessor de Segurança Nacional, John Bolton.
"Maduro criou uma rede de coletivos para servir como seus guarda-costas particulares e proteger seu apego ao poder", disse Rubio em carta endereçada ao secretário de Estado americano, Mike Pompeo, e ao secretário do Tesouro dos EUA, Steve Mnuchin.
Analistas venezuelanos concordam com a avaliação do governo americano. Para Luis Vicente León, do Instituto Datanálisis, esses grupos, de características similares às milícias brasileiras, funcionam como uma espécie de "seguro" do chavismo caso as Forças Armadas se voltem contra o regime.
"Os coletivos sempre foram usados como meio de intimidação, seja por serem armados, seja por estarem envolvidos com a distribuição de cestas básicas em bairros pobres", disse ao Estado. "Mas eles são principalmente um contraponto ao setor militar, caso ocorra uma oposição armada ao chavismo dentro da revolução.
Para o analista Oscar Vallés, da Universidade Metropolitana da Venezuela, o comunicado dúbio de Padrino significa que o Exército tenta coibir "excessos" dos coletivos. "Na prática, Padrino está dizendo aos coletivos: reprimam, mas não abusem."
No domingo passado, membros do coletivo Ali Primera 4F questionaram a prisão de alguns de seus membros por militares durante a repressão a protestos no Estado de Lara. Segundo eles, não houve respeito aos direitos individuais dos detidos.
Para entender: Projetos sociais e violência
Os coletivos, grupos de civis armados, foram criados durante a presidência de Hugo Chávez para defender os princípios da revolução bolivariana. Segundo o governo, os coletivos são grupos sociais que trabalham em projetos nas comunidades, as chamadas "Misiones".
No entanto, alguns grupos funcionam como as milícias brasileiras. São conhecidos por sua violência e por controlar serviços públicos em certas regiões. Os próprios membros dos coletivos, que se vestem de negro, cobrem o rosto e geralmente andam em motocicletas, dizem que a polícia ou a Guarda Nacional os chamam para intimidar. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.