O vereador do Recife Ivan Moraes (PSOL) protocolou um requerimento para que seja retirado o busto do marechal Humberto de Alencar Castello Branco da Ponte Marechal Humberto Castelo Branco, conhecida como Ponte da Caxangá, na Zona Oeste da capital. Durante reunião ordinária da Câmara do Recife na segunda-feira (22), o vereador André Régis (PSDB) fez pedido de vista, impedindo a votação do requerimento durante a reunião. Castello Branco foi o primeiro presidente do período da Ditadura no Brasil.
Em sua justificativa, Ivan Moraes lembrou que, entre 1964 e 1985, a ditadura promoveu violência, tortura e mortes de milhares de pessoas. O político destacou que a Comissão Nacional da Verdade emitiu recomendações, entre elas, "preservação da memória das graves violações de direitos humanos", que sugere a mudança na denominação de logradouros, vias de transporte, edifícios e instituições públicas que contenham nomes de agentes públicos ou de particulares que notoriamente tenham participado ou praticado graves violações de direitos humanos durante a Ditadura Militar no Brasil.
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O Programa Nacional de Direitos Humanos PNDH-3, em sua Diretriz 25, destaca o vereador, prevê a "modernização da legislação relacionada com a promoção do direito à memória e à verdade, fortalecendo a democracia" e traz em sua alínea "c" a necessidade de "fomentar debates e divulgar informações no sentido de que logradouros, atos e próprios nacionais ou prédios públicos não recebam nomes de pessoas identificadas reconhecidamente como torturadores."
Responsável pelo pedido de vista, o vereador André Régis argumentou que permitir a retirada do busto do marechal seria abrir precedente para retirada de outros monumentos. Segundo ele, o requerimento é obscurantista, não democrático, perda de tempo e de visão mesquinha.
"Não cabe aqui à gente do Poder estar fazendo análise do ponto de vista histórico, de um passado recente, criticando porque houve, na concepção de alguns, períodos que não sejam considerados próprios às lentes dos dias atuais no que se refere à sociedade que nós desejamos", comentou. Segundo ele, a medida estaria reabrindo um passado que levou muito sofrimento "a muitos brasileiros de várias tendências de várias partes".
André citou seu caso pessoal, da perda de um tio no atentado no Aeroporto Internacional do Recife, em 25 de julho de 1966. O jornalista e poeta Edson Régis foi uma das duas vítimas fatais do ocorrido. Os militares afirmaram à época que o ataque tinha como alvo o marechal Costa e Silva, que era candidato à presidência. O episódio nunca foi elucidado.
O vereador tucano ainda ressalta que Castello Branco foi responsável por uma grande reforma nas Forças Armadas que distanciou os quartéis da política e que o marechal foi o grande estrategista brasileiro na 2ª Guerra Mundial.
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O vereador Renato Antunes (PSC) concordou com o pronunciamento de André Régis e disse que se não tivesse havido o pedido de vista votaria contra o mesmo, por entender que é simplismo revisar a história dessa forma. "A história é fruto da contradição. Se retirar o busto da ponte, vamos colocar o que no lugar, uma indagação pertinente. Não podemos retirar historicidade do Recife, votaria contra para não manchar a história do Recife, que serve para refletir sobre erros e acertos", defendeu Antunes.
No Twitter, Ivan Moraes reforçou que também quer outro nome para a ponte. "Monumento é homenagem. O povo deve decidir quem será celebrado em seu nome", assinalou. A placa abaixo do busto identifica que a construção se deu na gestão de Augusto Lucena, que era vice-prefeito da capital em 1963 e assumiu a prefeitura no ano seguinte, após o golpe militar que depôs João Goulart resultar no afastamento do governador Miguel Arraes e do prefeito Pelópidas Silveira. Neste período, Lucena se filiou à Arena, sigla do governo federal. Ele encerrou o primeiro mandato em 1968, mas foi nomeado prefeito do Recife no governo de Eraldo Gueiros Leite (1971-1975).
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Castello Branco governou o país entre 1964 e 1967. Foi responsável também pelo Ato Institucional nº 2, que extinguiu os partidos existentes no país e criou a Arena e o MDB, que representava a oposição moderada. O ato também permitia que o presidente determinasse intervenção federal nos estados, decretasse estado de sítio por seis meses sem consulta prévia e aumentou o número de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de 11 para 16, assegurando maioria favorável ao governo. O presidente havia prometido devolver o cargo ao fim de sua gestão, o que não foi cumprido.
A discussão sobre a retirada de monumentos em homenagem a figuras históricas não é nova, mas ganhou força em vários países recentemente. Estátuas de heróis nacionais racistas foram derrubadas e danificadas em protestos antirracistas após George Floyd morrer asfixiado em abordagem policial em Minneapolis, nos Estados Unidos. Na cidade britânica de Bristol, manifestantes lançaram no rio uma estátua de Edward Colston (1636-1721). Pelo menos sete cidades da Bélgica tiveram bustos do rei Leopoldo 2º (1835-1909) pichados e amordaçados.
Edward Colston fez fortuna transportando mais de 100 mil escravos do oeste da África para colônias no Caribe e nas Américas. Sua empresa marcava o peito de escravos a ferro com 'RAC', sigla da companhia Royal Adventures into Africa. O empresário também era um filantropo e benfeitor em Bristol, ganhando, assim, um monumento no século 19.
Leopoldo 2º ficou conhecido pela forma brutal com a qual tratava seus escravos, que tinham as mãos decepadas caso não cumprissem as cotas de trabalho. Crianças também eram punidas com mutilação.
Os apoiadores da manutenção dos monumentos levantam argumentos como: a história não pode ser editada, as gerações devem aprender com os acontecimentos passados e valor artístico e simbologia das estruturas. Alguns governos atualizaram as placas informativas que narram a biografia do representado, trazendo não apenas os feitos positivos. Movimentos antirracistas não consideram os argumentos suficientes e costumam citar o caso da Alemanha, que não possui busto de Adolf Hitler.