Primeiro candidato à presidência da Alepe a discursar, o deputado Edilson Silva (PSOL) afirmou, neste domingo (1), que o ex-governador Eduardo Campos foi o "fiador" dos acordos "obscuros" feitos na Casa Joaquim Nabuco. O que, segundo ele, resultou na abertura da possibilidade do deputado Guilherme Uchoa (PDT) disputar a reeleição.
"Eduardo concentrava irresponsavelmente muito poder ao seu redor. E certamente foi ele o fiador dos acordos feitos nesta Casa", disparou. "Há sim inconstitucionalidade na candidatura de Uchoa", completou.
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Para Silva, a Alepe "se apequenou diante da sociedade". E, por isso, ele "não dormiria em paz se não colocasse voz aos pequenos". "Nossa candidatura se justifica pelo vácuo que está nesta Casa", afirmou.
Silva apontou suas propostas e disse ainda que o estado estava em estado de emergência.
Veja a íntegra do discurso:
1 – Primeiramente quero agradecer ao meu Deus por ter chegado até aqui.
2 – Saúdo os deputados, funcionários presentes, imprensa, amigos e militantes do PSOL que aqui se encontram.
3 – Agradeço a acolhida que me deram os deputados da Casa. Especialmente ao deputado Silvio Costa, meu líder na oposição, ressaltando a habilidade extrema que teve até aqui na condução de um bloco tão rico em diversidade. Agradeço a todos os deputados do bloco de oposição, mas especialmente à deputada Socorro Pimentel, que mesmo sem um contato mais perene tem tido com nosso mandato iniciante um frutífero debate de ideias. Agradeço também aos gestos de acolhida do Presidente Guilherme Uchoa, desde antes mesmo da minha diplomação, e também os gestos de vários deputados, dentre os quais destaco o deputado Diogo Morais, nos recepcionando de forma muito respeitosa e atenciosa na Casa.
4 – Nunca desejei estrear na tribuna desta Casa, debutando na atividade parlamentar, já na condição de uma disputa para o cargo máximo desta instituição. Confesso que não estou bem à vontade nesta situação, diante de tantos parlamentares tão competentes e com bem mais experiência e certamente mais capacidade, razão pela qual peço licença e a compreensão dos nobres colegas para exercitar este gesto ao mesmo tempo ousado e aparentemente arrogante de defender a minha postulação à Presidência do Poder Legislativo de Pernambuco.
5 - Estaria muito mais à vontade neste momento defendendo qualquer um dos quadros do bloco de oposição e que se dispusessem a representar uma perspectiva de outra dinâmica política para esta Casa de Joaquim Nabuco. Infelizmente, a conjuntura política, externa e interna, nos impôs uma realidade em que se consolidou a candidatura do atual presidente, deputado Guilherme Uchoa, figura que já percebi ser muito querida entre os pares desta Casa, e do deputado Rodrigo Novaes, um grande e respeitável parlamentar, mas um quadro pertencente ao bloco do governo, portanto, avalista mesmo que involuntário deste estado de coisas que acontecem dentro e fora desta Assembleia. Ambos deputados, portanto, não representam minimamente os anseios, demandas e compromissos que humildemente assumi com a sociedade pernambucana no trajeto que me trouxe até esta Casa.
6 - Nossa candidatura se justifica pela existência deste hiato, deste vácuo, que só pode ser preenchido com um conteúdo político e programático que simbolize o reclame da sociedade contra o caos que vivemos no sistema prisional neste momento, por exemplo, que fez gerar a decretação de estado de emergência por parte do governo de continuidade do governador Paulo Câmara.
7 - Fosse este governo coerente, e aqui vai um conselho deste jovem deputado, decretaria também estado de emergência no transporte coletivo da região metropolitana do Recife, com seus terminais integrados massacrando nossa gente. Decretaria também estado de emergência na FUNASE, este depósito mal arrumado de nossas crianças e jovens, que deveria envergonhar qualquer chefe de governo. Pernambuco vive um estado de emergência.
8 - Respeito e compreendo as razões e correlações que fizeram o conjunto dos colegas deputados e deputadas produzir este vácuo em relação a estas pautas nesta eleição para a presidência da Casa. Mas não dormiria em paz se eu aqui estivesse e aqui não me colocasse para ser o gesto e a voz de tantos pequeninos desassistidos, de tantos e tantas que do lado de fora deste plenário tem sua cidadania castrada, sem educação mínima de qualidade, sem saúde, sem terra, sem teto, sem segurança pública, vivendo a discriminação da lgbtfobia, do racismo e do machismo. E penso que uma não candidatura nesta Casa que expresse esta situação dramática de nossa gente seria de minha parte um ato de pouca coragem e de incompatibilidade com o que prego. Este é o lastro primeiro desta humilde postulação.
