Com seu 1,6 quilômetro de extensão, na Avenida Conde da Boa Vista, localizada no coração do Recife, tem área suficiente para abrigar grandes equipamentos, como shopping, lojas, escola e faculdade. A grandeza da via também é diretamente proporcional às queixas de pedestres, ciclistas e usuários do transporte público, que se sentem invisíveis e esquecidos diante de um local tão extenso e tão negligenciado.
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A avenida atual é bem diferente daquela aterrada há 262 anos, quando ainda era chamada de Rua Formosa, devido à beleza do local. De belo, não sobrou quase nada. Não é preciso procurar muito para encontrar os inúmeros problemas da Conde da Boa Vista, que, aliás, não são novos. Quem passa pelo local, logo se depara com buracos e desníveis nas calçadas que, inclusive, estão tomadas por placas de publicidade e ambulantes. Isso sem falar nas caixas de esgoto abertas, paradas do Bus Rapid Transit (BRT) em situação precária e ciclistas brigando por espaço com carros, ônibus e motos.
Diferente do que aponta o Plano de Mobilidade do Recife, focado em diminuir o uso de carro e estimular a utilização de outros meios de transporte - com o incentivo ao uso do transporte público de passageiros e da bicicleta como meios de deslocamentos, na Avenida Conde da Boa Vista, pedestres e ciclistas não têm vez.
Jefferson Gomes, 21 anos, é entregador de água e tem a bicicleta como meio de sobrevivência. Ele usa a bike para fazer as entregas dos garrafões entre o bairro da Boa Vista e o Derby. São inúmeras viagens por dia. Sem opção, precisa se apertar entre os carros e ônibus que circulam na Avenida Conde da Boa Vista. Por conta da falta de espaço, já chegou a ser atingido por uma moto. “É arriscado, perigoso, mas não tenho outra alternativa. O que posso fazer?”, conclui, sem esperanças.
O técnico em refrigeração José Clemerson da Silva, 32 anos, é outro ciclista que concorre com os coletivos e automóveis para conseguir um lugar nas estreitas faixas. Vindo do Alto Santa Terezinha, na Região Metropolitana do Recife, ele pedala cerca de vinte quilômetros diariamente no trajeto para chegar ao trabalho. Sem expectativa de que a situação vá mudar, ele desabafa. “Só colocam ciclovia em lugar onde mora gente que tem dinheiro. Nós somos esquecidos”, conclui.
Quem também se sente esquecido é o pedestre, que precisa competir por um espaço para poder transitar na avenida. Com as calçadas tomadas por placas de publicidade e pelos vendedores ambulantes, não sobra lugar pra ninguém. Sem contar os desníveis e os buracos nos passeios. Alguns preferem se arriscar e andar no meio da avenida.
“Tem que ficar atento, porque vem carro, moto, bicicleta e a gente no meio”, explica o professor Henrique Sales, enquanto desvia das calçadas ocupadas em um trecho em frente ao Shopping Boa Vista. “Mas é a opção que temos, né? na calçada é quase impossível de andar”, completa.
Em relação ao transporte público, especialmente o BRT, o que se vê é puro improviso. Faixas que deveriam ser completamente exclusivas para os ônibus, de exclusivas não têm quase nada. Em muitos trechos os coletivos precisam se apertar entre os carros. Considerada como principal eixo central de transporte público da região metropolitana do Recife, 75 linhas circulam, diariamente, pela Avenida Conde da Boa Vista. Dessas, quatro são operadas por veículos de BRT. Somadas, as frotas destas linhas formam um conjunto de 418 ônibus.
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Os BRTs, aliás, são um problema a parte. Prometidas desde 2009, até agora as estações oficiais não foram entregues e o que funciona atualmente é pura gambiarra. Algumas até chegaram a ter a obra iniciada, mas nenhuma foi concluída. Feita de um material metálico, as estações-puxadinho atuais da Conde da Boa Vista nem de longe se parecem com as que constam no projeto original. Nada de ar condicionado, porta de vidro nem embarque através de plataformas que têm exatamente a mesma altura do piso do ônibus.
