Nos últimos meses, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ter arregimentado desconfianças País afora, mas em sua terra natal permanece querido e admirado. Segundo a certidão de nascimento, Lula é de Garanhuns, município no meio do agreste, a 230 quilômetros do Recife. Oficialmente, porém, agora é egresso de Caetés, que, ao se emancipar, em 1963, levou junto a área onde o ex-presidente nasceu e onde hoje vivem seus parentes.
"Lula é um filho da terra, que saiu daqui e foi presidente da República. Tem que ser querido", diz o prefeito Armando Duarte, do PDT, eleitor assumido de Lula. "A gente sabe o que está acontecendo hoje, mas no tempo em que esteve na Presidência da República, ele trabalhou muito e trabalhou pela pobreza, e Caetés, como é a maioria dos municípios no interior do Nordeste e do Brasil, é pobre."
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Pequena e sossegada, a cidade tem umas poucas ruas e uma praça central, onde se concentra o comércio. O pórtico da entrada traz os dizeres "Terra da Energia Eólica". É preciso continuar na rodovia principal cerca de 5 quilômetros para entender de onde vem tal designação. O maior parque eólico do Estado corta o município criando um cenário típico do século 21.
A maior parte da cidade, porém, ainda tem um pé no século passado. Apesar de o Brasil ter se transformado num país urbano, em Caetés mais de 70% dos 27 mil habitantes ainda vive, como um dia Lula viveu, na zona rural - foram, são ou têm parentes agricultores que plantam para viver. A seca, que obrigou a família de Lula a migrar para São Paulo, ainda assola a localidade. Nos períodos de estiagem severa, como agora, o abastecimento depende de carros-pipa, a maior parte deles fornecida pelo poder público, em especial o governo federal.
Em conversas nas calçadas das ruas, em pouco tempo, se percebe que entre os moradores, em sua maioria gente simples e franca, prevalece o consenso de que Lula foi o primeiro homem público a governar para os mais pobres. "Para a pobreza, foi o melhor que teve, outro que nem Lula vai demorar e eu voto nele 20 vezes", diz Irenildo da Silva, 30 anos, lavrador. "Para mim ele é o herói do Brasil", diz Roberto de Almeida, 42 anos, autônomo.
Lula seria algo como um divisor entre a privação absoluta e um novo mundo de oportunidades. "Me criei numa pobreza danada, comendo caborja, um peixe que dá na lama", diz Lupércio Azevedo de Moraes, 43 anos, agricultor. "O nordestino nunca teve uma chance no País, como a que tem agora: hoje as nordestinas e os nordestinos estão na faculdade e eu mesmo, que nunca pude possuir nada, se eu quiser comprar uma motinha, compro - tô que nem um deputado, tenho celular e roupas", diz abrindo a jaqueta e balançado os pés para mostrar os tênis.
A faculdade em questão é a unidade da Universidade Federal Rural de Pernambuco, aberta em 2005, em Garanhuns, como parte do projeto de expansão do sistema federal de Ensino Superior, iniciado na gestão de Lula. "Antigamente, aqui na nossa região, para se fazer faculdade, só mesmo sendo filho de rico, mas aí vieram os polos da Federal para cá, para Garanhuns, pertinho", diz a professora Aline dos Santos, 28 anos. "Isso sem falar nos benefícios para o homem do campo, com muitos projetos que incentivaram a agricultura familiar."
Na opinião dos moradores, se ficar provado, pelas investigações da Lava Jato, que Lula cometeu algum crime, ele precisa pagar. Mas por lá prevalece a crença de que ele é inocente. "Querem que Lula seja um ficha-suja porque não querem ele nos cascos deles", diz Paulo Gomes, 57 anos, comerciante. "Se não sujar o Lula agora, se deixar ele sair limpo dessa, vai ser o próximo presidente."
A presidente Dilma Rousseff, que na última eleição recebeu quase 95% dos votos em Caetés, também estaria sendo injustiçada e traída. "Eu acho uma covardia o que estão fazendo com ela", diz a professora Gilda Alves Cordeiro, 58 anos. "Naquele PMDB não tem nenhum santo. Tem? Agora querem sair e deixar ela sozinha com o barco andando? Se ela entrasse hoje, eu votava nela novamente."
Família
Entre os familiares, as certezas em relação à idoneidade de Lula são ainda maiores. "É tudo invenção: se Lula quando era pobre não inventou certas coisas, por que ia fazer agora? Ele foi presidente por duas vezes, para que ia fazer essa tolice?", afirma Gilberto Ferreira, primo de Lula. Agricultor aposentado, ele mora numa casa simples, ao lado de um posto de saúde que, por coincidência, leva o nome de Dona Lindú, o apelido da mãe de Lula. Para Gilberto, a polêmica em torno do primo é "inveja".
O irmão de Gilberto, Antonio Ferreira, tem a mesma convicção: "Estou tranquilo sobre as coisas que falam de Lula, porque é tudo invenção", diz. "Lula não tem como ter feito o que dizem. Toda vida foi um homem honesto." Antonio vive como pequeno agricultor no sítio Várzea Comprida, nas terras da família, na área rural, onde pouca coisa mudou. Sua casa, um rancho entre pés de mandioca, está ao lado da propriedade que foi dos pais de Lula. De lá se avista o ponto da estrada, que ainda é de chão batido, onde Lula tomou o pau de arara. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.