9 – Portanto, reafirmando o que temos dito por onde passamos desde que oficializamos nossa candidatura, não estamos aqui unicamente para questionar a figura pessoal do presidente Guilherme Uchoa ou para fazer um questionamento da legalidade ou constitucionalidade de sua postulação a mais um mandato à frente da Mesa Diretora.
10 – Com relação a este questionamento, me associo aos deputados, como o nobre Rodrigo Novaes, que entendem que há sim inconstitucionalidade na atual postulação do deputado Guilherme Uchoa, questão que já abordei em fartos textos publicados na mídia local.
11 - Para a infelicidade da política e da nossa democracia, a pena que se atreve a escrever as modificações na nossa Lei maior, a nossa Constituição, perdeu o zelo na escrita. Talvez por tamanha regularidade com que as razões ocasionais se sobreponham aos interesses pétreos da sociedade, a quem a Constituição deveria guardar.
12 - Aquilo que inspirou e deu intenção à Emenda 33 do deputado Raimundo Pimentel foi e é de domínio público. A intenção da norma era e é encerrar as reeleições para a Mesa Diretora que já faziam, lá em 2011, a Assembleia Legislativa voltar suas costas às melhores tradições republicanas. Quatro anos depois, em 2015, a situação motivadora da Emenda segue em marcha de perpetuação, ancorada na letra fria de uma norma constitucional flagrantemente carente de uma revisão ética na sua finalização.
13 - E como ensina o jurista Miguel Reale aos ainda iniciados no ofício do Direito, “as palavras guardam o segredo de seus significados”. Alerta Miguel Reale para a importância da escrita e da gramática no processo de interpretação das normas jurídicas. Os contratos e as normas escritas no mundo jurídico são necessários porque é sabido que acordos alcançados apenas na oralidade são vulneráveis às mudanças de opinião ou de correlação de forças no futuro.
14 - Estamos diante de uma mudança de opinião. Fruto de uma mudança na correlação de forças, que certamente tem na morte trágica e absolutamente inesperada e indesejada do ex-governador Eduardo Campos, um fator determinante. Eduardo concentrava irresponsavelmente muito poder ao seu redor, comprometendo os contornos finos da República em nosso Estado, e certamente foi ele, Eduardo, o principal fiador do acordo feito nesta Casa, acordo que se pretendia escrito na Emenda 33.
15 - Mas esta Emenda não diz tudo o que sempre esteve explícito sobre ela. Ela não guarda com inviolabilidade os segredos públicos daquilo que teve também a sociedade como testemunha: a não perpetuação do deputado Guilherme Uchoa numa escalada ilimitada de reeleições. Bem ao contrário, a norma estritamente escrita na Emenda 33 permite, num esforço hermenêutico hercúleo de abstenção total da realidade política que originou a norma, a escandalosa interpretação de que o atual presidente da Assembleia alcance a marca de uma sexta gestão à frente da Casa, via uma quinta reeleição consecutiva. É um escárnio.
16 – Que Deus nos proteja e nos dê forças para que construamos uma outra realidade nesta 18ª legislatura que estamos iniciando no dia de hoje. A sabedoria Ele já nos deu, para perceber que uma das comissões mais importantes desta Casa é exatamente aquela que cuida da Redação Final daquilo que produzimos. Provado está que não se basta aqui vencer o debate e convencer os pares, se não se escreve e se confere com exatidão aquilo que será publicado no Diário Oficial.
17 – Dito isto, podemos discorrer sobre as demais razões que justificam nossa candidatura. Todas elas tem a ver com o papel que entendemos que deve ser cumprido pela Assembleia Legislativa, dentro de um ambiente republicano.
18 – A Assembleia não pode ser uma instituição em que deputados e a Presidência da Mesa disputem para ver quem é mais leal aos interesses políticos do ocupante do Poder Executivo. Todos queremos harmonia entre os poderes, sincronia em favor da população, mas em nenhum momento isto pode se confundir com o sequestro das prerrogativas de um poder pelo outro.
19 – Os tempos do ex-governador Eduardo Campos foram os tempos de quatro gestões consecutivas de um mesmo deputado na chefia do legislativo estadual. Nesses tempos, a Assembleia se apequenou diante da sociedade, pois se curvou diante não apenas de um outro poder, mas diante de um grupo político no poder. A Assembleia se transformou num mero carimbador das ordens vindas do Palácio do Campos das Princesas.
