O ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, acredita que “os centros urbanos são majoritariamente de esquerda”, enquanto “os votos conservadores estão no campo”. Essa foi uma das declarações concedidas durante entrevista ao colunista Thiago Herdy, do UOL, nesta segunda-feira (30). É a primeira grande entrevista do administrador após a sua exoneração do cargo no governo de Bolsonaro, dois meses atrás. Durante a conversa, Salles falou ainda sobre os ruídos entre o governo e o Supremo, loteamento de cargos no Congresso e supostos problemas com a postura do presidente da república.
Após ser questionado sobre a má avaliação de Jair Bolsonaro (sem partido) no país, Ricardo Salles admitiu não acreditar em pesquisas e que essas mesmas fontes, em 2018, afirmaram que Bolsonaro não ganharia a eleição. Segundo o ex-ministro, só passaram a considerar o potencial do presidente eleito no “finalzinho da eleição, mas antes da facada, não davam a ele o percentual que ele teve”. Na mesma linha, continuou a pontuar sobre a distribuição das forças do eleitorado bolsonarista.
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“Não acho que a pesquisa seja tão fidedigna aqui. O Brasil é muito heterogêneo e as pesquisas tendem a ter uma visão muito concentrada nos centros urbanos. Os centros urbanos são majoritariamente de esquerda. Os votos conservadores, o voto da direita está no campo, isso está claro. No interior do Brasil. Não apenas eles [irão reeleger Bolsonaro]. Acho que quando você faz uma pesquisa que foca preponderantemente em centros urbanos, ela está inexoravelmente tendenciosa. Há grandes chances do Bolsonaro ganhar a eleição. E acho que a alternativa ao Bolsonaro no Brasil, que é um fato que também o ajuda bastante, é ter o Lula como adversário”, respondeu.
Ainda sobre a percepção pública sobre a postura de Bolsonaro, Salles disse que vê o presidente como “duro e sincero”, mas não “intolerante”. “Acho injusto colocar essa conta só no colo do presidente. Se há um excesso de beligerância hoje na política brasileira, isso se deve a todos os envolvidos”, continuou. No entanto, admitiu “excessos” por parte de Jair Bolsonaro ao lidar com a pauta do voto impresso.
“O governo apresentou as pautas de maneira correta, colocou para avançar a privatização dos Correios, da Eletrobras. Mas, realmente, o excesso de animosidade recíproca acaba atrapalhando. A despeito de todos esses problemas e da pandemia, o Brasil fez reformas estruturais importantes. Cito a da Previdência, a da autonomia do Banco Central, os marcos da liberdade econômica e do saneamento”, prosseguiu Salles, admitindo que apenas isso não é suficiente.
O ex-ministro desviou de respostas claras ou diretas sobre o embate com o Supremo Tribunal Federal: “Não entro nessa área [impeachment de ministros] porque há exacerbação recíproca dos ânimos. Todos deveriam serenar as suas ações e suas medidas”.
Diante da comparação entre eleitores de Donald Trump, nos Estados Unidos, com a invasão do Capitólio, e uma possível derrota de Bolsonaro em 2022 somada à invasão do Congresso, Salles disse que há “chance zero” de um evento como esse acontecer e que acredita que os resultados seriam respeitados pelo presidente. “Chance zero. O Bolsonaro não fez nenhuma medida antidemocrática, respeitou as liberdades individuais, respeitou o direito. Nunca alguém foi tão criticado pela imprensa como ele foi”, pontuou.
Quanto à reforma administrativa e loteamento da administração pública com parlamentares do Centrão, disse que não há constrangimento algum em partir para esse tipo de política, que é comum aos governos anteriores, apesar de ir contra o discurso de campanha de Bolsonaro. Ao falar de outros governos, Salles disse que “antes havia um loteamento absurdo do governo em troca de apoio do Congresso. Exemplo disso, o mensalão”, mas nega que esse seja o caso da gestão atual.
“A proximidade do Legislativo com o Executivo impõe que você abra espaço de participação. Isso é natural. Mas está muito longe de ser o loteamento político de cargos, verbas e estatais como no passado. O Centrão tinha todos os cargos do governo nos governos passados. Se nesse governo a classe política tem legitimamente alguma participação no governo, em governos passados eles eram donos. Ciro Nogueira tem uma capacidade de articulação política extremamente importante”, concluiu.