Embora o estado inteiro esteja classificado na Fase Vermelha do Plano São Paulo de Contenção ao Coronavírus, o governo paulista programou o retorno das aulas presenciais de 2021 para o próximo dia 8 de fevereiro. No entanto, mesmo com as ações anunciadas pelo secretário estadual de Educação, Rossieli Soares, para reduzir o risco de contaminação entre os alunos, muitos pais não vão permitir a volta dos filhos ao ambiente escolar, devido ao perigo dos alunos estarem expostos ao Covid-19.
De acordo com a pasta da Educação, as escolas voltarão a funcionar em esquema de rodízio, com o máximo de 35% dos alunos no mesmo turno. Para a estudante e dona de casa Alessandra de Souza, 40 anos, não há justificativa para encaminhar as duas filhas, Stella e Rebeca, de 16 e nove anos, para o colégio nas aulas presenciais. "Uma vez que venho cumprindo a quarentena e sigo os protocolos de segurança, não acho que seria válido a volta às aulas já que, por exemplo, minha filha de nove anos não vai ficar quieta e de máscara, mesmo a escola tendo um plano seguro", comenta.
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Alessandra de Souza não se sente segura em mandar a filha Rebeca, de nove anos, para a escola | Foto: Alessandra de Souza / Arquivo Pessoal
Para Alessandra, o aprendizado das meninas não foi impactado de maneira negativa durante as aulas online. "Elas não perderam o ano, se reinventaram. Assim como nós, tiveram que se adaptar. O ensino ficou mais puxado, aprenderam a ter uma rotina, embora eu tenha percebido um desânimo dos professores", avalia.
O empresário Hélio Sales Junior, 37 anos, é mais um que não vai permitir que os filhos Gustavo, de 15, Cauã, de nove e Iasmin, de três anos, retornem às aulas presenciais. Segundo Junior, qualquer protocolo mais rígido ainda seria inseguro. "Não há um plano de segurança concreto e, mesmo que a escola mostrasse algo nesse momento, seria impossível o retorno de qualquer um dos três", enfatiza. "Infelizmente, no momento, não temos nenhum recurso a não ser esperar a tão sonhada vacina", complementa.
Muito além das matérias
A escola em que Pablo, 12 anos, está matriculado, tem apenas oito pessoas na sala de aula, e segue os protocolos de segurança que reduzem o risco de contaminação pela Covid-19. Embora o aparato sanitário seja considerado seguro, a mãe do menino, Renata Nogueira, 46 anos, que é professora, não vai autorizar o retorno do menino para o convívio escolar. "Com a possibilidade de escolha, decidimos que estudar em casa, nesse momento, é a melhor opção. Aprendizado e qualquer outro problema que o isolamento traz, recuperamos, mas as vidas não", reflete.
Segundo Renata, como a escola é um ambiente feito de pessoas, professores, gestores e funcionários da limpeza também passam a correr risco de contágio na volta às aulas presenciais. "A circulação no ambiente será enorme e todas estarão em risco de contaminação. Não podemos descartar a possibilidade de as crianças pegarem e transmitirem o vírus", aponta a professora.
Para Renata Nogueira, durante a pandemia, o filho Pablo aprendeu que sem coletividade, nada vai para a frente | Foto: Renata Nogueira / Arquivo Pessoal
Para Renata, os privilégios que consegue proporcionar ao filho, como o de estudar em uma escola particular e ter acesso à tecnologia, diferenciam a qualidade do ensino em comparação com a rede pública. Ela diz que Pablo "se virou" para aprender as matérias da grade curricular e que ele pode ter saído de 2020 com um ensinamento maior. "Ele concluiu o ano muito bem, mesmo no meio de tantos acontecimentos, e aprendeu que sem coletividade nada vai para frente. Isso é uma lição de vida que conteúdo nenhum dá conta".
Palavra do especialista
Para Ismael Rocha, doutor em educação pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, os prejuízos da pandemia na aprendizagem dos alunos em idade escolar são incalculáveis, e os impactos vão refletir a longo prazo. "Nós iremos conhecer o preço deste passivo nos próximos anos. Ainda não sabemos como será, com qual intensidade, porque não temos um histórico que nos leve a isso. Mas, certamente, esta geração será marcada como aquela que ficou afastada do processo de aprendizagem mínimo", afirma o diretor do Institute of Technology and Education (Iteduc).
Segundo o especialista, é possível comparar o momento vivido com uma história que está sendo contada e acaba interrompida, e essa parada influencia as construções mentais que habilitam o processo de aprendizagem. "Em uma analogia bem simples, é como se estivéssemos assistindo um filme e paramos em um determinado ponto. Quando voltamos, temos que resgatar uma série de pontos para poder construir a lógica da narrativa apresentada. Às vezes, falamos até que valeria a pena começar novamente para poder 'entender o filme'", explica.
Ainda de acordo com o especialista, os maiores temores são a evasão escolar e o aumento da miséria, já que muitos estudantes são obrigados a aproveitarem o ano letivo nas escolas para fazerem as refeições que faltam em casa. "O percentual de estudantes que retorna aos estudos depois de parar durante um ano é bem pequeno. O impacto socioemocional é muito grande, e ele tem dificuldade em processar todas as variáveis que o envolve para que retorne à mesma rotina anterior. Para encerrar esta lista de fatores, vale pensar naquelas crianças cuja única alimentação, com o mínimo índice nutricional, era feita na escola", conclui o professor.