20 – Por óbvio, uma Casa Legislativa domesticada e dócil ao poder de grupos flagrantemente oligárquicos, não se pretende permeável ao constrangimento do contato físico com a sociedade civil organizada. Tal situação política exige um poder legislativo herméticamente fechado, e foi neste contexto que o deputado Uchoa caiu como uma luva para os interesses palacianos.
21 – A Assembleia não possui um Portal da Transparência para permitir que a sociedade saiba o mínimo sobre os reprentantes do povo. Não possui pontes analógicas e nem digitais que permitam e garantam efetiva participação da população e seus segmentos na produção legislativa, revelando uma postura ao mesmo tempo anti-democrática, arrogante e pouco inteligente.
22 – As relações internas nesta Casa também refletem o papel apequenado que forças estranhas à República querem impor a ela. Existe assimetria injustificável no usufruto parlamentar dos recursos disponibilizados a esta Casa e administrados por ela. Há que se abrir todos os contratos que esta Casa possui com terceiros, por exemplo, pois todos devem estar plenamente à disposição do trabalho parlamentar com isonomia.
23 – Não se justifica que tenhamos a situação irracional de tantos comissionados nesta Casa, em comparação com os concursados. O investimento feito em comissionados é, em certa medida, desperdício de recursos públicos. Mas, de novo, esta situação serve perfeitamente para a consolidação de um legislativo frágil e vulnerável ao poder avassalador, político e técnico, emanado do Palácio do Governo.
24 – O problema é que o apequenamento do poder legislativo frente a outros poderes, sua domesticação, sua desqualificação técnica, sua caricaturização frente à opinião pública, seu desapego aos rituais litúrgicos que um poder republicano deve ter, gera uma sensação de obsolescência por parte da sociedade.
25 – E é esta sensação de obsolescência por parte da sociedade que mais me preocupa. O questionamento da sociedade não se limita ao parlamentar. Atinge o parlamento! E quando atinge o parlamento, fere profundamente a própria democracia. O desprezo aos políticos, que fartamente constatamos, traz na sua esteira um perigoso desprezo à democracia.
26 - Entramos assim numa bola de neve, em que o poder legislativo, para se proteger desta fúria compreensível e saudável se vista em perspectiva, acaba se fechando ainda mais à sociedade. É um ciclo autofágico de atrofiamento da democracia.
27 – É óbvio que esta situação perigosa não é um monopólio de nós que aqui estamos nesta noite. Ela atravessa continentes e instituições políticas e religiosas. Isso é fruto de tempos de mudança, de inovações tecnológicas que geram mais intensidade comunicativa, novas simbologias na linguagem, mais facilidades para o controle social sobre as atividades políticas. A sociedade está, indiscutivelmente, mais atenta, mais bem informada e, logo, mais exigente.
28 – A força desses novos tempos é tanta que nem uma instituição milenar como a Igreja Católica resistiu. O Papa Bento XVI renunciou. E veio Sua Santidade o Papa Francisco, com um ecumenismo contagiante, para nos mostrar caminhos. O início de seu diálogo com o século XXI e com fiéis cada dia mais exigentes e intolerantes com comportamentos paradoxais entre representantes e representados, líderes e liderados, foi exatamente se aproximar através de gestos concretos, simbólicos, mas profundos.
29 – Ao abrir mão dos aposentos papais luxuosos e passar a pernoitar com os do baixo clero, ao abrir mão de sua copa papal e ir ceiar com os do baixo clero, ao abrir mão de carros de luxo e se locomover em carros populares, ao ser rígido com assédios morais na igreja, ao combater desmandos no Banco do Vaticano e tratar com transparência os casos de pedofilia na sua igreja, o Papa Francisco se converteu na liderança com mais autoridade política deste início de século e sua igreja hoje orgulha seus fiéis. Desejo muita saúde e vida longa ao Papa Francisco.
30 – Eu penso que aqui podemos fazer nossa parte, mirando-nos no Papa Francisco. Eu não acredito em soluções mágicas e rápidas. O estado de emergência que vivemos em Pernambuco exige soluções que passam pela radicalização da democracia. Mais democracia.
31 – E mais democracia nos tempos atuais significa mais participação popular na política. E mais participação popular exige transparência e radicalização no exercício dos princípios republicanos.
32 – Agradeço a atenção todos e todas, pedindo humildemente a reflexão sobre nossas palavras e um voto de confiança em nossa postulação à Presidência da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa de Pernambuco. Muito Obrigado e Boa Noite a todos.