Um funcionário que não quis se identificar, disse que, além de tudo, o local alaga quando chove. “A situação é terrível para a gente trabalhar. Quando chove, alaga tudo. Além do que, a gente não tem banheiro, as portas nunca funcionam, então fica tudo aberto o tempo todo”, detalhou.
“Largo da faculdade à noite e preciso ficar aqui, muitas vezes sozinho, esperando o ônibus. Como a porta está sempre aberta, corre o risco de qualquer pessoa entrar e assaltar a gente. Além disso, faz muito calor aqui dentro”, revela o estudante Rafael Oliveira, 19 anos, que diz se sentir apreensivo e desconfortável na estação.
O LeiaJa.com foi atrás de respostas para os problemas apontados. Em relação à manutenção da estrutura física das calçadas, a Autarquia de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb) informou que está finalizando um projeto de requalificação da Avenida Conde da Boa Vista que irá beneficiar também os passeios públicos do corredor viário, erradicando os problemas citados, melhorando e adequando a mobilidade e trazendo mais conforto aos pedestres. A Emlurb disse, ainda, que expectativa é que as obras sejam iniciadas ainda neste ano, mas não deu um prazo para que isso aconteça.
Questionado se há algum projeto para melhorar a situação dos ciclistas que transitam na Avenida, o secretário de mobilidade e Controle Urbano do Recife, João Braga, foi enfático. “Não temos. Não temos, não”, confessou. “Pela Conde da Boa Vista, com a quantidade de ônibus que transita lá, os acessos que são obrigatórios para automóveis... Têm prédios ali que as entradas são só pela frente, não tem acesso por trás. Então, tem estacionamento, tem tudo ali. Tudo ali tem que funcionar. Então, a gente está procurando formas alternativas de resolver o acesso de bicicletas”, explicou.
Sobre a situação das calçadas, o secretário informou que no começo do mês de maio um projeto de requalificação será apresentado à sociedade. “Nós sabemos que a população não aprova a solução atual. Nós ouvimos a população, fizemos as pesquisas e na próximas semana, nós [Secretaria de Mobilidade e Emlurb] vamos apresentar ao prefeito Geraldo Júlio a versão final do projeto que nós fizemos para a Conde da Boa Vista. Ele inclui um projeto de paisagismo para toda a avenida, um projeto das novas estações de BRT e novas paradas de ônibus, fizemos um novo plano de circulação. Fizemos também um plano para os pedestres, para resolver em definitivo a situação dos pedestres naquela avenida” explicou o secretário, mas sem detalhar que soluções serão essas. Ainda de acordo com Braga, a expectativa é que o projeto de requalificação saia do papel no início do segundo semestre.
Em relação aos comércio ambulante, o secretário informou que os vendedores informais também estão incluídos no plano que será apresentado à Prefeitura do Recife. “Vamos dar uma solução para os vendedores ambulantes”, disse. Já sobre as estações de BRT, Braga informou que a proposta para construção das novas estações e o desenho e estruturação delas também está dentro do projeto de requalificação da Avenida Conde da Boa Vista. Segundo ele, duas estações serão construídas. Ainda não se sabe quando as obras vão começar.
Indagado sobre o shopping popular que começou a ser construído no bairro da Boa Vista para o ordenamento dos vendedores ambulantes da área central do Recife, o secretário disse que faltou dinheiro para continuar as obras. “Não está encaminhado por falta de recursos. A gente está tentando adquirir os terrenos, que terão uma finalidade. Mesmo que o shopping não seja construído agora, esses terrenos serão utilizados para absorver parte dessa população que vai ter que sair da avenida”, detalhou. Também não há um prazo para que esse modelo comece a funcionar.